Chama-se ACASO, mas não é, nem nasceu do acaso! “A sociedade foi-se desenvolvendo, foram surgindo necessidades na comunidade e a instituição foi-lhes respondendo, sempre com muito sacrifício e com muito esforço financeiro, mas foi sempre dando resposta”, afirma António Pina, presidente da ACASO – Associação Cultural e de Apoio Social de Olhão, fundada no dia 18 de Janeiro de 1932.
Nasceu, portanto, há 80 anos sob o nome de Associação de Apoio à Mendicidade de Olhão, começando a sua actividade precisamente pelo que hoje seria um centro de dia.
Ao longo dos anos, a instituição foi crescendo e alargando a sua ajuda às áreas da infância, terceira idade, deficiência, saúde e Família e Comunidade.
Hoje, a ACASO é o segundo maior empregador do concelho de Olhão, com 220 funcionários, e tem as suas valências distribuídas por diversos equipamentos.
No edifício-sede, o Centro Social da Quinta do Brejo, para além dos serviços administrativos e técnicos, funcionam o Lar de idosos «Eng.º Francisco Leal», que acolhe 30 idosos, inaugurado em 2002; o Serviço de Apoio Domiciliário, que presta assistência a 40 utentes e a mais uma dezena no Apoio Domiciliário Integrado; o Lar Residencial «Luís Pacheco Figueiras», que acolhe 30 pessoas portadoras de deficiência, e ainda um CAO – Centro de Actividades Ocupacionais, frequentado por 47 utentes, duas respostas na área da deficiência inauguradas em 2001.
A instituição tem ainda outros pólos espalhados pela cidade, como o Centro Social «Dr. Ayres Mendonça», uma valência de centro de dia frequentada por 50 utentes, mas com capacidade para 120, e que esteve na génese da ACASO.
Na área da Família e Comunidade, a instituição olhanense inaugurou em 1996 o Centro Comunitário «Acampamento Azul», uma resposta social, essencialmente, vocacionada para a população de etnia cigana, na qual existe também um jardim-de-infância, com 19 crianças. Um ano antes inaugurara o Centro Comunitário Al-Hain, na parte antiga da cidade, e que consiste num refeitório e lavandaria sociais e onde agora irá também funcionar uma Cantina Social criada no âmbito das novas medidas do Governo. Nesta área, a instituição tem ainda aberta ao público uma Loja Social.
Na área da infância, a ACASO cuida de 65 crianças no Centro Infantil «Os Saltitões», distribuídas pela creche (28) e pelo pré-escolar (37). Este infantário abriu as portas em 1995.
Nesta área, a instituição tinha ainda mais uma resposta, uma creche familiar de amas, mas a inviabilidade financeira levou recentemente ao seu encerramento.
NOVO EQUIPAMENTO EM DÚVIDA
Já na área da saúde, desde 2009 que a ACASO acolhe um número variável de doentes na Unidade de Cuidados Continuados de Média Duração e Reabilitação de Olhão (UMDRO), estando neste momento em fase final de construção no Centro Social da Quinta do Brejo, uma Unidade de Cuidados Continuados de Longa Duração e Manutenção de Olhão, com capacidade para 33 doentes e que tem abertura prevista para breve. No entanto, uma nuvem paira sobre estas valências.
“Vamos ver se abrimos, porque temos que ver qual é o contrato que querem fazer connosco. Estamos pouco disponíveis para fazer acordos em que o Ministério da Saúde, no fim de cada mês, nos paga 70% e os outros
30% apenas no final do ano. Esta instituição não tem dinheiro para apoiar o Governo, somos solidários, mas não temos dinheiro para ser solidários com o Ministério da Saúde”, assevera António Pinto, que revela ainda não estar bem definido qual o futuro destas respostas sociais, explicando: “Para continuarmos com a Unidade de Média Duração e abrirmos a de Longa teremos que meter mais pessoal, o que implica mais despesa. No entanto, se fecharmos a de Média quando abrirmos a de Longa podemos transferir o pessoal e, com um pequeno acrescento, poderemos ter as duas respostas a funcionar neste edifício novo. Como com a reestruturação que estamos a levar a efeito já chegámos à triste conclusão que temos que despedir pessoal, talvez com esta última solução possamos manter esses funcionários. Do ponto de vista social, o melhor seria ter os dois equipamentos…”.
A ideia preconizada pela Direcção é justificada pelo director de serviços, José Calão: “Temos uma Unidade de Média Duração onde muitos dos doentes estão referenciados para a de Longa. Tivemos um doente que esteve quase um ano à espera de uma vaga numa Unidade de Longa Duração, porque destas não há número suficiente”.
REESTRUTURAR PARA REEQUILIBRAR
A ACASO vem há já algum tempo a reestruturar os seus serviços, criando departamentos e direcções técnicas por áreas de intervenção, o que tem ajudado ao reequilíbrio económico-financeiro da instituição. No entanto, os seus responsáveis mostram-se bastante preocupados com o momento actual da instituição, que, à semelhança de muitas outras por este País fora, sofrem bastante com a crise que Portugal vive.
“A crise veio trazer ao de cima algumas das nossas fragilidades, porque os Acordos de Cooperação mantêm os valores, mas tudo aumentou. As dificuldades crescem todos os dias à medida que a vida lá fora se torna
mais difícil… Por exemplo, a Câmara deixou de poder dar a água grátis à instituição e muitas outros bens estão bem mais caros, ora tudo isso trouxe ao de cima algumas fragilidades, porque esta instituição é muito grande. E as nossas dificuldades aumentam, essencialmente, por duas razões: o dinheiro que recebemos, por mais que façamos de Tio Patinhas, não vai chegando para o que é preciso e porque a sociedade tem cada vez mais necessidades. Precisávamos de ter condições para responder a essas necessidades, que estão a aumentar, mas vivemos retraídos, porque não podemos mais do que o que já fazemos. Neste momento, não temos capacidade de responder ao aumento das necessidades da comunidade”, lamenta o presidente da instituição, no cargo desde Janeiro de 2011.
Por todo o território nacional tem-se assistido a um crescimento das dificuldades das famílias e o Algarve não é excepção, pelo contrário.
“Basta ver que o Algarve tem a maior taxa de desemprego do País e isso tem que ver com a crise nos sectores do turismo e da construção, o que tem reflexo directo nas famílias e nas instituições”, sustenta António Pina, que faz um retrato sócio-económico cinzento de Olhão: “É uma terra que vive ligada ao mar e à indústria do mar, mas, como se sabe, a situação das pescas está muito difícil e isso reflecte-se logo na vida das pessoas. A Ria Formosa, que era uma grande fonte de riqueza, ainda vai sendo, mas muito menos, e isso traz desemprego e mais problemas sociais. Depois, é uma população que, tal como no resto do País, está a envelhecer, pelo que vai precisando de mais apoios e a instituição, como as coisas estão, tem dificuldade em dar esses apoios. As próprias pessoas e famílias têm, cada vez mais, dificuldades em pagar esses apoios, porque estão em situações de carência”.
FAMÍLIAS DEIXAM DE PAGAR
O presidente da ACASO revela ainda estar a assistir-se a um fenómeno que ilustra bem as dificuldades das famílias… e, por consequência, das instituições: “Há casais que estão a viver situações de desemprego, de
ambos ou de um dos membros, e que têm a mãe ou o pai no lar e o que se tem assistido, neste momento, é que ou se atrasam nos pagamentos, ou deixam mesmo de pagar… As famílias estão a retirar, mais no Centro de Dia, os idosos da instituição para passarem a receber e a viver com a ajuda das reformas. Por exemplo, já tivemos uma lista de espera para o Lar, mas agora não e isto acontece precisamente pelas dificuldades das famílias. Não é por uma nova filosofia de encarar a velhice, mas as famílias optam por ficar com os idosos em casa, porque o dinheiro da pensão faz-lhes falta. Ou, então, até porque estando desempregados e em casa, podem tratar do pai ou da mãe”.
O aumento do número de falhas de pagamento – em 2011 o acumulado de dívida das famílias à instituição atingiu os 150 mil euros – dá-se mais na área da terceira idade. António Pina afirma que “na área dos idosos é mais significativo” e para a instituição mais penalizador, “porque as comparticipações são maiores e quando há falha sente-se mais”. E apesar dos idosos terem as pensões, as falhas nesta área são maiores “porque, mesmo somando a pensão, que é baixinha, com o apoio da Segurança Social e o tal apoio da família não chega e esta terceira componente levanta mais problemas, porque há atrasos, só pagam uma parte ou não pagam”, explica, questionando: “E o que é que se faz àquele idoso?”.
Estas dificuldades das famílias têm reflexo directo na instituição, porque, como revela o seu presidente, “as famílias não pedem a redução das prestações, deixam é de pagar, ou pagam apenas uma parte, e claro a instituição tem que aguentar”.
Perante tantas dificuldades, a instituição, que em Agosto ainda não tinha conseguido pagar o subsídio de férias aos seus colaboradores, tem implementado algumas medidas no sentido de reduzir custos e manter a cabeça fora de água.
“Fazemos milagres, trabalhamos muito com a Banca, mas que nos custa juros, poupamos o mais possível e também temos a colaboração dos funcionários, porque, no fundo, também está em causa o seu emprego”, refere António Pina, revelando que só em 2011 a dívida das famílias ascendeu aos 50 mil euros, acrescentando: “Mas a questão é que este problema não vai diminuindo, pelo contrário vai-se agravando dia após dia. E há-de chegar o dia que não vamos conseguir fazer milagres. Neste momento, estamos a fazer mais uma reestruturação e reequilíbrio financeiro, trabalhando com os bancos, para ver até quando conseguimos passar, mais ou menos, incólumes pela crise. Se o conseguirmos nos próximos dois, três anos a instituição aguenta-se, senão não sei como é que vai ser...”.
APELO AO GOVERNO
António Pina, que é ainda presidente da Região de Turismo do Algarve, está preocupado com o futuro, mas, essencialmente, com a situação presente da ACASO, apela para que o Governo, “em situações difíceis como a sociedade portuguesa está a viver, olhe com um carinho reforçado para a rede das IPSS”, porque se “em situação normal as IPSS já fazem falta, em momento de crise fazem muito mais falta”.
Neste sentido, o responsável máximo pela instituição olhanense volta a dirigir-se aos governantes, demandando: “É aí que o Governo tem que se apoiar para poder aconchegar e almofadar as extensões quer da infância, quer da terceira idade. É preciso ter a sensibilidade para perceber que um euro colocado, neste momento, nas IPSS ajuda a descomprimir a vida das valências”.
António Pina deixa mesmo algumas sugestões, que considera importantes para que as IPSS não definhem e possam continuar e até reforçar a sua ajuda à população, cujas necessidades crescem todos os dias: “Actualizar as comparticipações era algo de fundamental. Uma casa tem dois problemas, ou não tem dinheiro ou não tem ideias… Nós achamos que ainda temos algumas ideias, mas se não houver dinheiro, aquela balela simpática do empreendedorismo e da criatividade é uma ova”.
Por seu turno, o director de serviços da ACASO pede uma atenção especial para o sector solidário, cada vez
com mais peso na sociedade portuguesa, mas o qual não é devidamente reconhecido. “Os governantes deviam assumir de uma vez por todas que o Terceiro Sector é importante e especial na sociedade portuguesa e, em vez de se fingir que dão benesses diferentes das que dão às empresas… Deviam assumi-las, como as taxas que temos que suportar. Por exemplo, temos que suportar as mesmas taxas para a Segurança Social do que qualquer empresa relativa aos colaboradores, as mesmas taxas da água, da electricidade, etc., e, como se sabe, o nosso fim não é lucrativo, ao contrário das empresas. De certa forma, aquilo que recebemos do Estado acaba devolvido pelos pagamentos à Segurança Social. Não havendo hipótese por parte do Estado de dar mais dinheiro, este devia permitir que as instituições não suportassem tanta despesa como as empresas”, sustenta José Calão, reconhecendo ainda que “a mentalidade nas IPSS também está a mudar, porque começa a interiorizar-se que sem dinheiro não é possível fazer-se solidariedade e, hoje, em vez de se permitir que haja uma valência que não tenha receita de lado nenhum, que depois alguém há-de suportar, já se começa a pensar que, pelo menos, é preciso custear a actividade da própria valência”.
Para António Pina, “o Governo devia arranjar maneira de reduzir os custos das IPSS com a electricidade, o combustível e outros gastos sem os quais as instituições não podem funcionar”, sugerindo “um combustível solidário” à semelhança do que acontece com a agricultura.
Apesar das inúmeras e crescentes dificuldades, a ACASO tem conseguido manter o apoio à população olhanense, “porque, felizmente, tem algum património, ou tem tido capacidade de ter algum património”, revela José Calão, mas alerta: “Isto tem funcionado como balões de oxigénio, mas não há hipótese de continuar assim”.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
Data de introdução: 2012-09-29