MOVIMENTO DE DEFESA DA VIDA, LISBOA

O reconhecimento pelo trabalho com as famílias

O Movimento de Defesa da Vida (MDV) foi o grande vencedor do Prémio Manuel António da Mota 2014, que se traduz num valor monetário de 50 mil euros, mas, como diz a presidente Graça Mira Delgado, a importância da distinção vai para além do dinheiro.
“O aspeto financeiro é muito importante e este prémio tinha uma soma significativa que vai ajudar muito o MDV ao longo deste ano de 2015, mas em paralelo o reconhecimento, por uma empresa com a dimensão da Mota Engil e da dimensão da Fundação Manuel António da Mota, do trabalho que desenvolvemos como válido e importante para o País é um grande incentivo. Temos feito um grande esforço para ajudar as pessoas e sentimos que estamos a ajudar as crianças e as famílias a manterem-se unidas, a irem recuperando alguma da sua autoestima, da sua dignidade e da sua capacidade em resolver os conflitos e as dificuldades que se lhes apresentam. E é muito importante vermos que isso é reconhecido e com uma dimensão como a que tem este prémio”.
Por outro lado, os 50 mil euros que premeiam o trabalho feito pela instituição através do Projeto Família, desde 1996, vão dar uma estabilidade maior à vida da instituição.
“Este prémio vem dar estabilidade ao MDV para o ano de 2015, que é muito importante para a nossa atividade”, sustenta a presidente, que traça o cenário financeiro da instituição: “O nosso orçamento não é muito grande e é suportado em parte por um acordo atípico que temos com a Segurança Social, apenas aqui em Lisboa. Isto é muito importante, porque foi a primeira vez que conseguimos ter um financiamento em continuidade, o que nos dá estabilidade, pois sabemos que no ano seguinte conseguimos continuar a desenvolver o trabalho que fazemos. Esta era uma certeza que antes não tínhamos. É evidente que temos feito um esforço grande para não funcionar só em Lisboa, por isso estamos a funcionar no Porto, em Setúbal e em Évora, o que tem resultado devido a candidaturas que temos feito a financiamentos do POPH, da Fundação Calouste Gulbenkian e ainda da angariação de fundos junto de empresas que nos permitem completar o orçamento anual. Ora, este ano foi difícil e estávamos com muito receio de não conseguir as verbas todas… E, antes deste prémio, não antevíamos onde poderíamos ir buscar a verba que nos faltava”.
A distinção do MDV surge por via do Projeto Família em que a instituição sedeada em Lisboa faz o acompanhamento de famílias com crianças e jovens em risco, em que o trabalho é desenvolvido na casa da própria família, envolvendo todos os membros da mesma.
“A criança em risco é o objeto do Projeto Família, que é para intervir com crianças em risco no seio da família. E esta é desde logo uma das características realmente inovadoras e muito próprias do projeto. Como já se faz de algum modo noutras instituições, tudo se passa na casa da família, porque é necessário, em primeiro lugar, trabalhar com a família toda e, depois, conhecer todos os elementos de forma igual”, explica Graça Mira Delgado, indicando o objetivo a alcançar: “Mudar as condições em que a criança vive, para que esta possa permanecer em casa com os seus pais em segurança”.
A presidente do MDV, que foi uma das técnicas que trouxe o modelo dos Estados Unidos, avança que “o projeto surge não para substituir qualquer outra fase de intervenção, mas num momento limite em que a família entra em crise, que é um momento crucial para a intervenção, e as crianças estão na iminência de serem retiradas ou já o foram e põe-se a hipótese de voltarem”.
O Projeto Família surge como a derradeira possibilidade de muitas famílias conseguirem manter-se unidas. No momento em que a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), Tribunais, equipas da Segurança Social ou qualquer IPSS propõe à família essa derradeira possibilidade de ajuda, a família aceitando, é-lhe, então, atribuído um técnico. Este passa com a família meio tempo por semana, sem horário de trabalho e disponível 24 horas por dia, sete dias por semana.
“Claro que não vai viver para casa da família e vai ter os seus dias de descanso, simplesmente não tem horário fixo, porque os problemas nas famílias não surgem apenas entre as 9h00 e as 17h00”, sublinha Graça Mira Delgado, explicando o funcionamento do programa: “O técnico vai gerir com a família o tempo e os momentos da sua intervenção, visita a visita. Não há visitas-surpresa porque as visitas-surpresa põe a família na defensiva. Assim, o técnico torna-se um aliado da família, que tem o contacto telefónico daquele caso necessite de falar com ele. Nas visitas não se diz à família o que tem que fazer, mas pede-se-lhe que indique aquilo de que precisa, o que altera completamente as relações do técnico com aquela família”.
«Diga-nos o que precisa e o que é que gostava de mudar» é uma espécie de lema do projeto, que passa por dar voz à família.
“Quando recebemos uma sinalização, por exemplo, de uma CPCJ, dizem-nos que a família tem que fazer uma série de coisas e, ao princípio, o que a família diz que precisa parece não ter nada que ver com aquilo. O projeto dá-lhe abertura para querer mudar e isto é que é outro segredo, a motivação que é dada pela proximidade do técnico. Proximidade não só física, mas de anseios, de desejos, de capacidade de verbalizar, de se sentir à vontade para sentir as suas dificuldades e isto é fundamental”, destaca a dirigente, lembrando: “O nosso papel não é avaliar, mas sim ajudar. Enquanto com as outras entidades as famílias sentem que estão a ser avaliadas, connosco sentem que estamos a ajudar”.
O Projeto Família é posto em prática de uma forma intensiva durante seis semanas, ou seja, o técnico passa 15 a 20 horas por semana com cada família. As duas primeiras semanas são para realizar “um diagnóstico efetivo sobre cada família” e as três seguintes para “trabalhar as competências a qualquer nível”.
“Se for preciso o técnico arregaça as mangas. Há uma casa para arrumar, não sabem como fazê-lo, o técnico ajuda e faz. Não faz pela família, mas ajuda. Isto estende-se ao relacionamento com as crianças, ao acompanhamento a serviços públicos, etc… No fundo, tudo isto é trabalhar competências e estas são fundamentais para uma criança ter segurança na sua família”, defende Graça Mira Delgado.
Na última semana é preparada a saída do técnico: “É uma semana difícil para a família, mas também para o técnico. Os dois têm que se preparar e são apontados objetivos. Há uma avaliação ao longo do tempo e uma avaliação final em que a família diz que objetivos tinha no início da intervenção, o que conseguiu atingir e o que não conseguiu. A família conseguir fazer isto é aprender a fazê-lo para o resto da vida”.
Depois, ao longo de um ano há acompanhamentos pré-datados, tipo aos dois meses, aos quatro, etc., podendo a família pedir ajuda entretanto caso necessite.
“Não se pode manter esta ligação tão estreita durante muito tempo senão criava-se uma dependência que não tinha interesse nenhum”, alerta a dirigente, que considera a avaliação a peça-chave de todo o projeto: “Ao longo de todo o tempo há uma supervisão a todo o trabalho dos técnicos, que discutem em conjunto os respetivos casos. Por vezes os técnicos não conseguem encontrar as soluções para os seus casos, mas a ajuda surge da partilha com os outros técnicos”.
Atualmente, o Movimento de Defesa da Vida concretiza o Projeto Família com cinco técnicos em Lisboa, dois técnicos e um supervisor em Évora e igual número no Porto, sendo que em Setúbal está temporariamente suspenso. O MDV aguarda a celebração de um Acordo de Cooperação para o CAFAP (Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental) para Setúbal e para o Porto, que a Segurança Social diz “estar iminente, mas só lá para meados do ano”.
No ano de 2014, o MDV acompanhou, até outubro, 400 crianças e 180 famílias. Por ano cada técnico acompanha 16 famílias, pois apenas pode acompanhar duas famílias de cada vez.
Por outro lado, o MDV tenta criar sinergias, tendo como propósito ajudar as famílias, o que nem sempre é fácil quando há um trabalho de diversas entidades sem conhecimento recíproco.
“Procuramos trabalhar em parceria com todos quer sejam sinalizadores ou não. Temos casos de famílias que estão a ser acompanhadas por cinco ou seis entidades que nunca falaram entre si”, lamenta a dirigente, sublinhando: “Reunir essas entidades é também um trabalho que fazemos. Depois, entre 75% e 82% dos casos em que interviemos as crianças puderam permanecer no seio da família, o que é muito bom”.
Para a presidente do Movimento de Defesa da Vida, “ver o reconhecimento enorme que as famílias têm e a felicidade em que ficam” é a grande recompensa da instituição, cuja grande dificuldade é não poder fazer mais e chegar a mais famílias.
Fundado em 1977, por quatro movimentos católicos – Médicos Católicos, Enfermeiros Católicos, Ação Católica Rural e Movimento de Entreajuda e Documentação Conjugal –, o MDV “nasce para salvaguardar a vida e os valores da vida”, numa altura em que se começava a falar em despenalização do aborto, o que aconteceria, pela primeira vez, fruto de uma votação na Assembleia da República, em 1984.
“Então, o padre Victor Feytor Pinto, que estava na génese do Movimento, desafiou os seus membros dizendo que não se ia lá com abaixo-assinados, nem com manifestações. Se queríamos defender e promover a vida tinha que ser através da formação. Houve um primeiro curso de formação de formadores em Educação Sexual e Planeamento Familiar e muitos outros no seguimento disto. Não houve qualquer alteração em relação à missão e objetivos iniciais, mas uma nova postura. Achámos que não era a nossa missão a intervenção política direta, mas o trabalho com as pessoas. Então, organizámo-nos em três departamentos: Formação, de técnicos e professores; Ação Direta, ou seja, trabalho direto com as pessoas, fossem pais, jovens ou crianças; e Publicações, que é o mais difícil, pois temos pouco tempo para escrever, embora já tenhamos muito para dizer”, conta a presidente.
Passados 38 anos da fundação do Movimento de Defesa da Vida, “aquele que foi o seu móbil mantém-se, muito embora sejam muitas as dificuldades de implementação”, lamenta Graça Mira Delgado, lembrando: “A Educação Sexual junto de crianças e jovens é muito rara por falta de financiamento e o Planeamento Familiar vamos fazendo aqui na instituição”.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2015-01-21



















editorial

O COMPROMISSO DE COOPERAÇÃO: SAÚDE

De acordo com o previsto no Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, o Ministério da Saúde “garante que os profissionais de saúde dos agrupamentos de centros de saúde asseguram a...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Imigração e desenvolvimento
As migrações não são um fenómeno novo na história global, assim como na do nosso país, desde os seus primórdios. Nem sequer se trata de uma realidade...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Portugal está sem Estratégia para a Integração da Comunidade Cigana
No mês de junho Portugal foi visitado por uma delegação da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância do Conselho da Europa, que se debruçou, sobre a...