Outubro começa com o dia internacional das pessoas idosas, instituído pela ONU em 1990, através da resolução 45/106. O dia 1 de outubro passou a partir dessa data a simbolizar a nível mundial o reconhecimento de que os idosos são um recurso para as sociedades, bem como da necessidade de haver “uma base comum e um quadro de referência para a proteção e promoção dos direitos dos idosos, incluindo o contributo que podem e devem dar à sociedade” (cf. introdução da resolução).
Até há poucas décadas, a proporção da população idosa era relativamente reduzida. Nas últimas décadas o seu peso tem crescido significativamente. Entre 1980 e 2021 estima-se que a população idosa mundial tenha triplicado, passando de 210 para 761 milhões de pessoas. Nos próximos trinta anos a percentagem da população idosa mundial deve crescer de 10% para 17%.
O dia da pessoa idosa é necessário porque as nossas sociedades demonstraram não estar preparadas para lidar com o fenómeno da extensão da vida e da generalização do envelhecimento. As sociedades industriais desenvolveram-se em torno da ideia de três fases na vida, uma primeira dedicada à socialização e à educação, uma segunda, longa, ao trabalho na produção e à reprodução, e uma final, curta, a “terceira idade” de dependência.
Em tempos passados poucas pessoas chegavam a ser velhas ou muito velhas e quando o eram estavam muito debilitadas. Acresce que se enraizou um entendimento da velhice que era metaforizado numa ideia de regresso à infância, de perda de autonomia e de direitos, de lugar na sociedade e de respeito.
Em 1969, o médico Robert Butler escreveu um artigo em que inventava a palavra idadismo para descrever uma nova forma de intolerância, equiparável a outras formas de discriminação, segundo a qual as pessoas de meia idade tinham preconceitos contra os mais velhos, cuja estereotipação os levava a ver a situação dos mais velhos com desconforto e a associar a doença, incapacidade, falta de poder, inutilidade e morte[1].
A associação de fatores negativos com o envelhecimento está presente de modos diversos na nossa sociedade, criando um lugar social de velho que não é definido pelas determinantes biológicas do envelhecimento, mas pelo modo como os indivíduos e as estruturas sociais lidam com a velhice
O relatório da OMS sobre o idadismo[2] associa-o aos estereótipos, preconceitos e discriminação das pessoas com base na sua idade e identifica-o como prática que pode ser institucional, interpessoal ou contra si próprio.
Vencer o idadismo implica mudar a metáfora predominante sobre o envelhecimento e deixar de o ver como um processo de perda e de “regresso”, para o ver como uma etapa do contínuo progresso na realização pessoal. Por isso necessitamos de afirmar uma metáfora alternativa do envelhecimento como uma segunda vida adulta e ativa.
A realização dessa nova metáfora implica medidas de vários tipos, que o relatório da ONU sobre o idadismo sintetizou, e que implicam medidas legislativas e políticas que garantam que se torna real a proibição da discriminação que está contida no ordenamento jurídico. Implicam também medidas educativas que ajudem a formar empatia com as pessoas de diversas idades. Nestas dimensões trata-se de aplicar à discriminação pela idade os mesmos princípios que aplicamos a outros fatores de discriminação social.
A redução do idadismo tem ainda uma dimensão específica de promoção do contacto intergeracional. Uma parte substancial dos contactos intergeracionais ocorrem no seio das famílias. É crescente a preocupação com a intergeracionalidade por parte de instituições que trabalham com pessoas idosas.
Importa promover uma política de desenvolvimento comunitário atenta à intergeracionaidade. As diferentes gerações convivem pouco no espaço público. A criação de estratégias participadas para o desenvolvimento dessa intergeracionalidade é um campo de trabalho bastante frutífero para quem se preocupe com coesão social e intervenha ao nível comunitário.
Este é um dos desafios do dia da pessoa idosa com que começa o mês de outubro. Este ano o tema escolhido para a celebração foi o de “cumprir as promessas da Declaração Universal dos Direitos Humanos para os idosos: entre gerações”.
A ONU exorta-nos a agir para aumentar o conhecimento da DUDH, a partilhar e aprender dos modelos intergeracionais de proteção dos direitos humanos e a analisar as nossas práticas de modo a integrar a abordagem do ciclo de vida na nossa ação, a reforçar a solidariedade entre gerações e as parcerias intergeracionais.
Para isso temos que imaginar novas formas de intergeracionalidade. Um excelente desafio para levar a sério no ano que começa a 1 de outubro.
[1] Cf. Butler, R. N.(1969) Age-Ism: Another Form of Bigotry. The Gerontologist, Volume 9, Issue 4_Part_1, pp. 243–246,
[2] Disponível em https://iris.paho.org/handle/10665.2/55872
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