1. Para trás ficaram tanto a campanha eleitoral como as eleições.
O povo pronunciou-se. Talvez mais pela mudança de agentes e de estilo. Certamente também pela mudança de rumo.
Formou-se uma nova maioria que gerou um novo Governo. Seguramente o mais pequeno dos tempos da democracia, talvez o mais jovem e, provavelmente, aquele que tem a maior percentagem relativa de independentes. Com sinais meritórios.
O XIX Governo tomou posse e apresentou o seu Programa. Na sede da democracia, agora presidida sob grande consenso. Com um compromisso claro: vencer a crise e mudar o país em quatro anos. Não pode falhar.
Há uma convocação geral para a celebração de um “Pacto de Confiança”.
Com o programa sancionado, chegou a hora de rumar. Com determinação e com envolvimentos colectivos.
“Que ninguém fique para trás”, como sentenciava o Primeiro-ministro…
2. Não é certamente este o espaço para escalpelizar o Programa do Governo. Porém, não ignorando que o Sector Solidário não se pode alhear daquilo que interessa a alguém, fixemo-nos naquilo é nossa opção preferencial.
O Programa do XIX Governo não ignora nem as questões relacionadas com a concepção de um “Estado Social”, nem as Instituições de Solidariedade nem aquelas políticas em que o Sector é particularmente sensível.
Entre outras coisas, no Programa do Governo merece destaque o anunciado “visto familiar” que avalia o impacto das medidas sobre a vida familiar e o estímulo à natalidade, para poderem ser aprovadas em Conselho de Ministros, bem como a intenção de rever as actuais políticas públicas envolvendo as organizações da sociedade civil com competências em matérias relacionadas com a família e com a juventude.
Enquanto os desempregados com mais de 55 anos serão incentivados a ajudar nas IPSS, no Programa anuncia-se a criação de incentivos sociais e laborais ao voluntariado e a simplificação de procedimentos regulatórios e burocráticos, de forma a tornar os procedimentos de resposta mais sustentáveis, mais ágeis e mais céleres.
O apoio a idosos, a pessoas com deficiência, a desempregados e a crianças será garantido pela aposta nas Misericórdias e nas IPSS. Ou seja, reconhecendo que a sociedade se mobiliza e organiza-se antes de o Estado equacionar respostas, a grande aposta vai passar pelo apoio a organizações da economia social solidária para ultrapassar a crise e para estimular a economia, particularmente nas zonas mais deprimidas.
Outra medida ali prevista passa pelo acolhimento de um maior número de utentes nos equipamentos (creches, centros de dia e lares) das IPSS e Misericórdias, sempre com avaliação prévia e o aval das estruturas da Segurança Social e dentro das garantias de funcionalidade, sustentabilidade e salvaguarda das respectivas condições.
Uma medida inovadora que é anunciada no Programa é a da criação de um Fundo de Emergência Social, para brevemente entrar em vigor. Para além das crianças e idosos, o seu alvo preferencial serão as pessoas desempregadas - tenha cessado ou não o subsídio de desemprego, e não estejam abrangidas por outras iniciativas de protecção social. A sua base de estrutura será assente nas autarquias (sinalização das situações, acompanhamento e controlo) e na sua gestão devem participar as IPSS e as organizações da sociedade civil. Serão prioritários, em termos de entrega às famílias, alimentação, vestuário e medicamentos. Serão ainda criadas parcerias de responsabilidade social entre farmácias e autarquias de forma a melhorar a disponibilização de medicamentos às famílias de mais baixos recursos, designadamente idosos. Será também criado um “Cartão Solidário” destinado a apoiar a iniciativa e a envolver as entidades bancárias, de acordo com o previsto na Lei para estas situações e a sua duração estender-se-á até Dezembro de 2014, sendo alvo de avaliação semestral. O enquadramento técnico será garantido pelas IPSS.
3. Muito embora no Programa do Governo seja reconhecida, e bem, a importância do Sector Solidário, há ainda um percurso a fazer. Cooperando e dialogando. Nomeadamente, para se evitarem erros na transferência para as Autarquias de competências que se encontravam imputadas ao Estado Central.
A lei de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais filia essa operação, entre outros, no princípio da subsidiariedade – o que, num primeiro nível, corresponde à realidade: a transferência para uma autarquia local aproxima a resposta dos destinatários.
Mas tal princípio conhece outros e simultâneos níveis – como o de ser ainda subsidiariedade a devolução aos entes de natureza privada de atribuições e competências que se encontravam radicadas na esfera pública, mas que, por natureza, correspondem ao sopro vital daquelas entidades.
Da cumulação desses dois níveis, a subsidiariedade deve verificar-se, em primeira linha, para o nível privado; e só numa segunda opção, de forma supletiva, para um outro nível da esfera pública – o nível autárquico.
Deve passar a ser um dado adquirido a noção de que o serviço prestado pelas IPSS, não obstante a autonomia destas e a sua natureza particular, deverá ser classificado como verdadeiro serviço público, quer no que respeita a prestações vinculadas ao princípio da universalidade, quer nas vinculadas ao princípio da solidariedade.
A ausência de um quadro legislativo claro no que se refere à separação e delimitação das áreas de intervenção das organizações solidárias e das autarquias locais ao nível territorial mais primário, como a freguesia (ou a paróquia) ou ao nível municipal, traduziu-se, nos últimos 4 anos, na emergência dos principais constrangimentos que visaram as IPSS: como os existentes na Rede Social, AEC’s, ATL’s e Parque Escolar.
O Programa do Governo é meritório quando se refere ao Sector Solidário; porém, quando, por exemplo, fala de estruturas assentes nas autarquias carece de algum enquadramento clarificador…
Mas merece inequivocamente a subscrição de um “Pacto de Confiança”.
Lino Maia, Presidente da CNIS
Data de introdução: 2011-07-08