Escrevo esta crónica num dia em que os líderes dos 28 países da União Europeia tiveram de fazer um longo serão para poderem redigir um documento político de consenso sobre compromissos assumidos em relação à forma de gerir, com um mínimo de humanidade, a grave crise de milhões de migrantes, entre os quais, uma grande parte de refugiados!
Naquela que se esperava que fosse a “mãe das cimeiras europeias” (com a presença dos 28 líderes dos 28 países que integram a União Europeia), a chanceler Merkel, num tom dramático, alertou para o “risco de, no caso de não haver consenso e uma posição conjunta de todos capaz de dar resposta aos dramas de milhões de pessoas emigrantes que se sentem perdidas e rejeitadas por todas as nações, a União Europeia perder a face e se ver confrontada com a acusação de não ter conseguido preservar o sistema de valores que serviu de alicerce à construção do projeto europeu!”
Tem sido confrangedor constatar a forma como uma visão financista/monetarista se tem sobreposto, ao longo dos anos, a uma cultura de princípios e valores humanistas e até humanitários, que inventou “essa coisa iníqua” de fixar quotas para tudo, incluindo o acolhimento de multidões de refugiados abandonados em alto mar, considerando as pessoas como “mercadorias” que não se deixam desembarcar em solo europeu para lhes prestar ajuda humanitária, com medo que roubem os nossos empregos, contagiem a nossa cultura de bem-estar, desequilibrem a nossa balança de pagamentos!
Está a ser preocupante a ascensão ao Poder, em vários países da União Europeia, de governantes com mentalidades que ameaçam comprometer os alicerces desta mesma União! Não deixa de ser chocante o que se passa, designadamente, na Itália, onde, por um lado, o Papa Francisco, em nome da Igreja Católica, clama por uma cultura humanitária e de inclusão social de multidões de emigrantes e refugiados procuram na Europa a sua sobrevivência, e, por outro, o atual Primeiro-Ministro Conte se tenha tornado o porta-voz do movimento que pretende criar “novos muros da vergonha” de triste recordação!
Não será por acaso que Ângela Merkel tem vindo a defender uma solução política multilateral para a migração. Ela sentiu a experiência amarga de viver no lado mais pobre da Alemanha do leste, tronando-se uma construtora incansável da união das “duas Alemanhas”!
Depois de tantas esperanças na construção da União Europeia, custa ouvir da boca do seu presidente, Jean-Claude Juncker “que a sua fragilidade está aumentar e cresce o tamanho das suas fissuras”.
Andou bem o nosso Primeiro-Ministro António Costa ao afirmar, na referida Cimeira, que “o valor da Europa, em nome da dignidade do ser humano, é garantir proteção internacional a todos aqueles que têm estatuto de refugiados. Temos de ter canais organizados para que os refugiados possam ser acolhidos na Europa”.
Todos sabemos que esta problemática tem uma dimensão e complexidade que se não resolvem com simples enunciados de princípios! Porém, sem uma consciência esclarecida e uma afirmação determinada, por parte dos líderes e das opiniões públicas dos seus países, que afirmem o primado do Humanismo sobre o Monetarismo e continuem a bater-se pela defesa intransigente e coerente dos direitos humanos, a Europa caminhará para uma situação de potencial futura candidata a pedir auxílio a países a quem agora está a virar as costas!
Pe. José Maia
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