A primeira ideia que se tem ao entrar nas instalações da Fundação Beatriz Santos, em Lordemão, à entrada de Coimbra, é que se está perante um hotel, no mínimo de quatro estrelas, e não de um lar de idosos. Isto acontece não apenas pelo requinte do edifício, mas também em pormenores como as obras de arte espalhadas pelo espaço, a luminosidade do mesmo, o colorido das paredes, a ausência de odores, os equipamentos de suporte à estadia dos utentes ou o serviço prestado.
“Pela grande qualidade das nossas obras temos feito perceber às pessoas que todas as pessoas têm lugar na Fundação Beatriz Santos”, começa por explicar Paulo Santos, presidente da instituição, que acrescenta: “Não é a carteira delas, mas são as pessoas e, principalmente, as que procuram a dignidade humana. As nossas obras são todas sociais/solidárias. É verdade que tem um custo, mas os que não podem pagar também têm solução”.
Nesse prisma, o presidente da Fundação dá o exemplo da Cantina Social que tem protocolizadas 45 refeições/dia, mas diariamente são servidas 100, “porque há gente que não pode pagar”, refere, sublinhando: “Essa é a nossa obrigação e, fruto da nossa atividade, amealhamos uns tostões e propiciamos resposta a quem mais precisa”.
Proprietário do Instituto Educativo de Lordemão, Paulo Santos apercebeu-se da necessidade sentida na comunidade em ter uma creche, uma vez que o estabelecimento de ensino, com contrato de associação com o Ministério da Educação, apenas dava resposta em pré-escolar, ensino primário e 2º e 3º ciclos.
“Na altura não estava nada sensível para essa questão da creche e questionei-me se seria uma creche lucrativa ou uma creche social. Só nessa altura percebi o que era uma IPSS e foi quando me deu o clique e pensei que poderia era fazer uma outra obra”, começa por recordar, explicando como decidiu avançar para a criação de uma IPSS: “É quando nasce a Fundação Beatriz Santos, uma obra que, para além de ser uma IPSS, tem de certa forma uma gestão muito mais responsabilizada para quem promove, mas também temos a capacidade de controlar o que é o seu desenvolvimento e crescimento, ao contrário das associações onde toda a gente manda. Aqui só manda quem sabe ou quem pode! A partir da creche é que surge a Fundação Beatriz Santos, em 1999”.
O alargamento da resposta social da Fundação à terceira idade acontece aquando do falecimento do pai de Paulo Santos: “Foi nessa altura que percebi o que era o drama de um lar, porque não havia lares e os que havia tinham paredes sem alma, um tratamento pouco humanizado e pouco medicalizado, o que me deixava muito chocado. É quando nasce o Domus Vitae, que era para ser um lar e depois se transformou numa Unidade de Cuidados Continuados (UCC), pois percebi que era aquilo que queria, isto é, medicalizar o trabalho social. Por isso, agarrei os Cuidados Continuados, com 42 camas, e assim entrámos na área da Saúde”.
Paulo Santos confessa que a experiência da UCC fez a organização perceber ainda melhor como deve ser uma Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), que “deve ser um espaço de convívio e de relação, mas também de prevenção às situações, onde deve existir muita enfermagem, medicina e muita terapia, como a fisio, a osteo, a homo, etc.”, no fundo, tudo aquilo que “vise a estimulação cognitiva e motora para promover o envelhecimento ativo das pessoas”.
É então que, integrado na mesma área onde estão sedeados o Instituto, a creche e o Domus Vitae, é edificado o Domus Aeminium, uma ERPI com 40 quartos e capacidade para 80 utentes, inaugurado há cerca de dois meses e que já acolhe 30 utentes.
O equipamento, que integra ainda uma clínica de fisioterapia com piscina de recuperação e bem-estar, ocupa uma área de 6.500 metros quadrados e teve um custo de quase cinco milhões de euros, em que 1,5 milhões foi financiado pelo POPH e o restante resultou de autofinanciamento, com um empréstimo à banca e ainda verbas da Fundação. Para além disso, a instituição acedeu ao Fundo de Reestruturação do Setor Social (FRSS), do qual recebeu 500 mil euros, tendo recebido ainda igual verba por via da linha de crédito de apoio à tesouraria do Montepio Geral.
“Saúdo a CNIS no apoio às IPSS, porque criou condições para que esta casa pudesse, através do FRSS, bem como da linha de crédito de apoio à tesouraria, fazer esta obra. Sem isso não poderíamos ter avançado e, assim, mantemos uma estabilidade de funcionamento ao nível da tesouraria, projetámos o negócio e estamos, neste momento, a fazer uma exploração muito tranquila”, congratula-se o líder da Fundação.
Importante para Paulo Santos tem sido a forma como aborda os projetos, assentando a prática em avaliações muito cuidadas e projetos muito sólidos. Investir forte no projeto para retirar ganhos na exploração é a forma como tem construído e desenvolvido a instituição, sendo que uma das grandes preocupações na edificação do Domus Aeminium se centrou na eficiência energética.
“Fizemos isto sempre com a preocupação de termos um custo de exploração baixo para termos também uma mensalidade baixa para os utentes e desta forma o equipamento estar disponível para toda a gente”, sublinha, referindo ter havido “uma grande preocupação com a sustentabilidade e inovação” com grande enfoque nas questões ambientais e energéticas.
No sentido de alcançar baixos custos de exploração, a Fundação Beatriz Santos optou por um sistema de climatização do edifício e produção de água quente com base na geotermia, regeneração de energia, produção e gestão de energia elétrica, circuito CCTV e iluminação LED, tudo integrado num sistema de controlo geral que recorre à domótica (tecnologia responsável pela gestão de todos os recursos habitacionais), onde tudo é controlado através de computador.
“No Domus Aeminium, que é um lar de idosos, uma clínica de saúde e um auditório, um espaço vivo e de grande qualidade, tivemos, desde a primeira hora, grandes preocupações de sustentabilidade. Sendo uma obra de grande qualidade é uma obra solidária e social, porque permite que o utente beneficie do Acordo de Cooperação com a Segurança Social. E isso acontece porque o custo de exploração, com o gás, a água, o aquecimento ou a iluminação são reduzidos”, explica, continuando: “Quando «fabricámos» este edifício, reunimos um conjunto de especialistas que criaram condições para que tivéssemos a temperatura de 18 graus em tempos normais através da geotermia. Verão ou inverno conseguimos sempre ter 18 graus que vêm debaixo da terra. A temperatura de conforto é de 22 graus, acima disso é de mais, abaixo disso pode ser frio, pelo que o consumo de gás ou de energia é apenas para quatro graus, porque o resto vem da geotermia. Antecipadamente, na construção, já pagámos os 18 graus que, em termos de exploração, no final de dois anos estão pagos. Depois toda a iluminação é feita através de LED, que não só duram mais, como ainda consomem menos para produzir mais energia. Mas fomos mais longe, porque utilizámos em todo o processo um balastro próprio – transformador de energia – que permite fazer a leitura da quantidade de luz natural que entra pelas vidraças e que faz a compensação. Por exemplo, definimos que uma sala tem que ter 400 lux, se de luz natural entram 200 lux, então essas lâmpadas só acendem até 200 lux e, assim, só gasta metade do que devia gastar. E isto tem um impacto brutal no consumo. Na iluminação, neste momento, há uma poupança de 40%, o que significa que, em termos de exploração, em dois anos, o investimento nos LED tem um custo zero”.
Para Paulo Santos fornecer um serviço premium a baixo custo é o objetivo primordial da Fundação que dirige, sendo que subjacente a isto está sempre a promoção da dignidade humana. Nesse sentido, o próximo grande projeto da instituição, que o responsável pretende submeter ao Portugal 2020, é a Escola de Artes, Empreendedorismo, Inovação e Inclusão Social, que tem na base a criação do Centro de Reabilitação Profissional de Coimbra, um lugar para “todos os cidadãos independentemente da sua patologia, normalidade ou disfuncionalidade”.
Após perceber que “é preciso dar resposta a uma necessidade que é nacional e que é a da deficiência, congénita e adquirida”, e aproveitando o facto de a Fundação ser atualmente a gestora da ARCA – Escola de Artes de Coimbra, que se situa em frente ao complexo onde a instituição está sedeada, Paulo Santos pretende construir uma resposta que apoie “aquele que nasce com um problema e que tem necessidade que os profissionais e as organizações o possam apoiar para que o seu sofrimento ou a sua insuficiência possam ser transformadas em proatividade naquilo que é a capacidade de realizar com normalidade tarefas, quiçá ser uma pessoa de grande autonomia e grande valor, dependendo naturalmente da patologia”.
O projeto é ambicioso, mas não demove o seu ideólogo, que o explica de forma simples: “Como temos uma escola profissional e uma outra através da ARCA, o objetivo é fazer o desenvolvimento desta área de resposta, concretamente, a reabilitação ortopédica através da formação de pessoas para a construção de próteses ortopédicas. E este é o curso que vai iniciar-se no próximo ano letivo na ARCA, que é uma escola profissional. Então, teremos o Centro de Reabilitação Profissional de Coimbra (CPRC), com uma unidade de reabilitação, mas também uma unidade de formação profissional. Por outro lado, faremos uma aposta constante na investigação, isto é, na organização de seminários, congressos e publicações, onde entra a nossa parte cultural. E aqui falamos também no desenvolvimento de talentos. Depois, é necessário um CAO para as atividades de quem frequenta o CRPC, em que teremos ocupação para a inclusão, com pintura, cerâmica, cestaria, jardinagem, etc. Por outro lado, teremos também o apoio à vida independente, com apoio à família, apoio ao domicílio e apoio à residência, para os mais dependentes e que estejam connosco. Dentro deste apoio ao domicílio e à família teremos ainda a criação do empreendedorismo social e sócio-cultural, que é o desenvolvimento de uma incubadora de inovação social. Esta incubadora terá a capacidade de, através de um take-off com o Montepio, podermos desenvolver iniciativas empreendedoras e inovadoras cujo objetivo é criar emprego”.
Para além deste projeto estruturante na área da deficiência e reabilitação, a Fundação pretende ainda implementar o Domus Conimbriga, “um projeto atípico, que é no fundo um espaço residencial, mas que visa recentrar no centro da cidade de Coimbra, o chamado apoio diferenciado”, explica Paulo Santos, acrescentando: “Será uma espécie de Centro de Convívio, Centro de Dia, Centro de Bem-estar, Centro de Atividades, que polariza um conjunto de atividades que visam promover a autonomia e a estimulação cognitiva e motora, mas também a inter-relação entre os pares, promovendo a dignidade humana”.
Para começar a ser uma realidade, o Domus Conimbriga espera apenas que se efetue a assinatura da escritura do terreno que foi atribuído à Fundação num “concurso camarário em que foi opositora juntamente com outras instituições e que se diferenciou pelo projeto de funcionamento e grande qualidade”.
Apostando numa exploração com baixos custos, a estratégia da Fundação passa ainda por “criar algo que crie receitas-extra para benefício de todos os utentes”, para além garantir que “todos os setores tem que ser sustentáveis para que as iniciativas sejam cada vez melhores”, argumenta Paulo Santos, acrescentando: “Criámos aqui uma máquina que, fruto das grandes atividades da educação, da saúde, da ação social, do desporto e da cultura, permitiu criar uma transversalidade de respostas que visam apoiar a infância, a idade de crescimento e a idade adulta. E estamos a projetar isto para nos próximos 25 anos termos capacidade para ter resposta para 450 pessoas. O nosso sonho é termos aqui um espaço maior, porque, em Coimbra, a cobertura em termos de lares é muito baixa, ou seja, não há lares”.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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