1 – Está na ordem do dia a questão da limitação dos mandatos dos titulares dos órgãos executivos do sistema político – primeiro ministro, presidentes dos governos regionais, presidentes das câmaras municipais.
Relativamente a todos eles, quer o PS, quer o PSD, defendem que não possam ser reeleitos após três mandatos consecutivos, apenas divergindo quando ao modo de aplicação do novo sistema aos dirigentes em funções e que já tenham mais de dois mandatos – o PS autorizando mais uma candidatura; o PSD defendendo mais duas.
A inclusão do primeiro-ministro na lista das limitações não tem alcance prático – o Prof. Cavaco Silva, considerado um caso excepcional quanto à duração do exercício de funções, tendo em conta o nosso sistema eleitoral, só esteve no poder durante10 anos; e, mesmo no estrangeiro, Filipe Gonzalez e José Maria Aznar não ultrapassaram os doze anos como chefes do governo de Espanha, e Tony Blair vai ser eleito agora para um terceiro mandato.
A esse nível, mandatos vitalícios só resistem em Cuba, na Coreia do Norte, em alguns países árabes e africanos - tudo maus exemplos.
2 – As medidas propostas têm merecido, como seria de esperar, fortíssima oposição da corporação dos autarcas e do órgão que melhor representa o bloco central dos seus interesses: a Associação Nacional dos Municípios Portugueses; e também a do presidente do Governo Regional da Madeira.
À primeira vista, os argumentos invocados contra a nova lei têm consistência: esta constitui uma diminuição da capacidade eleitoral passiva de alguns cidadãos, afectando, assim, os seus direitos, liberdades e garantias, por um lado; e, por outro, desvaloriza o carácter soberano do voto do povo, espécie de banho lustral que limparia os eleitos de qualquer defeito do curriculum ou de qualquer culpa no cartório e os dotaria de uma espécie de manto de impunidade.
Sucedeu, no entanto, com isto o que se dá com tudo – o embate dos bons princípios com a realidade concreta, tão cheia de imperfeições como tudo o que é humano, faz algumas mossas; o que leva a que a virtude dos princípios tenha que ter assim como que um tempero de bom senso.
Todos conhecemos exemplos de autarcas sucessivamente eleitos, e que continuarão a sê-lo se a lei o permitir, que muito bem faria ao desenvolvimento do concelho e à saúde da vida democrática local substituir por outros.
Terras há onde, a coberto dos mais imaculados princípios, e nos estritos limites da lei, os autarcas e a sua “entourage” tomaram conta da Câmara, dos jornais e da rádio local, dos bombeiros e do clube de futebol – de sorte que nenhuma outra voz, que não a do poder, tem meios de se fazer ouvir, e a existência de oposição, essencial em democracia, é uma ficção.
3 – Esta questão da limitação dos mandatos não é, aliás, matéria nova. Ela já vigora, desde a Constituição da República Portuguesa, de 1976, para a eleição do Presidente da República, com o máximo de 2 mandatos de cinco anos cada.
E vigora também, desde 1979, data do 1º Estatuto das IPSS, para os dirigentes das IPSS de forma associativa – que só podem ser eleitos para, no máximo, dois mandatos sucessivos, não podendo a duração de nenhum deles exceder os três anos.
O assunto não tem sido objecto, entre nós, grande debate.
Por duas razões principais: por o segmento mais numeroso e com maior visibilidade das i.p.s.s. não ter forma associativa e, portanto, os seus dirigentes não serem eleitos em assembleia geral de associados; e por, no caso das associações de solidariedade social, em muitos casos se fazer valer a excepção que o Estatuto das IPSS também estabelece de a assembleia geral poder autorizar extraordinariamente a reeleição para além do referido máximo de dois mandatos.
Entendo que é agora uma boa ocasião, já que a nível nacional se vem debatendo a natureza, os constrangimentos e os limites do mandato eleitoral, para discutirmos o que a esse respeito se passa na nossa própria casa, e na lei que nos rege.
Avanço já o meu entendimento: parece-me preferível utilizar menos a excepção que a lei actual contempla, e alargar a regra quanto à duração dos mandatos.
Mesmo os críticos mais radicais, no sistema político, da renovação dos mandatos entendem que 10 anos seria o período certo – máximo -, a estabelecer na lei, por permitir o planeamento, o lançamento e a execução de um programa de desenvolvimento.
Nas associações de solidariedade social, e com a lei actual, esse prazo máximo é de apenas 6 anos.
É francamente curto.
Até porque as nossas instituições não são, como muitas autarquias, agências de emprego e centros de redes clientelares que constituem parte das razões por que se entende dever haver limitações nos mandatos nas eleições autárquicas.
E também não precisamos de financiamentos para as campanhas eleitorais.
* Presidente da Direcção do Centro Social de Ermesinde
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