FUNDAÇÃO S. JOÃO DE DEUS, LISBOA

Porto vai ter uma delegação em breve

Com cinco séculos de história, a Ordem Hospitaleira de S. João de Deus está, actualmente, presente em 52 países, dinamizando mais de 300 equipamentos, entre hospitais e obras missionárias. Em termos gerais, e segundo Rui Ferreira Amaral, presidente da Fundação S. João de Deus, a mais jovem estrutura emanada da Ordem na Província Portuguesa, “a hospitalidade dos Irmãos de S. João de Deus tocou, em 2013, cerca de 17 milhões de pessoas em todo o Mundo”.
Em Portugal, a ordem religiosa está presente em muitos pontos do País, contando com oito casas de saúde e hospitais, essencialmente vocacionados para doentes do foro psiquiátrico, mas não só.
Em 2006, do seio da estrutura da Província Portuguesa dos Irmãos de S. João de Deus (que inclui ainda Brasil, Timor e Moçambique), surgiu a Fundação como elemento de maior proximidade com os benfeitores.
“Os Irmãos de S. João de Deus eram conhecidos como os Irmãos Esmoleiros, porque passavam de casa em casa a pedir, mas nesse momento era também feito o agradecimento”, começar por contar Rui Ferreira Amaral, explicando a génese da Fundação a que preside: “Com esta transição quase para uma via digital de fazer as benfeitorias, muitas vezes o agradecimento ficava pelas palavras escritas ou pelo telefone, que também são importantes, mas a aquela relação olhos-nos-olhos acabava por ficar algo descurada. A Fundação foi, de facto, criada para colmatar um pouco esta separação entre quem ajudava os Irmãos de S. João de Deus e o trabalho que estes faziam”.
O mais interessante na história da Fundação, para Rui Ferreira Amaral, é perceber a razão da sua criação em 2006: “Diria que os Irmãos de S. João de Deus pensaram criar a Fundação porque, de alguma forma, o número de Irmãos era cada vez menor, muitos dos que continuam têm cada vez mais idade e estes dois factores juntos tornavam muito difícil a tarefa de fazer o agradecimento aos benfeitores. Um agradecimento como é devido e é tradição nos Irmãos de S. João de Deus”.
Após a criação, mais dois momentos marcam a história da Fundação, o último dos quais em 2010 quando a própria instituição e seu funcionamento foi repensado.
“No ano de 2010 temos o momento em que a Fundação repensa todo o mecanismo que estava a ser criado para uma instituição que se propunha fazer angariação de fundos pura, para uma instituição que tem missão social agregada. Esta inovação que os Irmãos de S. João de Deus quiseram fazer numa instituição que não tinha trabalho social, porque já se alicerçava naquilo que eram as outras intervenções, com os oito hospitais e as três missões em países de Expressão Portuguesa, davam suficiente suporte àquilo que era o trabalho dos Irmãos em Portugal e na diáspora”, sublinha o presidente da Fundação, relembrando que tal não era suficiente para que todas as pessoas percebessem o seu papel: “Mas as pessoas perguntavam o que é que a Fundação faz. E havia que responder a essa questão e o que fizemos foi baralhar e voltar a dar, ou seja, repensámos a instituição, voltámos a estruturar o que realmente podia acontecer e começámos por projectos de intervenção junto das pessoas que mais precisavam”.

O PAPEL DO BENFEITOR

A esta altura da conversa com o SOLIDARIEDADE, Rui Ferreira Amaral reforça o elogio aos benfeitores, peças fundamentais em toda a engrenagem da Ordem Hospitaleira. E no caso particular da Fundação com um papel muito activo: “Aquilo que é interessante, e sem qualquer falsa modéstia, é que quem são os verdadeiros protagonistas desta mudança são os benfeitores, porque são as pessoas que de alguma maneira motivaram as mudanças que fomos fazendo. E assim, de uma instituição sem intervenção social activa, passámos para uma instituição com intervenção social, tendo os nossos benfeitores como motores. São as pessoas que contribuem que, de certa forma, encontram o objecto de trabalho”.
Para Rui Ferreira Amaral, “a importância e papel primordial dos benfeitores é crucial, enquanto homens e mulheres que querem fazer o bem”, que, segundo ele, entronca na mensagem que S. João de Deus deixou aos primeiros Irmãos, que ficaram em Granada, e que abriram os caminhos da instituição pelo mundo fora: “Irmãos fazei o bem, bem-feito!”.
Nesse sentido, ao repensarem o papel e acção da Fundação, os seus responsáveis concluíram que necessitavam de assegurar a sustentabilidade da instituição para que cada contribuição de um benfeitor fosse directa e exclusivamente para o projecto por ele indicado e não fosse também gasto em custos administrativos.
“Quando em 2010 repensámos a instituição a primeira questão que se colocou foi se valia a pena continuar com uma instituição que, eventualmente, poderia não ser sustentável. Ou se resolvia a questão da sustentabilidade ou o agradecimento que se faz aos benfeitores não necessita de ter uma instituição própria. Em resumo, vale ou não vale a pena ter uma instituição que faça este serviço de proximidade? O que percebemos é que resolvida a sustentabilidade, a pertinência da instituição era crescente, ou seja, a necessidade de existência de uma instituição que tivesse um trabalho social diferente daquele que é o trabalho dos hospitais é muito importante”.

NEGÓCIOS SOCIAIS

É neste sentido que surgem os espaços de «cowork» Space4U, já em funcionamento em Lisboa e na Guarda, e ainda as residências universitárias solidárias, para já apenas em Lisboa, mas os responsáveis pela Fundação esperam abrir um outro no Porto até Março.
“Garantida a sustentabilidade da Fundação com estas receitas, todo o dinheiro que os benfeitores entregam vai directamente para o projecto que cada um quer apoiar e não se gasta em custos administrativos da própria fundação!... E podemos fazê-lo porque temos estes, digamos, negócios sociais, que são o Space4U e o Atrium Hospitalidade, ou seja, a residência universitária”, refere o presidente da instituição, explicando: “Os espaços da Fundação são administrativos, à excepção daquilo que são os projectos de sustentabilidade da própria instituição, como o de «cowork» e a residência universitária. Encontrámos um modelo de sustentabilidade que se baseia na rentabilização do património, mas que vá de encontro ao que as pessoas procuram. Falo concretamente do «cowork», sendo que fomos a primeira instituição a ter um espaço destes em Portugal, pois os espaços do género que existiam eram todos de iniciativa privada”.
O novo espaço da Fundação no Porto nasce da doação de um apartamento feita por uma benfeitora que apenas pediu que “servisse para acolher alguém”.
“Como já tínhamos esta experiência da residência universitária em Lisboa, achámos que seria interessante termos um grupo de jovens também no Porto. É um espaço que terá entre quatro a seis pessoas, mas, tal como aqui em Lisboa que temos uma série de projectos na rua, este novo espaço servirá para assegurar a sustentabilidade e o seu modelo de intervenção social será muito baseado num projecto que para nós é muito importante, que é o «Somos por si, somos por Portugal», cuja ideia é intervir junto dos familiares de emigrantes, sinalizados por estes. E só depois de sinalizados pelos familiares emigrados é que intervimos”.

PROJECTO INOVADOR

A intervenção social da Fundação acontece através de projectos [ver texto anexo], fora de portas, num trabalho de proximidade que segue a tradição dos Irmãos de S. João de Deus.
“O mecanismo de intervenção da Fundação é forçosamente o de ir ao encontro das necessidades das pessoas e não do acolhimento”, esclarece o presidente, destacando um elemento primordial neste trabalho: “Quando vamos a casa dos benfeitores agradecer, para além de entregarmos a carta de agradecimento, perguntamos-lhe ainda se conhece alguma situação ou alguém que precise da nossa ajuda. É o próprio benfeitor que participa na sinalização das situações que necessitam de intervenção. Mas também nos apercebemos que muitos destes benfeitores vivem sós e também eles necessitam do nosso apoio e é aí que actuamos”.
Hoje, a Fundação conta com cerca de 5.000 benfeitores, especialmente nos grandes centros urbanos, mas também onde os Irmãos têm os hospitais, como Barcelos, Braga, Viana e toda a região do Minho, também em Montemor-o-Novo, Évora, Beja e até Portalegre e Santarém, nas Ilhas e Lisboa.
Marco também importante na história da Fundação, segundo o seu líder, foi o projecto ligado às minas terrestres em Angola, iniciado em 2007, mas apenas devidamente efectivado em 2011. “Temos um hospital ortopédico em Montemor-o-Novo que recebia vítimas das minas, as tratava e depois fazia a reabilitação e o reenvio destas pessoas para o seu país natal. A concretização deste projecto foi uma inovação naquilo que foi sempre o mecanismo dos Irmãos de S. João de Deus, que esteve sempre mais ligado à área da saúde mental”, assinala Rui Ferreira Amaral, lembrando que seis dos oito hospitais dos Irmãos de S. João de Deus dedicam-se à saúde mental – Sintra, Funchal, Angra do Heroísmo, Ponta Delgada, Areias de Vilar e Barcelos –, há depois o hospital ortopédico em Montemor-o-Novo e uma clínica de reabilitação física em Lisboa.

PROJECTOS

Ferro de Soldar – Através deste projecto realizam-se reparações domésticas em casa de idosos e de pessoas com deficiência, em situação de vulnerabilidade social. São estabelecidas parcerias funcionais com as autarquias, bombeiros, órgãos de polícia e com associações locais para identificação de domicílios de pessoas em situação de carência, isolamento ou deficiência, que necessitem de pequenas reparações de baixo custo. O projecto é apoiado pela Missão Sorriso e arrancou em 2012.

Armazém Social – Pretende ser uma ferramenta de «background» para o «Ferro de Soldar», contando com o apoio de empresas distribuidoras ou produtoras de materiais utilizados naquele projecto. O Armazém Social recolhe e armazena os materiais sem qualquer custo para o beneficiário.

Pano d’Limpar – Tem um sistema de funcionamento semelhante ao projecto «Ferro de Soldar», embora assente na limpeza dos espaços habitacionais para promover a recuperação da habitabilidade. A intervenção é feita com o contributo de voluntários específicos para este projecto.

Academia da Memória – É um projecto com o objectivo de realizar sessões de estimulação cognitiva, individuais ou em grupo, para todas as idades.

Programa «Somos Por Si» – Com início em 2013, este programa intervém junto de pessoas idosas, sem rede familiar de apoio e que se encontram em situação de isolamento social. Apoia nas tarefas diárias e/ou estimula a participação em atividades sociais. As visitas e as atividades são dinamizadas por pessoas com doença mental acompanhadas por colaboradores, parceiros e voluntários, numa perspetiva de “cidadãos apoiam cidadãos”. O «Somos por Si, Somos por Portugal» surge da consolidação do programa «Somos por Si», partilhando assim dos mesmos objectivos, mas com o compromisso de apoiar os familiares de emigrantes portugueses.

«Sementes a Crescer - E5G» – Apoiado pelo Programa Escolhas 5.ª Geração, este é um projecto em que a Fundação é a gestora, tendo a sua área de intervenção na freguesia do Beato, em Lisboa. O projecto promove a inclusão social e uma cidadania activa e participativa, com o objectivo de levar à erradicação das problemáticas ligadas à educação e à desocupação da população territorial.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2014-02-10



















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