“Sabe doutora, eu nunca tive um telefone!”, afirmou, deliciado como uma criança perante um novo brinquedo, um dos beneficiários da tele-assistência implementada pela Engenho, dirigindo-se à assistente social da instituição que lhe acabava de propor a adesão ao serviço.
A técnica da Engenho recorda ainda que o primeiro problema levantado pelo utente foi onde colocar o equipamento, que mais não é do que um telefone fixo, pois na mesa-de-cabeceira é lugar do rádio, a companhia diária deste idoso beneficiário do Serviço de Apoio Domiciliário da IPSS sedeada em Arnoso (Santa Maria) e que, a partir de agora, dispõe de uma linha directa em caso de emergência.
Neste caso um dos requisitos para se ser beneficiário do serviço não estava cumprido, pois o utente não dispunha de linha telefónica instalada, mas o protocolo inclui a instalação gratuita pela PT de um determinado número de linhas telefónicas em casa de utentes mais carenciados.
O serviço consiste de um equipamento telefónico fixo que é instalado na residência do beneficiário e que liga directamente para a Engenho – que garante 24 horas por dia, sete dias por semana, um atendimento personalizado e o auxílio imediato em situações de emergência – e ainda para outros dois contactos à escolha do utente, que podem ser os de familiares, do médico assistente ou de qualquer outra pessoa ou entidade.
A parceria estabelecida entre a instituição e a Fundação PT inclui a instalação de 27 equipamentos de tele-assistência, que conta ainda com um comando portátil, com um simples botão, que acompanhará sempre o utente e que pode ser accionado em caso de emergência, como, por exemplo, uma queda.
O serviço e instalação são integralmente gratuitos e abrangem, nesta primeira fase, 27 utentes selecionados de entre os 45 utentes do Serviço de Apoio Domiciliário (SAD) e dos 20 do Centro de Dia da Engenho, estando, no entanto, aberto à candidatura de qualquer outro associado da instituição ou outra pessoa que preencha os requisitos necessários à mesma.
“Este projecto surge no âmbito de uma política de parceria estratégica celebrada entre a Engenho e a Fundação PT… São beneficiários deste programa de tele-assistência pessoas com mais de 65 anos, comprovadamente carenciadas, sendo o serviço gratuito e implica apenas que o beneficiário tenha uma linha fixa da PT”, explica Manuel Araújo, presidente da Engenho.
A solidão e o isolamento são uma preocupação da Engenho – Associação de Desenvolvimento Local do Vale do Este, concelho de Vila Nova de Famalicão, uma região encostada ao da vizinha cidade de Braga.
“A solidão, nos dias de hoje, é uma doença”, sublinha Manuel Araújo, cuja instituição por si dirigida tem por território prioritário de acção cinco freguesias do extremo Norte do concelho famalicense, a saber: Arnoso (Santa Maria), Arnoso (Santa Eulália), Lemenhe, Jesufrei e Sezures.
No entanto, a área de cobertura deste projecto de tele-assistência abarca 13 freguesias desse extremo Norte do concelho de Vila Nova de Famalicão.
Este raio de acção mais vasto prende-se directamente com um serviço que “é especialmente significativo” na Engenho e que é o Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social (SAAS), como explica o presidente da IPSS: “No fundo, trata-se de um serviço de proximidade, que abrange 13 freguesias do extremo Norte do concelho de Famalicão, com aproximadamente 40 mil habitantes. E como serviço de proximidade que é, não é mais do que os serviços da Segurança Social no terreno. Uma equipa técnica, com assistentes sociais e psicólogos, que no terreno acompanham pessoas e famílias em situações problemáticas e de carência, beneficiários do RSI, casos sociais de doença e de desemprego”.
A tele-assistência é um projecto lançado em meados de Outubro, com o objectivo de reforçar a proximidade entre a instituição e a população e cuja primeira fase de implementação deverá estar concluída no final do corrente ano.
“Numa primeira fase estão a ser contemplados 27 pessoas, mas para além de reforçar esta proximidade com os nossos utentes do Centro de Dia e do SAD, este processo, pela sua natureza e funcionalidade, é fundamental para quebrar situações de isolamento e até de solidão com pessoas carenciadas e com problemas de saúde e de carência”, reforça Manuel Araújo, adiantando: “O serviço está aberto a associados e a outras pessoas que não sejam utentes do SAD ou do Centro de Dia que, numa situação de isolamento, possam requisitar o serviço, e nesse capítulo os técnicos do SAAS estão alerta”.
Em termos de funcionalidade, o sistema permite à pessoa, através de três botões, cujos destinatários são à escolha, accionar esses mesmos contactos. Numa situação de SOS, a tele-assistência permite ao idosos solicitar um serviço ou o contacto com a Engenho, um familiar ou até o médico assistente.
“As chamadas que caem na Engenho são encaminhadas conforme a necessidade ou o interesse, mas muitas vezes o serviço funciona como uma voz amiga para o utente desabafar e para quebrar a monotonia e a solidão”.
O feedback até ao momento “é positivo”, tendo “reforçado o sentimento de segurança entre os utentes e também entre os familiares”, argumenta o presidente da Engenho, que sublinha: “Os custos são praticamente inexistentes, porque a instituição tenta aproveitar ao máximo os recursos técnicos e humanos instalados. Todos os nossos colaboradores, independentemente das funções específicas que desempenham, têm capacidades transversais de não se confinarem a essa função. Por isso, há por parte dos colaboradores uma forma de ser bastante aberta e versátil e um forte sentido de pertença à instituição. Ninguém espera por outra pessoa para encaminhar uma situação de SOS”, revela Manuel Araújo.
Estando, para já, a cobrir o território do extremo Norte do concelho, abarcando 13 freguesias, o projecto tem uma ambição maior.
“A iniciativa é pioneira em Famalicão e na região de Braga e é nossa intenção, em colaboração com a Câmara Municipal e a Fundação PT, alargar este serviço a toda a zona Norte do concelho e até a todo o município, o que seria óptimo. Este é igualmente um desejo da autarquia”, lembra o líder da instituição, que evidencia os “fortes laços de vizinhança” das comunidades que apoia socialmente.
“São freguesias vizinhas, com características homogéneas em termos sociais, culturais, económicas e até paisagísticas, um ambiente com reminiscências rurais. E são freguesias que têm entre si fortes laços de vizinhança, com uma identidade muito vincada e que tem a uni-las traços de forte ruralidade, com recursos endógenos, que a Engenho tenta aproveitar e potenciar”, refere Manuel Araújo, acrescentando: “Estas freguesias têm uma matriz sociológica bem vincada, dadas as características rurais, que é um forte sentido de pertença à comunidade e boas relações de vizinhança que foram cimentadas ao longo da História. Estamos perante uma comunidade de vizinhos, não obstante, por razões várias, pode haver locais em que se verifique algum isolamento. E quando falamos de isolamento, estamos a falar de idosos, acamados, doentes e de pessoas, que por razões familiares, vivem sós. E o grande problema é a solidão”.
Daí a aposta da Engenho neste serviço de proximidade, que confere um sentimento de segurança às pessoas muito grande, seguindo o lema que tem norteado a acção da instituição desde 1994, ano da fundação: “A Engenho, nestes 20 anos, tudo tem feito para valorizar as populações, prestar-lhe uma série de respostas sociais e serviços que permitiram alavancar esta região, que, durante muitos anos, sofreu dos problemas da periferia e do isolamento”.
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