O momento de crise económica que Portugal vive no presente levanta cada vez mais problemas às IPSS, que se deparam com uma generalizada escassez de recursos, sendo crescentemente solicitadas por famílias e indivíduos a viverem em carência, muitos deles pela primeira vez.
«Neste contexto, reveste-se da maior pertinência e oportunidade a decisão da CNIS relativa ao estudo, que agora se apresenta, sobre o “desenvolvimento das instituições e grupos de acção social”. Pertinente é também o facto do objecto do estudo não se circunscrever às próprias IPSS; ele abrange, de igual modo, os problemas sociais não resolvidos, e espera-se que tenha continuidade, numa outra fase, sobre os grupos de acção social de proximidade», pode ler-se na Introdução do estudo intitulado «As Instituições Particulares de Solidariedade Social num contexto de crise económica», coordenado pela professora e investigadora Sónia Sousa.
IMPORTÂNCIA NA ECONOMIA
E se é reconhecido por muitos a grande importância sócio-económica das IPSS na coesão social e atenuação de muitas situações de carência entre a população portuguesa, o estudo agora tornado público apenas vem confirmar, de forma científica, essa relevância.
A esse propósito, o estudo começa logo por avançar que, em 2008, as IPSS representaram 1,7% do Valor Acrescentado Bruto (VAB) nacional, um valor correspondente a 2.9 mil milhões de euros. Nesse mesmo ano, as IPSS foram ainda responsáveis por 2,9% das remunerações nacionais (2.5 mil milhões de euros), 2,4% das despesas de consumo final (3.6 mil milhões de euros) e 1,4% do investimento nacional (554 milhões de euros).
No retrato traçado pela equipa de Sónia Sousa, à excepção do investimento, as IPSS têm registado um crescimento real em qualquer dos restantes agregados em linha com o crescimento verificado no total da economia.
Quando aferida pelo VAB, a importância das IPSS na economia nacional é comparável a sectores de actividade como a Indústria de Borracha e Plásticos (1,7%), a Indústria de Metais e Produtos Metálicos (1,8%) e a Indústria de Alimentação, Bebidas e Tabaco (2,0%). Por outro lado, supera o peso no VAB de actividades como a Indústria de Material de Transporte, incluindo Automóveis (0,8%), os Serviços de Consultoria, Informática e Informação (0,9%) e a Indústria de Madeira, Pasta, Papel e Cartão (1,5%).
Já se for avaliada pelo valor das remunerações pagas no País, a relevância das IPSS assume um carácter semelhante à dos Serviços Jurídicos, Contabilísticos, de Arquitectura e Engenharia (2,8%) e dos Serviços Administrativos de Apoio às Empresas (3,0%), ultrapassando o de actividades como a Indústria de Material de Transportes, incluindo Automóveis (1,1%), os Serviços de Consultoria, Informática e Informação (1,2%), a Indústria da Madeira, Pasta, Papel e Cartão (1,4%), a Indústria de Borracha e Plásticos (1,7%), a Indústria de Metais e Produtos Metálicos (2,0%), a Indústria de Alimentação e Bebidas (2,1%) e a Indústria de Têxteis, Vestuário, Couro e Calçado (2,7%).
No entanto, na apresentação pública do estudo em Lisboa, na Fundação Millenium bcp, que patrocinou a sua realização, a investigadora Sónia Sousa ressalvou que “o peso económico das IPSS é hoje superior ao que o estudo indica”.
PORTUGAL NO PÓDIO DA UE
Já em termos europeus, Portugal está entre os três primeiros Estados-membros da União Europeia em termos de importância económica das IPSS. Ou seja, em termos de VAB e peso das remunerações, Portugal apenas é ultrapassado pela Finlândia, ao passo que em termos de peso do consumo final as IPSS lusas apenas são superadas pelo Luxemburgo e, novamente, pela Finlândia.
Perante os números expostos e num clima de grande escassez de recursos, «a sustentabilidade é uma
palavra-chave neste estudo», pode ainda ler-se na Introdução, onde, de seguida, são apontados os caminhos seguidos no estudo: «E, sem prejuízo da sua acepção no sentido mais corrente, ela [sustentabilidade] é considerada aqui no triplo sentido de viabilidade, subsistência e complementaridade. Viabilidade das próprias instituições; subsistência, na solução de problemas de pessoas necessitadas; e complementaridade entre as instituições e os grupos de acção social, sem prejuízo da cooperação com outras entidades da sociedade civil e com o Estado».
No fundo, como explicou a coordenadora do estudo, “o objectivo foi o de definir estratégias de acção que permitam a sustentabilidade das IPSS”.
Assim, e de olhos postos nos três vectores identificados – viabilidade, subsistência e complementaridade –, a coordenadora do estudo deixou algumas das ideias fortes que emanam da investigação levada a efeito.
VIABILIDADE
Relativamente aos desafios à viabilidade financeira das IPSS, o estudo constata que, à excepção dos anos de 2000 e 2001, entre 1995 e 2008 as IPSS foram sempre deficitárias. Esta situação prende-se directamente com as fontes de financiamento das IPSS, muito dependentes do Estado. No entanto, a investigadora realçou que “há um esforço de diversificação” por parte das instituições.
Como grande diagnóstico quanto à viabilidade, o estudo indica que “o modelo de financiamento é insustentável a prazo” e que é “fundamental uma mudança de mentalidades do lado das IPSS e da sociedade civil”.
Como recomendações, o estudo aponta para uma “gestão empresarial com sentido social”; a criação de “estratégias de diversificação das fontes de receita”; o estabelecimento de “protocolos e parceiras com empresas no âmbito da responsabilidade social” destas; a criação de “programas de mentoring e patrocínio de pessoas e de causas”; e o delineamento de “estratégias de redução de custos e do aumento da eficiência dos recursos disponíveis”.
SUBSISTÊNCIA
Relativamente à subsistência, o estudo identifica na relação necessidades/respostas sociais, as solicitações sem resposta adequada, não só nos serviços convencionais, onde há listas de espera para vagas comparticipadas e para serviços mais económicos e de melhor qualidade, mas também fora dos serviços convencionais, como são a procura de emprego e a carência material. Daí que os desafios à actuação das IPSS passem pelo desemprego e a carência material e “pelo desenvolvimento das capacidades de resposta endógenas”.
Como recomendações, o estudo aponta: “Apoio aos desempregados na criação do próprio emprego e na procura de emprego, especialmente se for prestado por voluntários com conhecimentos na área dos recursos humanos; apoio na pesquisa de alternativas de qualificação e reconversão profissional para desempregados; aconselhamento na gestão do orçamento familiar e estímulo à poupança; criação de lojas solidárias, físicas e virtuais (internet), e ainda de hortas sociais; optimização dos Serviços de Apoio Domiciliário, “que tendem a ser caros porque mal organizados”; e avaliação regular do impacto das respostas sociais.
COMPLEMENTARIDADE
No tocante ao terceiro e último pilar, o da complementaridade (entre as IPSS e outras entidades públicas e privadas), segundo Sónia Sousa, “há uma maior colaboração das Câmaras Municipais do que das Juntas de Freguesia, mas ambas apoiam as IPSS”, o que entre as instituições e empresas e sociedade civil é algo “muito incipiente e irregular”.
O estudo sublinha ainda que “o Estado é a principal fonte de financiamento das IPSS”, o que condiciona bastante, especialmente em contexto de grande escassez de recursos, a actuação destas últimas.
Isto acontece também porque, como se pode ler no estudo, ao longo da história, «as instituições “sentiram-se” contratadas pelo Estado para a prestação de serviços que a este competiam; e, ao mesmo tempo, procuraram manter a sua identidade própria, radicada na sociedade civil, independentemente do papel do Estado». Nesse sentido, tem prevalecido uma concepção de cooperação com o Estado e com outras entidades.
Como recomendações para uma melhor complementaridade, o estudo aponta os seguintes caminhos: a oferta de serviços em rede com instituições e grupos congéneres; a operacionalização da Rede Social; a adopção uma atitude mobilizadora da sociedade civil; adoptar um papel activo na detecção de carências sociais junto das escolas, autarquias, forças de segurança, bombeiros, etc.; fazer uma maior e melhor comunicação da importância social das IPSS; fazer marketing social e promoção da marca; e o Estado, enquanto regulador, deve criar quadros legais estáveis, coerentes, razoáveis e previsíveis e implementar políticas públicas com impacto nas valências das IPSS.
Profundo e minucioso, este é um superficial retrato do estudo «As IPSS num contexto de crise económica», documento que abre horizontes ao futuro e à sustentabilidade das instituições que, cada vez mais, são confrontadas com mais e renovadas necessidades sociais.
Depois de Lisboa, seguiu-se a apresentação pública no Porto, no último dia de Abril.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
Data de introdução: 2012-05-03