JANEIRO DE 2005

Ano Novo, Vida Nova - por Henrique Rodrigues

1 - O ano despede-se sem deixar saudades.
Foi o ano da matança terrorista na Estação de Atocha, aqui bem perto, em Madrid - a lembrar-nos que vivem no meio de nós, connosco, redes complexas de pessoas e grupos que querem mudar, sem regras e pelo terror, o estilo e forma de vida que mantemos no mundo ocidente, voltando a pôr-nos sob servidão, agora que conhecemos o sabor doce da liberdade.
(A esse propósito, ficámos a saber que tais grupos têm Portugal como um sítio propício e acolhedor, quer para dar guarida a células terroristas, quer para a organização e preparação de operações, quer para a aquisição de explosivos. Vem-lhes essa preferência da tradicional incompetência da nossa investigação e da impunidade que nos anda agarrada à imagem como se fosse à pele.
Escusamos de ficar orgulhosos com tais "méritos" pátrios).

Falando em terrorismo, 2004 foi também o ano que ficou tristemente marcado pelo separatismo tchecheno no território da Rússia.
Desta vez as vitimas não foram os espectadores de um teatro, mas as crianças de uma escola - a sugerir-
-nos que fora das regras da democracia aberta, como na Rússia, a forma de resolver as coisas é muitas vezes mais expedita.
Mesmo que à custa da morte de crianças.
(Também por cá vamos tendo quem faça da afirmação da autoridade um valor a cultivar, como se não bastasse a que nos impuseram durante os 40 anos do Estado Novo…)

Acabamos o ano com o terror da natureza primitiva - que fez com que o mar viesse matar em terra, no Sudeste Asiático, mais de 125 mil pessoas (números apurados até à data em que escrevo, 30 de Dezembro).

2 - Sobre essa tragédia, que impõe a nossa solidariedade - e a Caritas Portuguesa, a Cruz Vermelha Portuguesa e a AMI estão na primeira linha do apoio às vitimas -, já está tudo dito.
Há todavia alguns aspectos, à margem do drama, que, pelo que dizem de nós, pretendo realçar.
Toda a vida humana tem um valor sem preço. E a morte de cada pessoa, numa tragédia destas, é uma perda sem medida.
Mas o número de vítimas também esmaga pela quantidade.

Foi necessário a AMI anunciar que partia para o Sri Lanka para eu perceber - e procuro andar bem informado - que nessas terras por onde os marinheiros portugueses andaram no século XVI, e também na Indonésia, o número de vítimas e a dimensão dos danos era muita vezes superior aos da Tailândia, que no entanto ocupava o mais largo espaço informativo na televisão e nos jornais.

A diferença é que na Tailândia uma grande parte das vítimas era cidadãos estrangeiros, dos países ocidentais ricos, que se encontravam em férias em estâncias turísticas de grande beleza, ao passo que os outros acima referidos eram comunidades pobres.
Foram aqueles que a imprensa escolheu como objecto de reportagem.

3 - A propósito da AMI, parece que o Ministério dos Negócios Estrangeiros não levou a bem a iniciativa da instituição em definir ela própria as suas prioridades, entrando numa polémica que ficou por perceber quanto ao fretamento de um avião pelo Governo para socorro às vitimas.
A actuação dos poderes públicos em Portugal a respeito deste drama ficou, aliás, e pelo menos na opinião geral, mais marcada pelos fait-divers do que pela eficácia discreta que era a exigível.

Não é só do debate com a AMI que se trata; mas também da persistente inércia do embaixador, que só empurrado é que se lembrou que o seu lugar era no seu posto; do Ministro que se agasta com os jornalistas por estes lhe fazerem as perguntas que deviam ser feitas, em vez de servirem de caixa de ressonância de retórica de propaganda; para acabar em mais uma desautorização feita pelo Primeiro Ministro - que desta vez seguiu o seu instinto e foi sensível ao tom geral da imprensa - em mais um membro do seu Governo.

Enfim, melhores tempos nos tragam 2005. Estou em crer que vai trazer.

* Presidente da Direcção do Centro Social de Ermesinde

 

 

Data de introdução: 2005-01-24



















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