A COP 27 terminou em Sharm-el-Sheik, no Egipto, e, a avaliar por algumas reações, nos meios ecologistas e no espaço mediático, terá sido um fracasso.
Os que ficaram desapontados, aparentemente, esperariam uma declaração final com apelos dramáticos à descarbonização, a fixação de metas mais exigentes em matéria de redução de emissões de gases de estufa e, finalmente, esse elusivo Santo Graal, compromissos claros de banimento do uso de combustíveis fósseis.
Não partilho destes pontos de vista derrotistas.
As grandes declarações, os compromissos solenes têm, com certeza, a sua importância. Contudo, pergunto-me se é assim tão importante proclamar novas e mais exigentes metas, renovados e mais apertados compromissos quando, mesmo aqueles que já foram o objeto de consenso em cimeiras anteriores estão longe de ser cumpridos.
Creio que esta cimeira mostrou que existe uma enorme dissonância entre o pragmatismo dos que querem e podem “fazer coisas reais” no “mundo real” e os que querem transformar a transição climática numa festa contínua de proclamações grandiloquentes, mas sem qualquer conteúdo prático.
Pela minha parte vejo progressos e progressos importantes naquilo que conta, ou seja, em programas efetivos de transformação que podem, a prazo, mudar o atual estado de coisas.
Desde logo, a constituição de um fundo alimentado pelas economias ricas para ajudar os países mais pobres a lidar com as consequências das alterações climáticas é um passo gigante.
Claro que os países ricos, com os Estados Unidos à cabeça, embora estejam dispostos a ajudar financeiramente as economias mais frágeis, não aceitam qualquer responsabilidade legal pelas consequências da poluição térmica que promovem desde meados do século XIX e que nos trouxe à situação de emergência que estamos a viver. Só nesse quadro de exclusão de qualquer responsabilidade legal o fundo pôde ser constituído.
Mas seria realista esperar um desfecho diferente? Não creio!
Antes da COP 27 foi anunciado um programa colossal para a descarbonização progressiva da Indonésia na sequência, aliás, de um programa similar para a África do Sul.
A África do Sul e a Indonésia são duas economias emergentes que estão entre os dez maiores consumidores de carvão do mundo e que têm sistemas electroprodutores muito dependentes do carvão, o mais sujo dos combustíveis fósseis.
Os países ricos, com Estados Unidos e Japão na liderança, comprometeram 20 biliões de dólares para ajudar a Indonésia a libertar-se do fardo do carvão. O objetivo é limitar as emissões da Indonésia a 290 megatoneladas de CO2 por ano em 2030 e habilitar o país a produzir, por essa altura, um terço da sua energia através de fontes renováveis.
Não se trata aqui de pura assistência internacional. Metade do programa indonésio será financiado pelo setor privado, obviamente na base de projetos comercialmente rentáveis o que aumenta a probabilidade de cumprimento das metas.
Um olhar sobre a China mostra-nos como, no mundo real, as coisas estão a mover-se na direção certa.
A cimeira da COP 27 trouxe-nos uma novidade importante, a saber, o degelo nas relações entre os Estados Unidos e a China e o compromisso dos dois países, não obstante a rivalidade geoestratégica, de colaboração em matéria de descarbonização do planeta.
E como isso é importante!
A China é o maior emissor de CO2 do mundo com cerca de 30% do total a nível planetário. As emissões chinesas são similares ao total agregado dos Estados Unidos, Índia, Rússia e Japão que são os restantes países do top 5 mundial de emissores.
É uma trivialidade dizer que nada se fará de significativo nesta área sem ter a China a bordo.
Podemos não gostar da atitude da China que coloca os seus interesses nacionais acima dos putativos compromissos internacionais em matéria de emergência climática.
Contudo, se alguém está a fazer o seu papel neste domínio é a China.
Desde 2020 que a China acrescenta à sua capacidade produtiva de fontes renováveis quase tanto como o resto do mundo combinado. Mais de metade das novas capacidades mundiais do solar fotovoltaico são construídas na China. A China domina de forma esmagadora cadeia de valor na produção de baterias de lítio que são fundamentais na descarbonização dos transportes.
Apetece dizer que enquanto outros falam, a China vai fazendo…
Mas sejamos realistas. Mais do que proclamações grandiosas e não obstante os passos concretos que, apesar de tudo, estão a ser dados, é da evolução tecnológica e da capacidade do setor privado para a explorar de uma forma comercialmente viável, que dependemos para salvar o planeta.
Podemos considerar três tipos de tecnologias: 1.0 - as que já estão em pleno uso comercial (solar fotovoltaico, geração eólica, etc.), 2.0 - as que já são conhecidas, mas ainda não chegaram à fase de produção em larga escala economicamente viável (baterias de estado sólido, hidrogénio, etc.) e 3.0 - as que ainda precisam de desenvolvimento científico ou tecnológico significativo e que se colocam num horizonte mais distante (fusão nuclear, remoção de CO2 da atmosfera, etc.).
As tecnologias 1.0 vão continuar a fazer o seu caminho por uma razão muito simples – é atualmente mais eficiente produzir solar fotovoltaico do que produzir energia com o mais barato dos combustíveis fósseis. A lógica é agora económica e, como tal, imparável.
Em relação às tecnologias 2.0 podemos ter alguma esperança na medida em que o setor privado começa a interessar-se e a pôr dinheiro significativo nesta área.
O hidrogénio verde é, talvez, o exemplo mais claro desta tendência.
Na Suécia, por exemplo, produz-se aço com base em hidrogénio verde em iniciativas privadas com objetivos comerciais. Recentemente a Volvo anunciou que, em 2030, poderá usar exclusivamente aço produzido sem utilização de carvão ou outras fontes fósseis.
Os projetos na área do hidrogénio verde multiplicam-se, seja em iniciativas puramente privadas seja em parcerias de fundos públicos com capital privado. Mesmo tratando-se de uma tecnologia que precisa de desenvolvimento – ainda é muito caro produzir hidrogénio com base em eletrólise da água – o interesse dos privados e a perspetiva de exploração comercial dá alguma garantia de sustentabilidade deste caminho.
Mesmo tecnologias 3.0 começam a atrair capital privado. Até julho deste ano, projetos na área da fusão nuclear atraíram 5 biliões de dólares de financiamento privado.
Nem tudo vai correr bem. Muito do dinheiro público e privado que está a ser colocado em start-ups nestas áreas de vanguarda será, com certeza, perdido. Contudo, como sempre, um punhado de vencedores ficará para explorar com sucesso o que a tecnologia tornou viável.
Do que não precisamos é de manifestações pelo clima como as que os nossos estudantes promoveram durante a CPO 27. Quando instados pelo atual ministro da economia a apresentar as reivindicações ou propostas do movimento, não tinham uma única linha de texto para apresentar. Aparentemente, a única coisa que os mobilizava era a festança em que tudo aquilo se transformou e a exigência da demissão do ministro. Patético!
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