JOSÉ CARLOS BATALHA, PRESIDENTE DA UDIPSS/LISBOA:

Nós não somos efectivamente parceiros e precisamos de assumir essa condição

José Carlos Batalha conta já com mais de 30 anos ao serviço da causa social. No segundo mandato à frente da UDIPSS de Lisboa a aposta centra-se agora na consolidação do trabalho iniciado anteriormente. Técnico Especialista de Acção Social Escolar do Ministério da Educação, desempenha funções no Centro Social Paroquial da Azambuja, onde reside há mais de 40 anos. Integra também o colégio directivo da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS).

SOLIDARIEDADE – Assumiu mais três anos à frente da maior União distrital das IPSS’s com quase meio milhar de instituições associadas. A cidade e o distrito escondem muitas problemáticas sociais onde é necessário intervir.
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Lisboa e o seu distrito são realidades díspares quer pela dimensão quer pelo facto de estarmos numa grande metrópole, com todos os problemas sociais inerentes às grandes cidades. Lisboa tem uma cintura à sua volta muito afectada por problemas gravíssimos do ponto de vista social. Creio que o distrito de Lisboa não tem mãos a medir em termos de respostas às inúmeras problemáticas sociais. Eu quase que elejo uma situação que considero muito preocupante: o grave problema da solidão. Fala-se em cerca de 45 mil a 50 mil idosos a viverem completamente sós. Depois existem os fenómenos da exclusão, os fenómenos daqueles que vivem à margem da sociedade, os fenómenos das imigrações, das minorias étnicas e depois todas as problemáticas que daí advêm: a violência, as toxicodependências, a criminalidade. Temos que actuar a montante, temos que ter uma atitude pró-activa.

SOLIDARIEDADE - Mas elege dois ou três vectores principais de actuação?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Eu creio que é preciso actuar numa perspectiva mais geral. Eu diria que não podemos elencar ou ordenar como factores de prioridade alguns dos fenómenos, porque todos eles se interligam. Hoje precisamos de olhar para as pessoas e de pensar em primeiro lugar na sua promoção. Falo, mais concretamente, nas questões da solidão, mas também nas questões da infância, dos jovens que actualmente vivem muito entregues a si próprios. Precisamos de olhar com muito carinho e com muita responsabilidade para estas problemáticas. Cada vez mais as pessoas apenas olham para si próprias.

SOLIDARIEDADE - Com quase meio milhar de instituições filiadas na UDIPSS/Lisboa, como é que é feita toda a interacção e prestação de serviços entre a União e as associadas?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Nós temos na nossa União distrital uma equipa muito boa de assessores em várias áreas: na legislação laboral, na fiscalidade, na contabilidade, na área dos recursos humanos. Recentemente protocolámos com uma empresa uma assessoria na área técnica, porque hoje as instituições têm que dar respostas técnicas ao nível da construção de edifícios e ao nível da segurança. Há questões que se põem no dia a dia às quais os dirigentes e as pessoas que estão à frente das instituições não têm formação técnica e nem podem dar resposta. Temos, de facto, um movimento incrível nas nossas assessorias, com as diversas áreas a funcionar a semana toda. Temos constantemente gente das instituições que, ou de uma forma presencial ou por telefone, nos fazem consultas e nos põem os seus problemas. Estamos convictos que estamos a dar uma boa resposta, mas vamos melhorá-la e alargá-la a outras áreas, como por exemplo, a área técnica, que é muito vasta. As instituições têm manifestado preocupação nesse sector, por exemplo, ao nível da construção civil, onde precisam de acompanhamento. A segurança é outra questão que nos preocupa, pois há muito pouca legislação que discipline as empresas de segurança. Mas é um facto que as instituições precisam de ter respostas seguras, que os seus equipamentos precisam de apresentar níveis de segurança e portanto é uma necessidade premente à qual vamos dar resposta.

SOLIDARIEDADE - Considera que Lisboa tem uma boa cobertura de IPSS, com estrutura para enfrentar os desafios sociais que surgem, ou existem domínios a precisar de uma maior intervenção?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Creio que temos uma rede de instituições muito boa. O que nos caracteriza a nós, enquanto povo, é o facto de sempre termos sabido dar resposta às necessidades que a comunidade apresenta, sejam elas na área da infância, da terceira idade, da toxicodependência, ou outras. É um processo dinâmico, ou seja, sempre que a necessidade surge alguém vai dar resposta. O nosso papel é acarinhar essas respostas e incentivá-las. A questão do voluntariado, por exemplo, é uma questão fundamental que é importante implementar e dinamizar. Nós temos uma rede extraordinária de voluntários, basta pensarmos que das mais de 400 instituições do distrito de Lisboa, todas elas têm 11 ou 12 pessoas nos seus órgãos sociais, todos voluntários. Creio que o voluntariado é um aspecto muito importante que precisa de ser qualificado e trabalhado, mas é um fenómeno que precisamos de integrar, acolher e de lhe dar a importância que ele merece nas respostas às diferentes problemáticas sociais.

SOLIDARIEDADE - No seu discurso de tomada de posse acentuou o facto de não aceitarem a redução da capacidade de intervenção social das instituições e deu como exemplo o caso dos ATL’s. Estava a referir-se ao Estado?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- As Câmaras Municipais, ao nível de Lisboa, funcionam quase todas de forma diferente e a grande maioria não valorizou a experiência das instituições particulares de solidariedade social que vêm, ao longo destes anos, desenvolvendo e dando respostas à comunidade. Por isso mesmo, parece-me fundamental que passem a ter em atenção a nossa experiência, a nossa mais valia, que não tem sido levada em conta. Nós estamos cá, queremos continuar a dar respostas, temos estado no terreno com êxito e não queremos ser relegados para segundo plano. Estou a falar da problemática dos ATL’s e não só. Nós não somos efectivamente parceiros e precisamos de assumir essa condição.

SOLIDARIEDADE - Aliás, uma condição que este Governo tem acentuado na relação com as IPSS...
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Exactamente. Tem acentuado, mas depois na prática sentimos constrangimentos. Sentimos, no sentido de que as instituições filiadas nos fazem eco da prática no terreno nas mais diversas localidades e nos diferentes concelhos deste distrito.

SOLIDARIEDADE – É neste sentido que fala na necessidade das IPSS sofrerem um choque cívico?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- É importante que as instituições se assumam, que os promotores sociais e que os dirigentes das mesmas se assumam enquanto actores fundamentais e principais destes caminhos da solidariedade. Isto quer dizer que nem sempre os nossos dirigentes têm esta atitude de empenhamento responsável. Por isso digo que precisamos de um choque, de um abanão de consciências, de postura, de actuação, de atitude. Temos que fazer desta actividade social uma missão e a missão é trabalharmos para o bem comum sem protagonismos.

SOLIDARIEDADE - Como tem sido o relacionamento com a CNIS? E qual o papel que espera da Confederação?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Temos tido uma relação normal, porque nós somos uma estrutura da CNIS e estamos em interligação. Eu faço parte do Conselho Directivo Nacional. Temos até agora trabalhado nalgumas questões em colaboração com a CNIS e temos uma relação boa, não fossêmos nós a maior estrutura nacional. E estaremos sempre disponíveis para esta colaboração.

SOLIDARIEDADE - E com a Segurança Social? Como classifica a relação?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- É óptima, sempre foi. Tivemos a presença de alguns elementos do centro distrital de Segurança Social na tomada de posse. Temos dinamizado a Comissão de Acompanhamento e Avaliação dos Acórdãos de Cooperação. Sempre trabalhámos e sempre fomos nós, União distrital, os principais dinamizadores e impulsionadores para que esta comissão funcione tão bem. E é pena que não funcione tão bem a nível nacional como aqui em Lisboa.

SOLIDARIEDADE - Já é o seu segundo mandato. Serão seis anos à frente dos destinos UDIPSS/Lisboa. Pretende continuar esta missão para além daqui?
JOSÉ CARLOS BATALHA
- Não, este será o último mandato. Vai ser um mandato de consolidação do trabalho que desenvolvemos durante três anos e ficaremos por aqui.

 

Data de introdução: 2006-10-07



















editorial

NOVO CICLO E SECTOR SOCIAL SOLIDÁRIO

Pode não ser perfeito, mas nunca se encontrou nem certamente se encontrará melhor sistema do que aquele que dá a todas as cidadãs e a todos os cidadãos a oportunidade de se pronunciarem sobre o que querem para o seu próprio país e...

Não há inqueritos válidos.

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Em que estamos a falhar?
Evito fazer análise política nesta coluna, que entendo ser um espaço desenhado para a discussão de políticas públicas. Mas não há como contornar o...

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Criação de trabalho digno: um grande desafio à próxima legislatura
Enquanto escrevo este texto, está a decorrer o ato eleitoral. Como é óbvio, não sei qual o partido vencedor, nem quem assumirá o governo da nação e os...