O Lar da Felicidade, sedeado na freguesia de Meirinhas, concelho de Pombal, saltou para as bocas do mundo por ser a primeira IPSS a inaugurar um complexo de habitação colaborativa financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Com um investimento total superior a 800 mil euros, financiado pelo PRR e capitais próprios, a nova resposta do Lar da Felicidade disponibiliza 17 camas, através de um T0 (uma pessoa), seis T1 (duas pessoas) e um T2 (quatro pessoas).
“A vantagem desta habitação colaborativa é mesmo a autonomia e a independência que as pessoas vão poder ter e não estarem confinadas a horários e às regras rígidas das instituições residenciais”, refere a diretora-técnica da instituição, Cristina Ribeiro.
Inauguradas no passado dia 21 de junho, as habitações estão prontas a receber os primeiros moradores, estando ainda a instituição a fazer a seleção dos utentes.
O Solidariedade dará a conhecer com mais pormenor esta nova resposta do Lar da Felicidade, na próxima edição, num espaço a dedicar à Habitação Colaborativa.
Pensado e criado em 1992, o Lar da Felicidade – Associação de Solidariedade Social, foi só em 1999 que a instituição entrou em funcionamento.
“O primeiro presidente, o senhor Américo Ferreira, era também presidente da Junta de Freguesia de Meirinhas e considerava que a freguesia precisava de uma resposta de apoio aos idosos. A ideia inicial já era de criar um lar residencial, mas, na altura, o projeto não foi aprovado, porque não havia viabilidade para. Não havia interessados inscritos, a ideia não estava a ser muito bem aceite a nível local e, então, avançou-se com um projeto de Centro de Dia e de Serviço de Apoio domiciliário (SAD)”, começa por contar Cristina Ribeiro, prosseguindo: “A Junta tentou sensibilizar proprietários para disponibilizarem terrenos onde se pudesse construir um equipamento, mas não foi fácil, por isso, é que a instituição só entrou em funcionamento em 1999, com 20 utentes em Centro de Dia e 14 em SAD, que tinha já uma capacidade de 42”.
Conseguidos os terrenos doados pelas Irmãs Felicidade – daí o nome da instituição – e construído o edifício-sede, a instituição volta à carga com a intenção de construir uma resposta residencial.
“O projeto da ERPI começou a ser preparado em 2005, pelo que este lar está sujeito à legislação de 2005, que obrigava os quartos a terem quarto-de-banho privativo. Mantivemos a arquitetura, apesar de, quando concluímos a construção em 2021, a legislação já ser outra. No entanto, a privacidade da pessoa e a mais-valia para a pessoa não tem comparação, a legislação de 2005 é muito melhor nesse aspeto”, sublinha a diretora-técnica.
“Este lar foi terminado em pleno Covid, porque a construção esteve parada durante muito tempo, por falta de financiamento”, refere José Carlos Ferreira, presidente da instituição, acrescentando: “O arranque deu-se com financiamento privado, da instituição e de donativos. Fez-se, em 2010, o tosco, o esqueleto do edifício e, depois, a obra esteve cerca de 10/12 anos parada a construção”.
Para além dos constrangimentos financeiros e de alguns problemas burocráticos na Câmara Municipal de Pombal, o Lar da Felicidade não tinha para onde crescer.
“O terreno da instituição cingia-se ao ocupado pelo edifício-sede e não tínhamos mais terreno, tanto que o piso de baixo era só uma garagem e o resto estava debaixo de terra”, conta Cristina Ribeiro, relatando o que se seguiu: “Então, tentámos negociar com os proprietários dos terrenos atrás da instituição, uns aceitaram e outros não, e o processo arrastou-se nisto. Passados uns anos, as compras avançaram e conseguimos crescer. A parte de baixo fez-se na mesma a garagem e a outra parte que estava debaixo de terra tem, agora, gabinetes técnicos, sala de convívio, refeitório, copa e outras valências, e, assim, o piso de cima só ficou com quartos, com vistas para o amplo jardim da instituição”.
O ‘timing’ do retomar ada obra pode não parecer o mais óbvio, mas foi um aproveitar de oportunidades por parte da instituição.
“Aproveitámos a altura da Covid para avançar, porque abriu o PARES 3.0 e, como já tínhamos um investimento de mais de 300 mil euros na estrutura, avançámos com a candidatura para recuperar o investido e terminarmos a obra com a fase de acabamentos”, relata Daniel Mota, tesoureiro da instituição, que conclui: “Conseguimos o financiamento, a obra foi concluída em dezembro de 2021, inaugurada em janeiro de 2022 e entrou em funcionamento a 1 de fevereiro”.
E como a instituição só fechou portas nos confinamentos obrigatórios durante a pandemia de Covid-19, a instituição aproveitou para requalificar o Centro de Dia interiormente, através de uma candidatura ao FEDER.
“Como não podíamos ter aqui os idosos, aproveitámos a ocasião e o financiamento para melhorar as condições, enquanto as colegas do Centro de Dia foram afetadas ao SAD”, conta Cristina Ribeiro.
Atualmente, o Lar da Felicidade acolhe 21 utentes em, 20 em Centro de Dia e 25 em SAD, mas tem também uma resposta para a infância, a Creche Lua Nova, onde cuida de 82 petizes.
“A creche era uma creche privada, denominada Creche Lua Nova, fundada em 2003. Até julho de 2009 funcionou como uma creche privada e era propriedade de um grupo de empresário. No entanto, a resposta tinha vários problemas, porque nessa altura não havia crianças, as mensalidades aumentavam e muitos dos pais não tinham possibilidades. Então, eles queriam ter acordo de cooperação com a Segurança Social como privados, o que foi recusado”, começa por recordar Cristina Ribeiro, prosseguindo: “E foi-lhes sugerido doar ativos e passivos à IPSS que já existia na freguesia e, assim, o fizeram e deixaram de ter a responsabilidade do empréstimo bancário, que era o que os estava a sufocar. Em Assembleia Geral foi aprovada, apesar de algumas questões levantadas, porque a instituição teve de assumir a dívida ao banco de mais de 550 mil euros. Para tal, o Lar da Felicidade teve de contrair um empréstimo bancário a 16 anos e que foi liquidado em 2024. Neste momento, a creche não deve nada”.
Quando a creche passou para a instituição, ainda esteve mais de um ano a funcionar sem acordos, em 2011 fez o primeiro acordo para 10 crianças, para uma capacidade de 33. Depois, com o PROCOOP recebeu mais cinco acordos, depois de 15 passou para 23 e só então chegou aos números antes da entrada em pleno da gratuitidade.
“Financeiramente, a instituição saiu beneficiada com a Creche Feliz, porque só tínhamos 33 acordos e eram 42 crianças. Antes, era a única resposta social que dava sempre prejuízo”, aponta Daniel Mota, ao que Cristina Ribeiro acrescenta: “Não era só por questões de rendimento, até porque por aqui há pessoas com bons rendimentos, o problema é que era a pagar e os pais preferiam deixar os filhos nos avós. Agora não há avós, vai tudo para a creche porque não se paga”.
Enquanto a diretora-técnica realça que, “agora, não há valores incobráveis”, o tesoureiro sustenta: Também temos aí muita gente a viver bem, mas a descontar do ordenado mínimo, mas antes só havia dois ou três pais que pagavam a mensalidade máxima. Para o Lar da Felicidade foi benéfico, há quem possa dizer que, entretanto, o valor se tornou insuficiente, porque, se calhar, em vez de afetarem mais 10 pessoas à resposta, puseram logo 20! Por vezes, podemos pensar que temos poucas pessoas, mas financeiramente não podemos ter mais. Temos o quadro de pessoal que nos é exigido pela Segurança Social e chega”.
Se o prejuízo que a creche dava anteriormente, agora é atenuado pela Creche Feliz, ainda assim “a situação financeira está um bocadinho complicada”, porque a instituição teve de recorrer a uma conta-corrente caucionada.
“Os PRR são, pelo menos, quatro meses para os autos, depois dois meses até virem ver e mais dois meses para pagarem. Então, para não termos atrasos, abrimos uma conta-corrente caucionada e utilizamo-la sempre que precisamos. Quando recebemos, amortizamos 100% ou 60%. Não está fácil, mas a situação está controlada”, afirma o tesoureiro, especificando: “Em termos de investimento financeiros, ainda estamos a pagar o relativo à ERPI, o da Habitação Colaborativa e ainda mais. Quando decidimos avançar para a Habitação Colaborativa, sabíamos que tínhamos 26 mil euros por utente, o que dava 442 mil, que o PRR aprovou. O concurso no final foi por 600 mil e o PRR ainda nos deu uma majoração de 20%, que deu 530 mil. Ora, aqui tínhamos de investir 70 mil euros. E, depois, temos 265 mil do resto, para o qual também houve concurso, mas não houve financiamento. E este valor diz respeito ao sítio onde se puseram as casas, ao arruamento, aos esgotos, à água, à eletricidade”.
Sem contar até agora com qualquer apoio financeiro da autarquia de Pombal, os responsáveis pela instituição mostram o seu desagrado.
“A Câmara entra a falar, mas ações não há. Desde que este executivo lá está, a instituição não recebeu nada. O apoio da Câmara foi o projeto da Habitação Colaborativa, mas o da especialidade já foi feito pela instituição. Se fosse por este executivo, a obra ainda não tinha sido inaugurada. Há a promessa de dar 50% em setembro e 50% no próximo ano, mas não sabem se ganham as eleições…”, lamenta o presidente da instituição.
Acabada de inaugurar ao complexo de Habitação Colaborativa, a instituição tem outros projetos já em marcha, como melhorar o SAD, para requalificação da cozinha e da lavandaria e remodelação para criar mais dois lugares, fruto de uma candidatura ao PRR, cujo concurso público, no valor de 85 mil euros, vai ser, entretanto, lançado.
“Temos ainda uma intervenção na creche, porque temos uma sala vazia que vamos transformar em mais um berçário, pelo que ficaremos com dois berçários. Com este PRR, teremos mais 10 crianças e com um outro PRR, que já foi a concurso, vamos criar mais duas salas, para 14 e 18 crianças mais. As salas já as tínhamos, foi uma intervenção para fazer melhorias em termos de eficiência energética”, conta Cristina Ribeiro, que continua: “Vamos abrir um concurso público, no âmbito da mobilidade verde, para adquirir uam carrinha elétrica para o SAD, que já é a segunda que conseguimos desta forma. Um outro projeto é a ampliação da ERPI, através de uma sala de convívio que não é utilizada e onde pretendemos criar três quartos, ou seja, mais sete camas. Colocámos o pedido ao Centro Distrital, mas veio um parecer desfavorável, porque estão a agregar o Centro de Dia, pelo que temos que dar alguns esclarecimentos. Como isto é unido por um túnel, estão a considerar apenas um edifício”.
E porque os horizontes da instituição vão para lá do hoje, já foram pedidos orçamentos para uma ampliação da ERPI, “para elaborar uma candidatura ao PARES 4.0 que aí vem”, diz Cristina Ribeiro, completando a estrutura um L, criando mais cinco quartos e, por baixo, um ginásio para fisioterapia e mais algumas valências”.
Para além de todas estas respostas, o Lar da Felicidade ainda confeciona e serve 180 refeições/dia para o Centro Escolar de Meirinhas.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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