Mais de metade dos profissionais das unidades de saúde portuguesas é vítima de actos de violência no local de trabalho, sobretudo agressões verbais, o que tem consequências negativas na qualidade dos cuidados prestados, segundo vários estudos.
André Biscaia, clínico geral e responsável pela organização do seminário "Violência contra os Profissionais de Saúde no Local de Trabalho", revelou que mais de 50 por cento dos profissionais de saúde foi alvo de actos de violência nos últimos doze meses.
Uma percentagem que aumenta para 60 por cento quando o local de trabalho é o centro de saúde e que, frisou André Biscaia, tem "consequências importantíssimas na qualidade assistencial". "Os profissionais que sofreram actos de violência sofreram-no mais do que uma vez, e os que sofrem mais têm mais ausências ao serviço", explicitou o médico.
Estudos realizados em hospitais distritais e centros de saúde em 2000 e 2001 e um outro de âmbito nacional realizado este ano pela Direcção-Geral de Saúde indicam que os enfermeiros são a primeira classe profissional vítima de violência, seguindo-se os médicos e os administrativos. Mas, alertou André Biscaia, os estudos revelam que a violência atinge todos os trabalhadores das unidades de saúde: auxiliares, pessoal de limpeza, pessoal da segurança e até elementos do conselho de administração dos hospitais.
Os actos de violência podem ir desde a agressão verbal à física, agressão moral, discriminação, agressão sexual e actos contra a propriedade. Já os agressores variam consoante os locais, com os utentes a serem os principais nos centros de saúde, a que se juntam os seus familiares quando se trata de hospitais.
André Biscaia fez questão de realçar que falar de agressão contra profissionais de saúde "não é referir um problema que opõe utentes e profissionais, porque também há agressão entre profissionais", e que esta também não é uma realidade exclusiva de Portugal.
Entre as múltiplas causas de um problema "que pode afectar qualquer pessoa, em qualquer instituição", o médico destacou a organização dos serviços e as condições de trabalho. Apesar da "grande prevalência" de actos violentos nas unidades de saúde portuguesas, André Biscaia lamentou "que não se conheçam políticas muito claras em relação a este problema" e que ele tenda a ser "desvalorizado" pelas administrações das unidades quando confrontadas com a sua existência.
O médico salientou também a "percepção distorcida" com que a violência contra os profissionais de saúde é transmitida pelos meios de comunicação social. Uma análise realizada em 2001 às primeiras páginas da imprensa nacional e regional portuguesa revelou que os actos de violência física (que representam três por cento da violência contra profissionais de saúde) constituíam a maioria das notícias sobre o tema.
Já a violência verbal, a maioria dos actos violentos contra os profissionais de saúde (40 por cento), não aparecia nas notícias. No que toca aos locais, a imprensa dá também mais destaque aos actos violentos contra profissionais que ocorrem nos hospitais e serviços de urgência, relegando para segundo plano os centros de saúde, onde os estudos indicam que são mais prevalentes.
Data de introdução: 2004-11-10