JOSÉ A. DA SILVA PENEDA

O Estado da Nação

Ao longo de quase nove séculos, a Nação Portuguesa foi sempre pobre, talvez com exceção de algumas poucas décadas dos séculos XV e XVI, em que o País dominou grande parte do planeta mas rapidamente perdeu o domínio das vantagens do comércio internacional.

Hoje, a Nação está como sempre foi: pobre, sem capital, muito endividada e com perda recente de domínio em setores importantes da sua economia. Quase um quinto dos seus cidadãos está em situação de pobreza e há preocupantes sinais de crescentes aumentos de desigualdades de rendimento. Em paralelo, assistimos a um aparente paradoxo, que consiste em que, ao mesmo tempo que aumenta a pobreza e as desigualdades, a qualidade de vida da sociedade portuguesa tem melhorado. São vários os indicadores que atestam essa melhoria, desde o acesso à saúde e à educação, a evolução da esperança de vida, da taxa de mortalidade infantil, do acesso a água potável, ao saneamento básico, às melhorias ambientais e ao crescimento de equipamento urbano de qualidade. Este aparente paradoxo tem uma explicação. A evolução da qualidade de vida da Nação nos últimos anos deve-se, em muita larga medida à União Europeia. Não fora Portugal ser parte integrante desse projeto político a situação económica e social da Nação seria um desastre. 

No último ano e meio aconteceu a pandemia, que tornou a Nação ainda mais pobre pelo impacto que teve, especialmente no setor do turismo e no aumento do desemprego. Também aqui a União Europeia foi a tábua de salvação, não só no ataque ao vírus, mas também na definição de novas políticas e instrumento com vista à recuperação da economia. 

A Nação tem quatro grandes problemas por resolver: Debilidade das instituições, dívida perante o exterior, elevado nível de pobreza e flagrantes desigualdades de rendimento. 

Quanto à debilidade das instituições, há um livro intitulado “Porque falham as Nações” da autoria de Daron Acoenoglu e James Robinson que nos diz que instituições débeis conduzem a nações com fragilidades de diversa natureza. A desconfiança perante o cidadão é o padrão típico do comportamento das instituições públicas. Em Portugal, as instituições públicas são fracas, muitas delas sem credibilidade e com pessoal pouco qualificado e desmotivado. As instituições ligadas a funções de soberania do Estado, como é o caso da segurança interna e da justiça têm evidenciado falhas graves. A função de supervisão financeira não correspondeu de forma conveniente em vários momentos. Se o Banco de Portugal tivesse funcionado adequadamente não teria acontecido os casos BPN, BES e Banco Privado. A função reguladora também apresenta deficiências graves, sendo que a mais gritante é a das telecomunicações, que tem um titular que não dialoga com os agentes do setor e é responsável por um atraso inexplicável relativamente à entrada do 5G em Portugal.

O segundo problema da Nação é a sua enorme dívida. Só a dívida pública atinge o valor de 274,8 mil milhões de euros, o que significa cerca de 27 mil euros a cada português. O montante da dívida do setor privado não financeiro é de 403,3 mil milhões. São montantes astronómicos, que muito irão condicionar a Nação nas próximas décadas. Apesar da gravidade do problema, há boas notícias no sentido da pressão, pelo menos não vir a aumentar nos tempos mais próximos, dadas as decisões anunciadas pelo Banco Central Europeu e da possibilidade de vir a existir uma visão menos ortodoxa, por parte da União Europeia, na interpretação do Pacto de Estabilidade. 

O terceiro problema da Nação é a pobreza. Mais de 2 milhões de portugueses são pobres. Vivem com menos de 540 euros mensais. A maior parte dos pobres não o são por não terem emprego ou por dependerem de apoios sociais que menorizem a ausência de salário. A maioria dos pobres em Portugal trabalha. E entre os que trabalham, a maior parte tem vínculos laborais sem termo e aufere, pelo menos, o salário mínimo. São pobres porque auferem salários baixos ou têm empregos precários. 33% dos pobres são trabalhadores, 26,6% são precários e só 13% são desempregados.

Quanto às desigualdades de rendimento atente-se no valor da taxa de intensidade da pobreza, que mede quão distante está o rendimento das pessoas mais pobres do valor fixado para o limiar da pobreza. Em Portugal essa taxa é de 24,4%, o que significa que a média do rendimento mensal dos mais pobres anda à volta de 408 euros.

Portugal é o quarto país da União Europeia com maior desigualdade salarial. Mas, mais grave, é verificarmos que essa tendência não tem parado de crescer, como não tem parado de crescer o número de trabalhadores que auferem o salário mínimo. Com este ritmo, a Nação está a assistir ao progressivo depauperamento da classe média. E uma Nação sem uma classe média pujante não poderá almejar a ser desenvolvida. Limitar-se á a gerir a miséria. 

Seguramente que a Nação continuará pobre, mas não me conformo que, pelo menos, não que haja a esperança de se inverter a tendência. Ser parte da União Europeia continuará a ser bom, mas não chega. Para cada um dos quatro problemas identificados são necessárias reformas, algumas muito difíceis de ser levadas a bom termo, como é o caso da reforma das instituições públicas, mas em todas elas deve convergir um objetivo maior partilhado por todos, qual seja aumentar a competitividade da economia, exportar mais e pagar melhores salários, única forma sustentável de combater a pobreza e as desigualdades. Neste enquadramento faz todo o sentido, por exemplo, reduzir o IRC para 15%, o que equivale a uma perda de receita fiscal de cerca de 1,4 mil milhões de euros, equivalente a 0,72% do PIB e O,53% da dívida pública. É o caso típico do défice virtuoso e de uma visão de longo prazo.

Outra medida seria o envolvimento ativo de empresários na gestão do PPR e do Portugal 20/30. Especialmente nos setores de bens transacionáveis, seria muito positivo a constituição de equipas compostas por representantes do setor privado e representantes do Estado para analisar e decidir sobre propostas de investimento e de reestruturação. 

 

Data de introdução: 2021-08-12



















editorial

TRATOS E ABUSOS

Todos ficámos abalados com os relatos de abusos sexuais praticados por agentes pastorais. São dilacerantes, são muitos os abusadores e são muitas as vítimas.

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Proteção de Crianças, Jovens e Pessoas Vulneráveis
Os abusos sexuais de crianças na Igreja Católica têm sido uns dos assuntos mais marcantes da agenda mediática do nosso país. Nunca os erros de alguém podem ser...

opinião

JOSÉ A. SILVA PENEDA

O significado de alguns dados do último recenseamento
Em cada dez anos o Instituto Nacional de Estatística responsabiliza-se por proceder à elaboração do Recenseamento Geral da População e do Recenseamento Geral da...