Nos nossos dias, a Festa do Natal tornou-se numa ocasião especial para troca de cumprimentos e de presentes. Para alguns esse é mesmo o aspecto mais marcante da quadra natalícia e que a mentalidade consumística da nossa sociedade, por razões comerciais e económicas, fortemente incentiva, recorrendo às mais sofisticadas técnicas publicitárias, a que dificilmente se resiste.
E a troca de cumprimentos e de prendas, embora se restrinja ao grupo dos familiares e amigos, nem por isso deixa de ser uma forma de solidariedade para com os nossos semelhantes. Porém, não passa de uma pálida imagem da autêntica solidariedade, aberta e universal, que radica no mistério da Encarnação do Verbo de Deus, dado a conhecer à humanidade com o nascimento de Jesus, em Belém.
Com efeito, é no mistério do Verbo encarnado que tem origem toda a verdadeira solidariedade humana. O Verbo de Deus assumiu um corpo, solidarizou-se com a humanidade, sujeitou-se aos condicionamentos da nossa natureza, entrou no nosso mundo para nos mostrar o que significa ser solidário e assim cumprir a vontade do Pai, como nos ensina a Sagrada Escritura, que põe na boca de Jesus estas palavras: não quiseste sacrifício nem oferenda mas preparaste-me um corpo. Eis que venho, ó Deus, para fazer a tua vontade (Heb 10,7). A vontade de Deus é a salvação da humanidade. E não foi alcançada à custa de uma oferta qualquer. Mas pela entrega da própria vida nas mãos do Pai. Jesus pensou, trabalhou, ensinou, viveu e deu a vida para desencadear na humanidade novos mecanismos solidários, capazes de destruir as barreiras e romper as fronteiras que impedem os humanos de ser solidários uns com os outros.
A verdadeira solidariedade consiste em deixar que os outros entrem no nosso recinto pessoal, acolhendo-os com simpatia e partilhando com eles o que temos e o que somos. Mais do que dar algo, a verdadeira solidariedade consiste em dar-se a si próprio, como fez Jesus, para que os outros consigam a libertação.
A verdadeira solidariedade deve levar-nos, antes de mais, a abrir bem os olhos e a concentrar a atenção no que se passa à nossa volta para conhecermos a realidade tal qual ela é. Mas além dos olhos precisamos de abrir também o coração e deixar vir à superfície os sentimentos que nos podem levar à compaixão com os nossos semelhantes mais carenciados. Só a partir daí poderemos começar a praticar gestos de solidariedade, tais como: proferir palavras de acolhimento, estender a mão ao caído, ouvir o grito silencioso do marginalizado, partilhar algo do que temos e somos, empenharmo-nos na pacificação da sociedade inquieta e angustiada e tantas outras coisas.
Quem é solidário não diz apenas que será de mim. É também capaz de dizer que será do outro. Quem é solidário não se limita a papaguear as teóricas declarações dos direitos do homem, da criança, do doente ou outras. Vai mais além. Respeita os direitos dos outros e compromete-se com eles. Defende os injustiçados e socorre os necessitados.
No Natal de Jesus encontramos a origem e a referência fundamental de todos os projectos de solidariedade. Com os olhos postos no presépio, alarguemos os horizontes das nossas ofertas de Natal e solidarizemo-nos com aqueles que mais precisam, a exemplo de Jesus, que veio dar a vida por todos.
Portalegre, 11 de Dezembro de 2005
+José, Bispo de Portalegre-Castelo Branco
Presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social
Data de introdução: 2006-01-04