Aos 80 anos de idade, o arquitecto Francisco dos Santos decide criar uma fundação com o nome da esposa, falecida nove anos antes, e à qual legou a fortuna e espólio artístico e literário, «em prol dos idosos, das crianças e do desenvolvimento cultural dos seus conterrâneos de Moimenta da Serra».
Porém, seria apenas já após a sua morte e um século sobre o ano do seu nascimento que “os denominados homens bons da freguesia” fazem nascer a Fundação Dona Laura dos Santos, como conta o seu actual presidente, Rui Reis: “O falecimento do arquitecto Francisco dos Santos é anterior à fundação da obra. Os homens bons da freguesia, cumprindo escrupulosamente o testamento, é que dão origem à obra, no ano de 1982”.
Moimenta da Serra é uma freguesia do concelho de Gouveia, que fica na sub-região da Serra da Estrela, no extremo Oeste do distrito da Guarda, e que já foi um dinâmico pólo de produção têxtil.
Cumprindo os desejos do benemérito arquitecto, a instituição abre portas em 1982, com duas valências do que já é hoje uma excelente Unidade Geriátrica.
“A primeira resposta social, logo em 1982, foi o lar de idosos, que na altura, como se poderá perceber, há mais de 30 anos, era um dos pioneiros a nível distrital. Esta resposta social foi implementada e não era algo muito habitual na altura, ao contrário do que acontece hoje no concelho de Gouveia e até por todo o distrito da Guarda”, sublinha Rui Reis, explicando o que se seguiu: “Depois o lar foi vindo a ser complementado. Volvidos quatro anos criou-se uma unidade de acamados e, mais tarde, com mais algumas obras de beneficiação, um salão para os idosos. Portanto, foi uma Unidade que foi crescendo ao longo do tempo”.
Hoje, a Unidade Geriátrica acolhe 50 idosos em Lar e mais 10 em Centro de Dia. No outro extremo oposto da escada etária, a Unidade de Apoio à Infância, criada em 2001, a instituição apoia um universo de mais de 120 petizes (35 crianças em creche, meia centena em ATL e ainda 40 em CAF).
O corpo de 60 funcionários presta ainda serviço directo a dois equipamentos, o CAT – Centro de Acolhimento Temporário e a Comunidade de Inserção. No âmbito do Projecto Mãos Abertas, a Fundação acolhe 20 crianças em CAT e ainda 12 mães em risco na Comunidade de Inserção.
Este é o primeiro projecto lançado pela instituição que abrange todo o território nacional, pois as demais respostas circunscrevem-se a Moimenta da Serra e freguesias vizinhas.
“No que respeita à creche e lar de idosos abrange todo o concelho Gouveia e o Projecto Mãos Abertas é de âmbito nacional”, indica Rui Reis, que explica como surgiu um projecto destes «à sombra» da Serra da Estrela: “Na altura foi ideia nossa. Tinham aberto candidaturas para respostas sociais e, indo beber a algumas fontes, mais fora do País do que propriamente cá de dentro, apresentámos a nossa candidatura”.
Esta postura proactiva da Fundação Dª Laura dos Santos é marca da instituição e um outro projecto que os seus responsáveis ponderam pôr em prática, volta a ser pioneiro, como constata o presidente da Direcção, que se fez acompanhar na entrevista pelos colegas de Direcção Jorge Pina e Orlando Ferreira.
“Ao longo do tempo tem-se procurado inovar e hoje discute-se aqui à nossa mesa a criação de uma Unidade de Demências, para o Alzheimer e o Parkinson. É algo que não há aqui, não há na Guarda, não há em Coimbra, não há em Viseu”, lamenta Rui Reis, acrescentando: “A Unidade de Demências é o nosso sonho. É a próxima menina dos nossos olhos. Estamos a fazer o projecto, para quando alguma candidatura a fundos surgir podermos estar preparados. Poderá ser uma nova realidade aqui na Fundação”.
A constatação de que as demências são um problema cada vez maior “na nossa sociedade”, leva Rui Reis a considerar que, “o desenvolvimento das respostas sociais Lar, Centro de Dia e Apoio Domiciliário enferma, já há algum tempo, de um problema que é a questão de poder ter utentes e não ter capacidade de os ajudar”.
Para este responsável, “há aqui um pedido de intervenção por parte da família, que na maioria das vezes, e quando estão em Lar, há a dificuldade de os próprios colaboradores da instituição não se sentirem capacitados para lidar com essas situações”.
O pioneirismo das acções da Fundação tem mais um marco que o seu presidente faz questão de sublinhar: “Seguimos uma linha estratégica de intervenção no social, traçada há cerca de 13 anos, que levou em 2003 à certificação de qualidade, naquilo que foi a primeira instituição a consegui-lo em Portugal. Fomos a primeira a ser certificada, em Março de 2003, pela ISO 9001, numa altura em que ainda ninguém sabia muito bem o que isso era. Hoje, e desde 2006, temos todas as respostas certificadas”.
SUCESSO ALÉM-FRONTEIRAS
As respostas sociais da Fundação têm ainda mais um ramo, por vezes descurado em muitas outras IPSS, que é a Unidade Desportiva.
Natação e futebol são as modalidades de eleição e os resultados são palpáveis. Se a natação é de aprendizagem e o futebol assenta na formação, a verdade é que a equipa sénior feminina de futebol disputa, actualmente, o Campeonato Nacional da I Divisão, emprestando diversas atletas à Selecção Portuguesa e «exportando» outras para campeonatos estrangeiros.
“As atletas da equipa sénior são todas do distrito da Guarda”, diz com orgulho Jorge Pina, responsável pela Unidade Desportiva, que movimenta um universo de 180 pagantes.
“A Unidade Desportiva é um chamariz a nível do concelho. O facto de termos a natação e o futebol faz com que tenhamos aqui mais crianças na creche. A natação é desde os quatro meses e há crianças que vêm para a natação e acabam por ficar na creche”, esclarece Jorge Pina, ao que o presidente da Direcção acrescenta: “A mais-valia da Unidade Desportiva é uma contrapartida em termos de conhecimento da Fundação, não só no País, como no estrangeiro. Se formos à internet e procurarmos Ana Borges, o resultado é uma jogadora que passou pela Fundação durante sete anos e que neste momento está a jogar em Espanha. E podemos falar de muitas outras. Podemos falar, por exemplo, da Sílvia Rebelo, que agora trabalha também na Fundação, e que é uma das jogadoras internacionais portuguesas… É esta a riqueza!... E temos outros miúdos que passaram ali pelo professor Jorge Pina, como o caso de um que hoje está no Sporting, entre outros casos. Tem havido alguma saída de jogadores”.
Em termos culturais, apesar do Museu estar de certa forma desactivado, o espólio da Fundação conta com 20 mil livros, 200 pinturas e 600 peças decorativas.
RUPTURA SERIA INEVITÁVEL
Sobre a importância do trabalho desenvolvido pela Fundação, Rui Reis é claro: “O que seria de Moimenta e das freguesias limítrofes sem a Fundação? Não tanto Gouveia, mas Vinhó, Passos da Serra e outras sem a Fundação? Seria, no fundo, aquilo que somos conhecedores de outras freguesias que, como Passos da Serra, assumiram protagonismo ligado aos têxteis… Portanto, seria um cenário como o de Passos da Serra, que é paradigmático, em que há persistência das pessoas, mas de ruptura total em termos daquilo que é a capacitação, a empregabilidade, a sustentabilidade das famílias que é nula”.
Apesar de não nadar em dinheiro, “e ter ao longo do tempo criado infra-estruturas” para assegurar a sustentabilidade da casa, Rui Reis sublinha: “A Fundação é uma instituição aberta a todos. Não é politicamente correcto dizê-lo, mas toda a gente sabe que há IPSS que selecionam os utentes, se tem dinheiro, «venha lá», se tem uma reforma de 300 euros, não entra. A Fundação não discrimina ninguém, temos responsabilidade social nas admissões. Temos aí um utente, o Zé da Magnólia, que vem buscar a comida aqui e não paga nada. É um dos pobres da aldeia. Noutro dia fomos buscar um idoso a casa em completo desleixo, porque não tinha mais para onde ir. Temos aqui com bastante relevância e evidência a responsabilidade social nas decisões que tomamos”.
A Fundação Dª laura dos Santos terá um papel de grande relevo na manhã desportiva da Festa da Solidariedade, algo em que ninguém vai querer deixar de participar…
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
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