Nas últimas semanas, muita gente ouviu falar, pela primeira vez, de uma cidade esquecida, embora classificada pela Unesco, há vários anos, como património cultural da Humanidade. Referimo-nos, à cidade de Palmira, agora conhecida como Tamdur que, no século III, sendo uma província romana, a famosa rainha Zenóbia quis transformar em capital do seu próprio reino. Situada no coração da Síria, a 210 quilómetros de Damasco, foi a ameaça de ser conquistada pelo chamado “estado islâmico” que justificou o relevo noticioso que os “media” lhe dedicaram. As imagens que acompanhavam os textos, mesmo que fossem quase só de ruínas, atestavam os motivos daquela classificação. Só por si, a beleza e a altura daquelas colunas chegavam para confirmar que estamos perante um tesouro cultural da Humanidade. A ameaça concretizou-se, os combatentes do “estado islâmico” conquistaram a cidade, e só não destruíram totalmente esse tesouro, porque algumas das suas riquezas foram retiradas a tempo.
A obsessão da iconoclastia parece ser uma das características dos fanáticos de todos os tempos. Veja-se o comportamento dos talibãs que, no ano de 2001, destruíram as famosas estátuas de Buda de Bamyan, com os seus 52 e 38 metros de altura respectivamente, levantando clamores de protesto em todo o mundo e tornando mais “aceitável” a invasão do Afeganistão. Veja-se ainda o que os combatentes do “estado islâmico” fizeram em diversas cidades históricas do Iraque e da Síria, e ainda no Museu de Mossul. É que, pelo menos aparentemente, a destruição de bens culturais, testemunhos e símbolos de outras civilizações, constitui um objectivo da sua luta pela implementação de um mundo novo. Ora acontece que, neste caso, a implementação deste mundo novo passa pelo culto da guerra, de tal modo que o líder do estado islâmico não teve dúvidas em proclamar, recentemente, e contrariando a maioria dos dirigentes muçulmanos, que o Islão é a religião da Guerra e não da Paz.
Embora estas afirmações não se devam tomar à letra, porque se inserem predominantemente numa estratégia de guerra psicológica, elas são suficientemente ameaçadoras para justificarem o receio de que o mundo enfrenta um inimigo visceralmente dominado pelo ódio e pela irracionalidade. A obsessão da iconoclastia é apenas uma das expressões mais visíveis desse ódio e dessa irracionalidade.
António José da Silva
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