O Bloco de Esquerda, PS e PCP chegaram a acordo para a criação do Estatuto do Cuidador Informal, num texto que prevê a possibilidade de os cuidadores que deixam de trabalhar poderem continuar a ter uma carreira contributiva.
No texto acordado entre os três partidos prevê-se que quem recebe o apoio social do cuidador paga menos para a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados quando recorre ao descanso do cuidador, uma vez que muda a fórmula de cálculo da comparticipação paga pelas famílias, que atualmente pode ir até aos 30 euros/dia.
Outra das novidades relativamente à proposta inicial do Governo, que previa apenas medidas de apoio, sem a criação de um verdadeiro estatuto, é que o descanso do cuidador incluirá a possibilidade de ser feito em casa por via de apoio domiciliário e não só em internamento em instituições.
Também a continuidade da carreira contributiva é um aspeto novo. Hoje em dia, quem deixa de trabalhar para cuidar em casa de familiares acaba por ficar sem direito a reforma.
O texto prevê que a prova de que se é cuidador informal principal seja feita oficiosamente pelos serviços competentes da segurança social e que o acompanhamento, fiscalização e avaliação do cumprimento das medidas das respetivas áreas de intervenção cabe ao Instituto da Segurança Social e aos serviços de saúde. "Sem prejuízo da intervenção dos serviços da área da saúde e da segurança social, sempre que seja necessária a intervenção específica da competência do município ou de entidades de outros setores, designadamente da justiça, educação, emprego e formação profissional e forças de segurança, é dever dessas entidades a colaboração com o cuidador informal e com a pessoa cuidada, prestando-lhes toda a informação e apoios adequados", refere.
As introduções acordadas entre os três partidos preveem ainda o desenvolvimento de projetos experimentais "destinados a pessoas que se enquadrem nas condições previstas na Estatuto do Cuidador Informal, de acordo com uma distribuição por todo o território nacional".
Estes projetos piloto terão a duração de um ano e preveem, entre outras matérias, a atribuição aos cuidadores informais principais um subsídio pecuniário.
No prazo de dois meses a contar da data da entrada em vigor da lei, terão de ser aprovados por portaria os termos, condições e procedimentos com vista a acompanhar e avaliar os projetos piloto, bem como os territórios a abranger.
O Estatuto de Cuidador Informal acordado entre BE, PS e PCP prevê a criação da figura do cuidador informal "principal" e a do "não principal". O "principal" será "o cônjuge ou unido de facto, parente ou afim até ao 4.º grau da linha reta ou da linha colateral da pessoa cuidada, que acompanha e cuida desta de forma permanente e que com ela vive e comunhão de habitação, não auferindo remuneração de atividade profissional ou pelos cuidados que presta à pessoa cuidada".
O cuidador "não principal" é o que cuida de forma regular, e não permanente, podendo neste caso auferir ou não remuneração de atividade profissional ou pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.
Quanto à pessoa cuidada, o estatuto prevê que seja quem necessita de cuidados permanentes por se encontrar numa situação de dependência e seja titular de complemento de dependência de 2.º grau, de subsídio por assistência a terceira pessoa ou de complemento de dependência de 1.º grau, neste caso mediante avaliação especifica dos serviços de verificação e incapacidade da segurança social.
Entre os direitos introduzidos com este acordo estão o consentimento da pessoa cuidada e o direito à conciliação com a vida profissional.
Em Portugal, existem entre 230 mil a 240 mil pessoas cuidadas em situação de dependência.
ASSOCIAÇÃO APLAUDE
A Associação Nacional de Cuidadores Informais congratulou-se com a criação do Estatuto porque passa a haver um ponto de partida que pode ser melhorado, salientando que fica aquém das pretensões da associação, nomeadamente em matéria de proteção laboral. "Congratulamo-nos por haver um estatuto, sendo que não são só medidas de apoio avulso", disse a presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais (ANCI).
Segundo Sofia Figueiredo, este pode não ser o Estatuto ideal, mas é um ponto de partida que pode ser melhorado, ao contrário do que acontecia até agora em que não existia qualquer documento. "Sempre defendemos um estatuto porque com um estatuto há uma base para depois poder continuar a melhorar o mesmo", apontou.
Ainda assim, admitiu que este estatuto, resultado de um acordo entre Bloco de Esquerda, PS e PCP, fica aquém do que os cuidadores informais pretendiam já que "não está contemplada a proteção laboral".
"Gostaríamos de ter já medidas para os cuidadores não serem obrigados a perder o seu emprego, para promover o bem-estar em casa, no domicílio, para as pessoas não terem de ir para um lar por falta de recursos, de condições, porque nem todas as pessoas se podem desempregar para cuidar dos seus em casa", apontou.
Defendeu que também seria "muito importante" que tivesse sido possível contabilizar a carreira contributiva dos cuidadores informais para trás, através de um atestado multiusos, sublinhando que essas pessoas perderam o emprego, muitas delas há muitos anos, e que, consequentemente, não têm uma carreira contributiva e estão mais vulneráveis a situações de pobreza.
Elogiou, por outro lado, a forma como o descanso do cuidador foi contemplado no documento, desde logo por prever que esse descanso possa ser feito em casa de modo a que o cuidador não tenha de institucionalizar a pessoa cuidada para descansar, mesmo que por períodos curtos.
"Também achamos importante que a Rede Nacional de Cuidados Continuados cobre um valor mais baixo às pessoas com menos recursos para o descanso do cuidador porque estamos a falar de pessoas que estão empobrecidas", destacou Sofia Figueiredo.
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