1. Um Orçamento do Estado (OE) dita três grandes funções: económicas (destina-se a permitir uma melhor gestão dos dinheiros públicos), políticas (assegura direitos fundamentais dos cidadãos, impedindo que tenham de pagar impostos sem autorização dos seus representantes legítimos) e jurídicas (a administração pública está limitada por um conjunto de normas que regulam o seu funcionamento e organização).
Por norma, entre outras, deve respeitar as regras da anualidade (tem um ano de validade), integridade (um só orçamento e tudo no orçamento) e descriminação orçamental (cada receita e cada despesa devem ser especificadas e individualizadas).
É no OE que o Governo apresenta a sua política económica para o ano seguinte.
O Orçamento do Estado, instrumento de gestão que contém uma previsão discriminada das receitas e despesas do Estado, incluindo as dos fundos e serviços autónomos e o orçamento da segurança social, é da iniciativa exclusiva do Governo e, como proposta para 2020, foi apresentado no dia 16 de Dezembro na Assembleia da República.
2. Analisando a proposta do OE para 2020, verifica-se que, entre outras medidas, ali se aponta o aumento de 0,3% para os funcionários públicos, o aumento do salário mínimo para 635 euros e os aumentos salariais no privado de 2,7%, a dedução específica no segundo filho, a eliminação progressiva das taxas moderadoras nos cuidados primários e consultas, a maior progressividade no IRS e a sua redução para a classe média, a mexida na lei para IVA da energia a variar em função do consumo, o reforço de 800 milhões de euros para a Saúde e os reforços de incentivos ao arrendamento acessível e de 20 milhões de euros para o programa de redução tarifária nos transportes públicos.
E que diz o OE para 2020 para o Sector Social Solidário que coopera com o Estado nomeadamente e muitíssimo na proteção social?
A resposta parece ser simples: nada.
Mas a protecção social não é uma função do Estado?
Certamente...
3. Poder-se-á pensar que o OE não tem de incluir a Cooperação com o Sector Social Solidário porque eventuais medidas já estão prevenidas por outros documentos legais e está acautelada no Orçamento da Segurança Social.
Mas algumas das medidas do OE já referidas têm impacto na Cooperação. Umas - não se percebe muito bem quais - terão impacto positivo; porém, outras têm correspondências eventualmente negativas.
E não somente a proteção social desenvolvida pelo Sector Social Solidário é muito grande e muito importante (com ação social direta e não lucrativa) como também o próprio Sector se confronta numa encruzilhada de eventual insustentabilidade.
Mas… a proteção social que o Sector Social Solidário desenvolve não será uma obrigação do Estado?
Evidentemente.
No caso português, não porque tenha de ser o Estado a exercer a ação social direta - ela vem sendo muito bem desenvolvida pelo Sector Social Solidário, com envolvimentos por todo o Pais, com benefícios acrescidos para os cidadãos (especialmente os mais carenciados) e com custos muito diminuídos para o Estado.
Este, o Estado, assume a proteção social quando define políticas sociais sustentadas, assegura meios para a sua boa implementação, contrata para a sua boa execução com o Sector Social Solidário e providencia pela necessária universalização dos direitos sociais. Como acontece com muitas outras beneficiações com que o Estado vai dotando o País: planeia segundo as necessidades mapeadas, disponibiliza com os meios necessários e contrata para a sua execução com os eficazes agentes. Mas na proteção social o Estado tem a oportunidade de contratar com um Sector que não visa o lucro e que garante uma exemplar e boa cobertura do País.
Aqui e agora, o Estado é chamado a assegurar melhores meios para que a ação social direta seja desenvolvida na Cooperação como vem sendo pelo Sector Social Solidário e sem muitos sobressaltos. No presente e no futuro.
E não haver qualquer referência no OE à proteção social desenvolvida no âmbito da Cooperação pode significar um "lavar as mãos" por parte do Estado sobre uma das suas principais obrigações…
De acordo com a calendarização aprovada pela Conferência de Líderes, a apreciação na generalidade do OE decorre nos dias 9 e 10 de Janeiro, com a votação na generalidade a ter lugar no dia 10, após o que se segue a apreciação na especialidade, que se prolonga até ao dia 6 de Fevereiro. O encerramento e votação final global estão marcados para esse dia.
Como durante a sua apreciação na especialidade muita alteração poderá beneficiar o OE para 2020, esperemos que o Sector Social Solidário seja contemplado. Com propostas dos Partidos ou do próprio Governo.
Simples exemplos indicativos: por que não bonificar a TSU na Cooperação? E por que não redefinir o IVA da Cooperação?
Lino Maia
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