As alterações em elevada escala que têm ocorrido no mundo industrial, causado pela globalização, têm trazido para a primeira linha do debate "a qualidade das relações industrias nas empresas e na concertação social" e cujos actores principais são os parceiros sociais (empresários e sindicatos).
O recente exemplo em Portugal, do acordo de empresa entre a Auto-Europa e os seus trabalhadores ocorrido em 2003, vem na sequência da tendência já estabelecida em direcção à negociação directa nas empresas entre as administrações das empresas e os representantes dos trabalhadores com a principal preocupação de ser a segurança no trabalho mais importante do que qualquer ganho financeiro de curto prazo.
Com efeito, a globalização está mudando as condições nas quais as organizações dos empresários e trabalhadores operam, novos desafios tais como: a conciliação do trabalho com a vida familiar, a questão do ’stress’ no trabalho, o trabalho em ’part--time’ e o trabalho temporário tem mudado a face das relações industriais. Está ocorrendo uma tendência, também já visível em Portugal, na descentralização das relações industriais da contratação colectiva para as negociações ao nível de empresa e ainda mais do que a nível de sector económico.
No entanto, é importante que exista um certo nível de coordenação a nível nacional e europeu com base na partilha de compensações, interesses mútuos e de boas práticas, através dos acordos dos parceiros sociais e dos governos nacionais tendo em conta que os desafios que se colocam a nível nacional e europeu são os mesmos: mudanças tecnológicas, re-estruturações e deslocações de empresas e envelhecimento das populações. A nível europeu já existem condições de enquadramento legislativo mínimo, através dos direitos fundamentais básicos e acordos negociados entre empresários e sindicatos em novos tópicos tais como: dispensa em licenças de parto, ’stress’ no trabalho e o tele-trabalho.
A "qualidade das relações industriais" é um tópico que está atraindo grande interesse a nível nacional e europeu, como resultado do crescente reconhecimento da importância do "diálogo social" e de "parcerias sociais" no atingir dos desejados objectivos económicos e sociais e também como instrumentos indispensáveis da boa governação das mutações e reestruturações industrias, mercados de trabalho e empresas.
A importância do "diálogo social" e das "parcerias sociais" é essencial para o ’MODELO SOCIAL EUROPEU’, que consiste principalmente em: um bom desempenho económico, um elevado nível de protecção social, de educação e de coesão social, seja possível de manter o que implica a necessidade de reformas económicas e sociais tais como: refinar as capacidades e qualificações dos cidadãos, modernização da organização do trabalho, promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres, a diversidade, a protecção das minorias e a promoção de políticas activas de envelhecimento.
Em complemento dos métodos e práticas tradicionais das relações industriais - contratação colectiva, resolução de conflitos, greves - as quais continuam a ter a sua importância, mas que devem ser colocadas num contexto mais elevado e alargado, aparecem novos comportamentos dos parceiros sociais, que tem a ver com uma melhor qualidade das relações industriais e que é determinada por:
-capacidade de construir consensos em ambos, no diagnóstico e na maneira de implementar a adaptação e modernização das relações de trabalho que derivam da Estratégia de Lisboa.
- atingir com sucesso as reestruturações industriais não se limitando apenas em defender níveis mínimos de qualidade de vida mas sim elevar esses níveis para assegurar uma partilha mais equitativa dos benefícios do progresso.
A União Europeia, através de comunicação recente veio identificar quatro dimensões que considera essenciais para a ’qualidade das relações industriais’:
- a criação de um sentimento de ’justiça’ e ’confiança’ através de acordos com vantagens mútuas para empresas e trabalhadores.
- a redução dos custos relacionados com a contratação e a resolução de conflitos (greves);
- o investimento em instituições que promovam a adequada flexibilidade às empresas e trabalhadores fazendo o possível para ajustar e agarrar novas oportunidades e ao mesmo tempo conceder às empresas e trabalhadores a segurança suficiente para realizarem investimentos e construir relações de longo prazo.
- o cumprimento de todos os objectivos relacionados com a política social e económica.
É de salientar ainda que o ’diálogo social’ e as ’parcerias sociais’ vem contribuir de forma positiva para a implementação da EEE (Estratégia Europeia de Emprego) através da sua colaboração na elaboração dos planos de acção nacionais. Estes acordos são também essenciais para o sucesso da Estratégia de Lisboa estabelecida em Março de 2000 (durante a presidência portuguesa da EU de Janeiro--Junho 2000) e cujo objectivo geral era: "tornar a União Europeia, até 2010, na economia mais competitiva do mundo com uma dinâmica económica com base no conhecimento, capaz de elevado crescimento económico e pleno emprego com mais e melhores empregos e elevada coesão social".
Para o sucesso desta estratégia, e sabendo-se desde já que o objectivo não irá ser atingido, e que será sujeita a uma revisão no conselho de ministros em Março de 2005, não basta o assumir da estratégia pelos governos nacionais, mas sim a contribuição, que é fundamental, dos actores autónomos não ligados ao Estado, os quais são: os sectores económicos, os parceiros sociais (empresários e sindicatos) e muito importante a contribuição e o envolvimento da sociedade civil através da sua participação no debate das grandes causas nacionais e europeias.
Em resultado de um relatório elaborado, em 2002, por um ’Grupo de Alto Nível’ sobre as Relações e Mutações Industriais na Europa, foi proposta uma base de critério para o estabelecimento da QUALIDADE DAS RELAÇÕES INDUSTRIAIS, que passo a transcrever:
- a contribuição conseguida para a coesão social, competitividade e crescimento económico socialmente sustentável.
- a extensão na qual o pleno emprego é um objectivo crucial assegurando ao mesmo tempo, termos e condições justas e decentes de emprego para todos os trabalhadores
- a criação do emprego de qualidade através do impulso da empregabilidade e modernização do enquadramento regulatório em linha com as mudanças na organização do trabalho
- a promoção do envelhecimento activo com o objectivo de refinar a capacidade e o incentivo para que os trabalhadores mais idosos permaneçam activos na força de trabalho;
- facilitar um melhor acesso a todos os trabalhadores, incluindo os com contratos temporários, à formação ao longo da vida através da sua participação nos cursos de formação e incluindo também os trabalhadores mais idosos.
- contribuir para a prevenção de carência de competências e promovendo a mobilidade dos trabalhadores;
- prevenção efectiva e medidas activas para promover a integração no mercado de trabalho de grupos de indivíduos em risco ou desfavorecidos, em ordem a evitar a marginalização e a exclusão social;
- medidas apropriadas para integrar no mercado de trabalho, os trabalhadores com deficiência, minorias étnicas e imigrantes;
- melhor aplicação da legislação no local de trabalho dos níveis de saúde e segurança no trabalho e a promoção de melhores condições para evitar acidentes e doenças principalmente nos sectores de risco.
- igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres
- os parceiros sociais representados ao mais alto nível, tanto no que respeita às organizações empresariais como de sindicatos
- uma cobertura alargada da contratação colectiva , incluindo formas de trabalho atípico.
- melhorar as maneiras de evitar as disputas de trabalho, através da mediação, conciliação e arbitragem tanto nos casos colectivos como individuais.
- melhorar o nível de participação dos trabalhadores no processo de tomada de decisão e por esta via melhorar a produtividade da força de trabalho.
As empresas e os trabalhadores portugueses têm de entender o mais breve possível que o sucesso de ambos depende da sua capacidade de diálogo e do atingir de consensos que beneficiem ambos. Não esquecer que numa negociação o resultado final deve ser sempre: QUE GANHEM AMBOS e nunca o de perder um e ganhar outro, porque se isto acontecer só existe uma razão: a de os negociadores serem incompetentes.
* Economista. Representante da CNIS no Comité Económico e Social Europeu
Data de introdução: 2005-03-24