A Fundação Maria da Conceição e Humberto Horta (FMCHH) é daquelas instituições sociais que antes de o ser já o era, ou seja, antes de existir juridicamente, já havia um conjunto de ações e todo um trabalho social voluntário desenvolvido pelos dois fundadores.
Sem grandes fortunas, inclusive Humberto Horta era mecânico de profissão, a «Mãe Maria», como era conhecida, construiu uma obra social e religiosa a partir de pequenos gestos de solidariedade, logrando, juntamente com o seu marido, edificar uma obra que, em 1997, ano da constituição da Fundação, carregava já mais de duas décadas de serviço aos outros.
“Sempre foi prática dos fundadores, ainda como simples cidadãos, porque a Fundação ainda não existia, ajudarem os que à volta deles necessitavam, fossem crianças, idosos ou famílias. Começaram por ajudar uma família que tinha filhos e não os conseguia criar, uma velhinha que vivia isolada e por aí fora… Hoje isto tem muitas casas aqui à volta, mas quando começou era tudo deserto. As pessoas ouviam dizer que havia uma senhora que ajudava os que precisavam e começaram a recorrer a ela. Isto cresceu de tal maneira que foi preciso estruturar essa ajuda de outra forma, acabando por nascer a fundação”, conta Augusta Pereira, animadora social dos lares da instituição.
Situada na periferia da cidade de Torres Novas, no Casal Garcia Mogo, perto da aldeia de Meia Via, o complexo edificado em terrenos que os fundadores e a própria FMCHH foram adquirindo, está inserido num espaço natural.
A determinada altura, o casal optou pela Igreja Ortodoxa, acabando por se instalar ali também uma forte comunidade religiosa ortodoxa. Assim, no Casal Garcia Mogo, para além da casa dos casal fundador, e onde funciona a sede administrativa da Fundação, foram construídas algumas residências para determinados colaboradores, um mosteiro onde se recolhem os padres e freiras residentes, duas igrejas (uma delas Católica Romana), uma unidade de produção de queijo, instalações de apoio à pecuária e à agricultura e ainda uma Catedral ortodoxa, onde repousam num mausoléu os dois fundadores. Foram também edificadas uma casa e uma escola destinadas às crianças acolhidas pela Fundação. E foram muitas, ao longo dos anos, as crianças desprotegidas que a Fundação ali acolheu, especialmente vindas de Angola, Cabo Verde e Guiné-Bissau.
Inserido nesse complexo, nasceu igualmente um lar de idosos, que recebeu o nome dos fundadores, com capacidade para 39 utentes, mas que atualmente acolhe apenas 32. Aliás, esta é atualmente a principal faceta social que a instituição desenvolve, tendo em 2013 criado mais uma resposta de ERPI, o Lar da Sagrada Família, a poucos metros do demais edificado, e que acolhe 60 utentes, a sua capacidade máxima.
“Nós não estamos cá assim há tanto tempo, mas sempre conhecemos a Fundação com estas duas vertentes, a religiosa e a social. A parte social, na qual trabalhamos, dedica-se aos idosos e sabemos que é uma continuidade do que os fundadores iniciaram de uma forma informal. A parte religiosa assenta numa comunidade de padres e freiras ortodoxas, tem um mosteiro e uma catedral, onde realizam as respetivas cerimónias. Agora, a parte religiosa e a parte social não se misturam”, sublinha Augusta Pereira, acrescentando: “A Fundação nunca pertenceu à Igreja Ortodoxa, coexistem no mesmo espaço”.
E se em tempos o acolhimento de crianças e jovens era uma das principais atividades sociais da Fundação, essa vertente hoje nãso existe, passando a instituição a dedicar-se, em exclusivo, à área da terceira idade.
“A Fundação foi criada para acolher e cuidar crianças e idosos e até determinada altura houve resposta a esses dois grupos, mas aquando do processo de estruturação e legalização da Fundação foi possível fazê-lo para área dos idosos, mas não com a infância, por determinados entraves burocráticos e até condições físicas”, explica Augusta Pereira, que sublinha, no entanto, a intenção de voltar a criar uma resposta na área da infância: “Está em projeto voltar à infância, mas, entretanto, os fundadores também faleceram e quem ficou a tentar continuar a obra tem que ir com calma, estruturando primeiro esta vertente dos idosos e só depois avançar para a infância”.
Esta ideia é reforçada pela diretora-técnica dos lares. “Há esse projeto mas não é para já, é para quando se puder, ou seja, quando esta crise passar. O trabalho que dantes se fazia com as crianças era na resposta de lar residencial, mas penso que não é nessa perspetiva que se pretende avançar”, refere Ana Franco, ao que Augusta Pereira acrescenta: “Para já não seria nesse âmbito, mas mais de apoio à comunidade com uma creche e um infantário, porque na zona a resposta nestas áreas já foi melhor. Há alguma resposta e, por isso, não há tanta urgência, mesmo até porque também já houve mais procura de creches e apoio à primeira infância do que há neste momento”.
Em termos de seniores, a instituição cuida de quase uma centena de idosos, muitos deles de fora da região de Torres Novas. Aliás, foi a grande procura que fez com que a instituição avançasse para mais um equipamento, que desde 2013 dá resposta a seis dezenas de pessoas.
“Não recebemos apenas pessoas daqui, acolhemos pessoas de todo o País e, face à enorme lista de espera que tínhamos, tornou-se evidente que necessitávamos de outra estrutura, daí termos construído este novo lar. Para além disso, também era vontade dos fundadores a criação de outro equipamento. E mesmo assim, já não conseguimos dar resposta à procura que temos”, ressalva Ana Franco, revelando que a instituição não tem Acordo de Cooperação com o Estado.
“Apesar de sermos uma IPSS, a Fundação não tem protocolo com a Segurança Social, ou seja, praticamos uma mensalidade fixa o que obriga mesmo a que os utentes tenham retaguarda familiar, porque as reformas deles não chegam, apesar de praticarmos mensalidades abaixo de outras instituições”, sublinha Ana Franco, que encontra na crise a justificação para esta situação: “Inicialmente foi pedido e a Segurança Social não atendeu. Por entraves que desconheço não houve acordo para o primeiro lar. Já para o Lar da Sagrada Família, surgiu a crise e as comparticipações estiveram congeladas. Estamos a tentar conseguir alguma comparticipação, mas até agora não conseguimos”.
No entanto, a diretora-técnica ressalva que a mensalidade que praticam “é um pouco mais acessível do que a dos lares privados”.
Sustentando que é cobrado o mínimo para fazer face às despesas, Ana Franco considera que, “como todas as outras IPSS do País, a Fundação vai tentando sobreviver, com bastantes dificuldades para fazer face às despesas e aos problemas que surgem, mas vai-se aguentando com uma gestão muito ponderada”, ao que Augusta Pereira acrescenta: “É preciso fazer uma gestão cuidada e perceber bem quais são as prioridades”.
Com uma taxa etária de utentes acima dos 90 anos e com um crescente número de casos de demência e grandes dependências, nos lares da FMCHH desenvolve-se um intenso trabalho em prol do envelhecimento ativo.
“Fazemos uma aposta grande no desenvolvimento físico e cognitivo. Em termos físicos promovemos atividades que assegurem as capacidades que os utentes ainda têm e procuramos sempre, ao mesmo tempo e em atividades separadas, fazer o desenvolvimento cognitivo e verbal, porque há pessoas que se não formos falar com elas não falam. Para além disso, temos a ginástica de grupo e algumas atividades individuais. Em termos de desenvolvimento cognitivo temos diversos jogos e ainda os livros da Associação Alzheimer, onde vamos buscar muitas atividades. Depois temos uma faceta mais lúdica, com passeios ao exterior, convívios com outras instituições e festas temáticas, celebramos os aniversários de todos os idosos, fazemos intercâmbios com outros lares e participamos em sessões de esclarecimento sobre temas específicos para estas faixas etárias”, conta Augusta Pereira, que recorda um utente que, em 2014, faleceu com 105 anos.
Não há inqueritos válidos.