No regresso da sua viagem à Coreia do Sul, o papa Francisco fez aos jornalistas uma afirmação que terá chocado alguma gente, mesmo entre aqueles que habitualmente se afirmam seus admiradores. O Sumo Pontífice deixou claro que em determinadas situações limite, a guerra pode ser legítima. Quando um povo está condenado ao genocídio, a sociedade internacional tem o direito – João Paulo II diria o dever - de intervir, mesmo militarmente, na sua defesa. Claro que o papa ressalvou que uma iniciativa dessas deve ter sempre a caução da ONU, mas o princípio do direito à intervenção internacional voltou a ser proclamado, desta vez pela voz do papa Francisco.
O sumo pontífice fez-se eco desse direito, a propósito do que está a acontecer no Iraque e na Síria, onde um auto proclamado califa reivindica a sucessão de Maomé, e por consequência, a honra e a responsabilidade de governar, política e religiosamente o chamado “Estado do Iraque e do Levante”. Por outras palavras, quase todo o Médio Oriente.
Uma tal hipótese não preocuparia demasiado o papa, se não fora o caminho que está a ser percorrido pelos responsáveis do pretenso califado para o construírem, um caminho cujos alicerces são o ódio e a violência. Não se trata propriamente de uma novidade, face à história recente dos múltiplos movimentos radicais islâmicos que actuam no Médio Oriente ou no continente africano. A única novidade deste califado está na intensidade e nos excessos de que se têm revestido essas manifestações de ódio e violência. E ainda a aparente facilidade com que os seus combatentes vêm conquistando territórios e populações..
O ódio e a violência que caracterizam o novo califado abatem-se sobre todos aqueles que professam ideias ou vivem costumes diferentes das regras definidas pelos novos senhores: hereges, como os xiitas, infiéis como os cristãos, e todas minorias que, ao longo da História, resistiram às mais diversas purgas e perseguições, como é o caso dos yazidis. Foi aliás a situação trágica deste povo que fez despertar a consciência da comunidade internacional para os crimes que estão a ser cometidos impunemente pelos djhiadistas do chamado estado islâmico.
Este é um daqueles casos em que uma intervenção internacional parece ter plena justificação. O papa veio dar força a quantos entendem que a ONU se deve empenhar vivamente e eficazmente na protecção de todos aqueles a quem é negado o direito mínimo de viver em liberdade as suas crenças. Mas a história recente ensina que as intervenções internacionais, além da sua pouca eficácia, levantam outros problemas éticos e políticos que podem ser tão graves como aqueles que se pretendem solucionar. E é com esta certeza que o novo califado vai edificando o seu reino de terror.
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