Se houvesse um dicionário de sinónimos, Voluntariado significaria cidadania, solidariedade, disponibilidade, responsabilidade, compromisso, competência. Pesado caderno de encargos atribuído ao voluntariado por Filomena Bordalo, na abertura do Seminário “IPSS e Voluntariado”, que teve lugar no passado sábado, em Braga.
Para a Directora do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Braga, àqueles predicados haverá que acrescentar a necessidade de formação e uma organização enquadradora.
Filomena Bordalo lembrou os tempos em que decidiu ser voluntária, calçando “os vossos sapatos” para perceber “quão difícil é descodificar as linguagens técnicas e as dos serviços”.
“O voluntariado é o sal da nossa sociedade, o tempero”, afirmou a oradora, para quem ser voluntário é “construir pontes”:
“Não somos engenheiros, mas as nossas pontes são mais importantes que as de cimento armado”.
Perante uma assistência de mais de uma centena de participantes, as primeiras palavras do dia pertenceram aos anfitriões, Dr. Manuel Antunes da Lomba e Prof. Manuel Domingos. O primeiro, Presidente da UDIPSS de Braga, sublinhou a necessidade de mais voluntários em Portugal. Detalhou estatísticas referentes ao Brasil, país que conta com mais de 40 milhões de voluntários.
O Presidente da UDIPSS de Viana do Castelo pôs o acento tónico na necessidade do movimento voluntário não se confundir com voluntarismo: “Quem semeia exigências, acaba por colher qualidade” – sublinhou Manuel Domingos.
ACÁCIO CATARINO: “A NOSSA MENTALIDADE TÉCNICA MARGINALIZOU O VOLUNTARIADO DE PROXIMIDADE”
“Voluntariado Executivo – Perspectivas de Desenvolvimento” foi o tema abordado pelo Presidente do Conselho Nacional para a Promoção do Voluntariado”.
O Dr. Acácio Catarino detalhou as especificidades do movimento voluntário, não ignorando algumas pechas que se vão adensando nos últimos tempos, caso das pessoas que optam pelo voluntariado tendo por fito a conquista, em breve prazo, de um posto de trabalho remunerado. Para Acácio Catarino, uma das marcas mais significativas do movimento voluntário passa pela priorização do relacionamento humano: “Falhando nisso, falha radicalmente”, asseverou, para logo a seguir denunciar:
“A nossa mentalidade técnica marginalizou o voluntariado de proximidade. E, ou aceitamos o voluntariado de proximidade como base da acção social, ou então esta falha”.
Seguiu-se um painel destinado a dar conta de experiências concretas de voluntariado já levadas a cabo por IPSS.
O Dr. Ricardo Miguel Sousa detalhou, com grande pormenor, as experiência que, neste capítulo específico, têm decorrido no Centro Social Cultural de Santo Adrião.
“Nunca tivemos tantos voluntários como hoje em dia!”, assinalou. Bom por um lado, porventura preocupante por outro: “Porque é que pode não ser bom? Porque se está a apagar a mística social, muitos à procura de um posto de trabalho, ou de enriquecimento cultural. O que até será compreensível, pois tais pessoas são vítimas de uma taxa de desemprego altíssima. O desemprego está muito alto, o voluntariado acompanha a tendência”.
Enfatizou a estratégia levada a cabo pelos responsáveis do Centro Social Cultural de Santo Adrião, de fazer passar os voluntários por todas as valências, desde o sector mais jovem à terceira idade.
RICARDO SOUSA: CADERNETA E PASSE SOCIAL, PROMESSAS ESQUECIDAS
Lamentou promessas governamentais não cumpridas, como o passe social para os voluntários, e a dificuldade em pagar o seguro aos voluntários: “Está na lei, mas a verdade é que nós não temos condições financeiras, não conseguimos pagar o seguro aos voluntários”.
A inexistência de regulamentação referente às faltas justificadas para as requisições que as IPSS façam de voluntários, e a caderneta social, “prometida há quatro anos” mas também esquecida, foram outras das preocupações deixadas por Ricardo Sousa no seminário.
A Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Esposende, uma das quatro mulheres-provedoras de Misericórdias no país, deu conta da sua experiência à frente da instituição, focando especialmente a criação da Juvecórdia, a Juventude da Misericórdia de Esposende.
Para esta docente da Universidade do Minho e juíza social do concelho de Esposende, a aposta na juventude integra uma estratégia de abertura da Misericórdia à comunidade: “Encontrei uma instituição muito fechada em si mesma. E na comunidade vão surgindo problemas novos, das famílias monoparentais, da nova emigração de leste, tantos outros”.
Uma organização juvenil como a Juvecórdia, para além da sua vertente formativa, pode servir também para a descoberta de novos dirigentes, de dirigentes mais jovens, de molde a renovar os elencos directivos mais envelhecidos: “A diversidade é importante. A Juvecórdia é central neste trabalho intergeracional das misericórdias” – sublinhou a Dra. Maria Emília Vilarinho.
À Dra. Elisa Borges, Coordenadora do Núcleo de Apoio Técnico ao Conselho Nacional do Voluntariado coube a abordagem do tema “Organização e Promoção do Voluntariado – Impulso e dinâmica”.
“Voluntariado e Responsabilidade Social das Empresas” foi o tema desenvolvido pelo Presidente da Direcção da Associação Industrial do Minho.
ANTÓNIO MARQUES: RESPONSABILIDADE SOCIAL NÃO É ENCARGO, É INVESTIMENTO
O Dr. António Marques defendeu que “para além das organizações estão sempre as pessoas”: “Não vale a pena existirem empresas se não melhorar a qualidade de vida e o emprego. Tenho para mim que o voluntariado é uma vontade de partilha, sem esperar nada em troca. É a vontade de uns em fazer, ao encontro da escassez dos outros em ter”.
Lembrou que o conceito de responsabilidade social das empresas já não é novo, tendo surgido na década de 20 do século passado, por iniciativa de Henry Ford, o empresário americano do ramo automóvel. Tal conceito “implica um envolvimento forte baseado em valores, a vontade de progresso contínuo, a compreensão e aceitação da interdependência com o meio envolvente, uma visão de longo prazo, pensando nas gerações futuras; vontade de informação e transparência, a que se acrescenta a necessidade dos empresários prestarem contas dos seus actos”.
António Marques constata serem cada vez mais as empresas que aderem a este conceito, “porque isto da responsabilidade social também é um negócio!”:
“Começa a criar raiz a constatação de que fazer algo neste domínio específico não é um encargo, mas um investimento” – sublinhou.
JOAQUINA MADEIRA: “IPSS TÊM POUCOS VOLUNTÁRIOS DE EXECUÇÃO”
Seguiu-se a intervenção da Vogal do ISSS. Para a Dra. Joaquina Madeira, os que não aderem ao voluntariado não o fazem por falta de tempo, antes por falta de disponibilidade. E é pena, porque “o voluntariado é um acto de inteligência humana”:
“Sublinho a personalização, a proximidade, contribuirmos para que o cidadão seja sempre mais pessoa. Também o contributo dado para a transformação social. E aqui entronca a solidariedade, que ultrapassa, como sabemos, o espírito de caridade, que vê no outro apenas o
precisado”.
Para Joaquina Madeira, ser voluntário é agir na transformação social, ir às causas dos problemas, ajudando a extirpá-las.
“A pobreza é um problema social, e não um problema do pobre”, acrescentou a oradora, queixando-se do facto das escolas nos prepararem “para sermos seres individuais, esquecendo o ser social”.
Considerou “surpreendente” o facto de, apesar da existência de 4.500 IPSS, não se encontrar nelas o grosso dos voluntários: “De acordo com um inquérito a 900 IPSS, efectuado no Ano Internacional do Voluntariado, só 52% é que tinham algum voluntariado de execução, e numa função complementar. É pouco!
O Seminário “IPSS e Voluntariado” contou com o apoio técnico e financeiro da Estrutura Técnico-Administrativa do
Acordo CNIS-IEFP.
A coordenação esteve a cargo da Margem C.C.E. Lda.
No site do
Acordo CNIS-IEFP disponibiliza-se o
Guia do Voluntariado (formato pdf).
No mesmo site pode ainda aceder às
conclusões do seminário "IPSS e Voluntariado".
Data de introdução: 2004-11-03