A Torre de Babel, segundo a narrativa bíblica no livro do Génesis, era uma torre construída por uma humanidade unida com o objectivo de chegar ao céu. Visto que o Homem aspirava ser como o seu Criador, Deus terá interrompido este projecto e para tal fez com que cada homem falasse uma língua diferente. Ora, muitos milénios depois, em 1887, outro homem, Ludwik Zamenhof criou uma língua exactamente com o objectivo de que viesse a tornar-se numa linguagem universal, capaz de vencer a alegada “maldição de Babel”, considerada como um castigo que condenava os homens a não se compreenderem uns aos outros.
O criador é de origem polaca, na altura sobre domínio russo e em cuja cidade natal, Bialystock coexistiam quatro grupos étnicos: polacos, russos, alemães e judeus. Muitos acreditam que foi este factor, aliado ao grande conhecimento de línguas, que levou a que Zamenhof criasse o Esperanto. Esta língua artificial não tardou em ganhar adeptos e espalhou-se por vários países. Zamenhof criara uma base a partir da qual o idioma poderia desenvolver-se, com uma gramática regida por princípios escolhidos de outras línguas, assim como palavras, sobretudo do latim e de línguas românicas.
A primeira associação de esperantistas formou-se em Nuremberga, em 1888 e um ano depois publicou-se a primeira gramática em inglês e o primeiro jornal mensal ”La Esperantisto”. Nos anos que se seguiram formaram-se muitas associações de Esperanto em vários países europeus, asiáticos e sul-americanos. Em 1905 teve lugar, na cidade francesa de Boulogne-sur-Mer, o primeiro congresso mundial da língua, tendo comparecido 700 congressistas vindos de 20 países. Não foi necessário o uso de intérpretes neste congresso.
Actualmente, e embora não existam dados muito concretos sobre este número, segundo a opinião de António Martins, vice-presidente da Associação Portuguesa de Esperanto, crê-se que o Esperanto é falado por mais de dois milhões de pessoas em cerca de 100 países, sendo que no nosso país as estimativas apontam para 160 falantes fluentes. A Associação nasceu na capital, em 1972 e actualmente conta com cerca de 400 sócios espalhados por todo o país.
Os esperantistas agrupam-se em comunidades, geralmente nas principais cidades de cada país, com destaque para a comunidade húngara, na Europa. Segundo o Anuário do Ano 2000, da Associação Universal de Esperanto, existem, actualmente, clubes em cerca de 1000 cidades de 100 países diferentes nos cinco continentes. “As associações de esperantistas, como a nossa, procuram coordenar os trabalhos de divulgação da língua, com a publicação de revistas ou jornais, onde se divulga o movimento, os congressos, os eventos culturais”, explica António Martins. Para além deste tipo de grupos, há várias associações técnicas que reúnem especialistas de áreas variadas como a astronomia, a educação, a arte, a economia, entre outras, que têm como principal objectivo desenvolver o vocabulário técnico da língua.
Segundo este dirigente associativo, por todo o mundo são cada vez mais os adeptos desta língua, mesmo a nível institucional. Segundo um artigo publicado na revista USA Today, com data de 27 de Janeiro de 2000, a Igreja Católica na Alemanha estudou a questão relativa a uma proposta de uma mudança do latim para o Esperanto como idioma de trabalho desta congregação mundial. O artigo diz ainda que a Igreja Católica há muito que tem uma “atitude positiva” quanto ao uso do Esperanto como língua comum de comunicação entre os seus membros espalhados pelo mundo.
Desde 1910 que existe uma “União Internacional do Esperanto Católico”, a Internacia Katolika Unuigo Esperantista (IKUE), e a fundação da revista que publica, a Espero Katolika, data já de 1903. Desde 1977 que a Rádio Vaticano tem emissões esperantistas. Também desde 1981, sobretudo na Europa, que se dizem missas em Esperanto. Por ocasião do 50° congresso da IKUE, em 1997, o Papa João Paulo II falou em Esperanto aos congressistas reunidos na Praça de São Pedro e esta não foi a primeira vez que fez uma intervenção neste idioma.
A um nível mais pessoal, António Martins refere a existência de vários casais de nacionalidades diferentes que usam esta língua para comunicar e apresenta o seu caso como um exemplo disso, sendo que a filha de nove anos é um dos poucos casos em Portugal que usa o Esperanto como língua materna, a par com o Português. Wilson Silva, brasileiro, residente em Portugal há já vários anos, conheceu o Esperanto em jovem na universidade e interessou-se essencialmente “pela ideia utópica de poder ser uma língua falada por todos os povos do mundo”, conta. Passa as tardes de sábado na associação em conjunto com outros colegas que falam, lêem e discutem ideias em Esperanto. “É uma língua como outra e gostamos de comunicar com ela”, diz. Este esperantista acredita que o Esperanto pode vir a tornar-se num grande auxiliar de comunicação mundial, “à semelhança do inglês na actualidade”. Já Umberto Eco, professor de Semiótica italiano e estudioso da comunicação, em entrevista a um jornal disse: ”Vejo o que se passa em França: Ainda se fala da ameaça que a língua inglesa constitui … Em breve acabarão por dar o seu apoio a uma língua de ligação apenas para impedir que um idioma nacional consiga supremacia … Encontramo-nos numa fase histórica quando é mais fácil ter a aceitação de um idioma, até mesmo se ele for artificial. Além de a artificialidade do Esperanto não ser nenhuma desvantagem. Se não tivesse sabido que se trata de um idioma artificial, não teria notado nenhuma diferença”.
Data de introdução: 2008-05-09