COM MENOS RECURSOS TEMOS QUE FAZER MAIS E A MAIS GENTE

PADRE LINO MAIA PRESIDENTE DA CNIS POR MAIS TRÊS ANOS

O Congresso Eleitoral da CNIS, que deu a terceira vitória consecutiva ao padre Lino Maia, registou a maior afluência de sempre às urnas. Foram 954 os votantes, entre presenças e procurações. A Lista A, encabeçada pelo actual presidente, teve uma vantagem clara nas eleições para os Órgãos Sociais da CNIS para o triénio 2012-2015, vencendo a Lista B, liderada pelo padre Arsénio Isidoro, por 247 votos.
Com 64 anos de idade e com seis anos de liderança, o pároco de Aldoar preferia ter cedido o lugar, mas a conjuntura social e económica do sector, bem como a natureza da alternativa que se perfilou para lhe suceder fizeram-no considerar a candidatura a mais um mandato.
Venceu, Mais uma vez contra um padre. Lino Maia diz que está na hora de um leigo subir à presidência da CNIS, que acolhe no seu seio 41 por cento de IPSS ligadas à Igreja Católica.
Para o próximo mandato escolhe a sustentabilidade das IPSS como o desafio dos desafios, porque com menos recursos as instituições têm que fazer mais e a mais gente.

SOLIDARIEDADE – Foi a terceira vez que se candidatou às eleições da CNIS e venceu. Já não era sua vontade ir a votos. Presumo que foi a última…
Padre Lino Maia
- Tem que ser o último mandato. Será bom para a CNIS - não é conveniente que as lideranças se eternizem - e tem que ser bom para mim também. Estou de alma e coração na CNIS e neste projeto, mas é importante, de facto, que outra liderança surja para bem de todos.

Teve sempre oposição nas eleições. Mas, mas nem sempre foram as alternativas que gostava que surgissem.
Nunca foram as alternativas que gostava que surgissem. Nunca. Em nenhum dos três anos eleitorais. No primeiro eu pensei que o processo se desenvolvesse de modo diferente, até porque tinha sido a direcção anterior e o conselho directivo que votaram o meu nome para liderar o novo projecto. O que é certo é que apareceu o anterior presidente da direcção, que tinha mostrado interesse em abandonar. Nunca pensei que ele acabasse por liderar uma alternativa. Depois, no segundo mandato, não estava muito a par daquela hipótese que surgiu. Fiquei triste porque não queria que houvesse confronto entre padres e foi o que pareceu. A CNIS deve caminhar para ter uma liderança de leigos.

Nestas eleições a expressão “guerra de padres”, foi várias vezes utilizada nos jornais… As alternativas escolhem sempre um padre para liderar as listas.
Sem dúvida. Aliás, foram sempre alternativas que brotaram da mesma fonte. Quem esteve por trás há seis anos, há três anos e agora, por trás desta, são as mesmas pessoas. No fundo, foi sempre um grupo que se foi movimentando e há três anos deu por adquirido que à terceira tinha que ser de vez. E por isso voltaram a tentar, o que é legítimo, mas nem todos os processos terão sido adequados. Tentaram tudo por tudo. Eu, sinceramente, durante algum tempo soube das movimentações e andava tranquilo. Sei que alguns leigos foram recusando e, por fim, apareceu um padre.

No final dos congressos eleitorais tem conseguido passar uma ideia de união e boas relações com os padres que lideram as alternativas. Até parece que, pelo menos nas duas últimas eleições, há algum arrependimento dos seus opositores…
Sim, aliás, tanto há três anos como agora isso foi claro. E por isso é que me parece que nem todos os processos são bons. Eu gostaria que daquele grupo que andou a liderar, a movimentar-se para apresentar uma alternativa, é que deveria surgir uma liderança. Mas não quiseram dar a cara e tentaram sempre arranjar alguém. Inicialmente pegaram em figuras nacionais, pensando que isso iria criar uma vaga de fundo contra a actual direcção. Depois, porque essas figuras nacionais se puseram de parte, recorreram a um padre, pensando que um padre do patriarcado teria talvez um mercado de voto superior a um padre que era de uma diocese menor, muitas vezes considerado da província. Preferiria de facto que aquele grupo tivesse, no seu seio, descoberto um rosto para liderar o processo. Tanto há três anos como agora, os padres escolhidos para liderar o processo, jovens que, conhecendo melhor os grupos que estavam por trás e com quem se confrontavam, acabaram por perceber que não se deviam ter metido nestes processos.

Obteve a maior votação de sempre nestas últimas eleições. Esperava uma votação tão clara na actual direção?
A equipa directiva que eu integro é uma equipa muito boa. Estes três anos foram anos excelentes para a CNIS, de muitas dificuldades, que enfrentámos, mas em que a CNIS se afirmou inequivocamente. Conseguiu algumas vitórias de afirmação importantes para o presente e para o futuro. Não por mim, mas era uma injustiça esta equipa não ser reconhecida e reconduzida. Basicamente, é a mesma equipa. Muito sinceramente, fica mal dizer, mas contava que as coisas se processassem desta maneira. Não foi muito diferente daquilo que eu imaginava. Eu procurei apenas integrar a equipa, trabalhar com lealdade. A equipa merecia a vitória.

Durante o período de campanha disse, muitas vezes, que não queria nem os bispos nem os partidos metidos nas eleições da CNIS. Houve tentativas de interferência?
Houve intromissões, sem dúvidas. Quando disse no dia das eleições a uma estação televisiva que havia partidos a imiscuírem-se era verdade. Não digo que fossem os partidos, assim tal qual, mas grupos partidários, com essa marca de partido, houve duas tentativas. Não preciso dizer quem, mas isso foi claro. Quanto a bispos, não senti a intromissão. Houve a tentativa de instrumentalizar serviços episcopais ou diocesanos. Isto aconteceu, num caso. Sei que alguns bispos foram abordados, para um lado e para o outro, não vou dizer que de um lado estão os anjos e do outro os demónios, mas os bispos, souberam distanciar-se. A CNIS nem é um projecto partidário. Na CNIS há dirigentes de todos os partidos e não apenas do arco dito do poder. Há dirigentes católicos, há dirigentes agnósticos, de todos os horizontes e a CNIS também não é uma instituição da igreja católica.

Na equipa directiva, apesar de alguns acertos, há uma aposta na continuidade,,,
É preciso atender ao presente e ter uma perspectiva de futuro, mas basicamente, é uma ideia de continuidade. De nove continuam cinco e os outros quatro estão noutros outros órgãos sociais da CNIS. Houve entrada de quatro elementos novos que nos vão trazer novas ideias, novas vitalidades, novas energias porque liderar ou estar numa equipa como a CNIS é muito estimulante.

Este mandato vai ser marcado pela crise que o país vive? Pela necessidade de cuidar das instituições para que elas consigam cuidar cada vez mais das pessoas?
O grande desafio, neste momento, para as instituições é manter aquilo que fazem e, provavelmente, alargarem as suas respostas. Há mais necessidades, mas é necessário atender à sustentabilidade das instituições. Isto obriga a uma gestão muito atenta. Obriga a que todos nós nos demos as mãos para fazermos o mesmo e mais com menos recursos. Há menos recursos e há mais solicitações. Isto obriga-nos a criar outras formas de financiamento das IPSS porque as actuais fontes de financiamento - o estado, os utentes, os dirigentes e a comunidade - não aumentarão muito o seu contributo. Estamos a ficar exangues. É preciso criar outras formas de financiamento. A sustentabilidade é o desafio dos desafios. Há dois ou três anos atrás, a pretexto da qualidade, dizia-se que muitas instituições acabariam por fechar porque não conseguiriam acompanhar o processo. Sempre fui tentando contrariar isso. Agora é claro que todas as instituições que existem são necessárias e é preciso dar-lhes condições para que possam responder ainda a mais utentes. Há outros desafios, tão ou mais importantes, que vão sempre entroncar na sustentabilidade. A co-responsabilização na contratação coletiva é essencial. Todos nós sabemos que há passos a dar e não pode haver aqui uma inversão, influenciada pela actual conjuntura. São evidentes as boas relações com as centrais sindicais, que compreendem e reconhecem os esforços dos dirigentes da CNIS e dos dirigentes das instituições. E comungam de muitas das suas preocupações. Outro desafio é o da proximidade. As IPSS já são instituições de proximidade e, em muitos sítios, dada a sua capilaridade, são praticamente os únicos serviços efectivamente próximos das populações. Com a reforma do mapa geográfico, que está a ser estudada, essa tendência aumenta. Sou crítico em relação ao processo que está em marcha para a reformulação do programa do mapa geográfico. Nós precisamos não de distanciamento mas de aproximação. As pessoas têm de ser a grande preocupação de todos os agentes, de todas as realidades, e por isso mesmo penso que as instituições de solidariedade serão a única realidade de proximidade em muitos locais. É um novo desafio e nós temos que estar atentos. Pertencemos a um sector onde está a União das Misericórdias, a União das Mutualidades e há concertação entre as organizações. É fundamental para o futuro. No contexto europeu, Portugal tem uma experiência neste domínio única e exemplar. É claramente o país onde a sociedade melhor se organiza, para responder às necessidades. E isto é uma via de futuro. A proteção social das populações está muito na mão organizada das populações. Partilhar esta experiência portuguesa com outras comunidades a nível europeu e trocar experiências é outro desafio. Afirmar mais a CNIS num contexto europeu também tem que ser uma aposta neste mandato. Diria que serão talvez os grandes desafios.

O protocolo de cooperação que foi assinado recentemente é já uma espécie de trave-mestra desses desafios para o futuro?
É. Aliás, eu posso dizer, e é consensual, que é o melhor protocolo que eu assinei. Um protocolo nunca é a assinatura de um só agente. São pelo menos quatro a subscrevê-lo: as três organizações e o governo. Este protocolo foi feito de um modo diferente. O que foi assinado corresponde muito à matriz que a CNIS apresentou ao novo governo. No fundo, o futuro, que já começou, será um tempo em que, com menos recursos, temos que fazer mais e a mais gente. Por isso, a moderação que brota deste protocolo nas exigências, o atirar mais para a comunidade, a co-responsabilidade naquilo que cria, são já algumas linhas de força que apontam um caminho que tem de ser percorrido. É um caminho que também nos leva a imaginar um estado social com uma nova cambiante. Eu sou defensor do estado social, mas agora insisto, tem de ser um estado solidário, isto é, nem todos beneficiarão da mesma maneira dos serviços que são universais. Os que podem comparticipar terão de comparticipar para que aqueles que não podem tenham acesso, nas mesmas circunstâncias àqueles serviços com gratuitidade.

O facto de ter apresentado essas propostas e elas terem sido quase todas aceites tem-lhe valido algumas críticas de exagerada sintonia com o governo. É uma pessoa de acordos e não de rupturas. Isto tem-se reflectido ao longo dos tempos, durante aquilo que tem sido a CNIS?
Nos anos anteriores, eu também era acusado do mesmo e as pessoas esquecem-se que tive rupturas duras, muito duras, com o governo anterior. Eu não gosto, mas quando é preciso publicamente falar duro falo duro. A CNIS tem elaborado o seu pensamento, acredita no seu pensamento, faz valer o seu pensamento porque acredita nele. Este protocolo é muito isso mesmo. Nós não estivemos à espera que outros pensassem tudo por nós. Com o governo anterior isso também foi reconhecido. A CNIS chega sempre com um pensamento elaborado e com crença no seu pensamento. Acaba por fazer valer os seus princípios. Agora colagem, a este governo…

Ou colagem deste governo à CNIS…
Em alguns momentos pode haver. É com este governo que temos de negociar e temos de trabalhar. O governo tem que saber ouvir aqueles que estão no terreno, aqueles que sabem. Até o próprio primeiro-ministro tem dito isso mesmo. Isso é o reconhecimento, no fundo, da estruturação do nosso pensamento e da força do nosso pensamento. Não é desta direção da CNIS é de todo este sector. No fundo, a CNIS procura estar em sintonia, ouvir, porque os dirigentes da CNIS são dirigentes de instituições. Há uma grande sintonia e uma grande comunhão com todo este mundo que está no terreno.

Quanto terminar esse seu mandato como gostaria de deixar a CNIS e, sobretudo, como gostaria de deixar as instituições que se revêem na CNIS?
Claramente que, quando me põe assim a questão eu lembro-me sempre de uma frase de um grande pensador que “uma determinada realidade é eterna enquanto dura”. Claro que, as dificuldades, quando se enfrentam são sempre as maiores, maiores do que as anteriores que já foram vencidas e maiores que as futuras que ainda não se projectam. Este tempo é muito difícil, mas é neste tempo que temos que viver. São as dificuldades de hoje que temos de enfrentar e tentar vencer.

Gosta de ser Presidente da CNIS e do que isso representa?
Não me considero figura pública. Isto tem muito mais de odioso do que de benéfico porque é esgotante. Isto de ter alguma projeção paga-se muito caro. Eu gosto de estar na CNIS, não vou dizer que gosto de ser presidente, eu gosto de estar na CNIS, gosto muito da equipa, acredito naquilo que se faz e da maneira como se faz neste setor. Enquanto eu puder dar algum contributo, fá-lo-ei com muita alegria. Respondendo directamente à sua questão eu diria que suporto com alegria o fardo de ser presidente da CNIS e preferia não ser tão solicitado pela sociedade porque, de facto, é desgastante.

 

Data de introdução: 2012-03-07



















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