CENTRO SAGRADA FAMÍLIA, OEIRAS

A Creche Feliz está a ser muito prejudicial para a sustentabilidade da instituição

Com uma missão, essencialmente, dedicada à educação, a congregação tinha como ponto principal e inicial o Colégio do Bom Sucesso, em Lisboa.
“Há 33 anos, as Irmãs criaram a Fundação Obra Social das Religiosas Dominicanas Irlandesas, a que desejam associar, não só o projeto educativo, mas principalmente arrancar com um projeto mais social e transformam um colégio, mais ou menos, privado em IPSS”, começa por contar João sales Luís, presidente da Fundação, recordando ainda “a fundadora Irmã Inês, Sister Agnes, que aos 70 anos liderou todo este projeto da vinda para Algés e de pôr esta obra em marcha”.
Inicialmente, quando o Centro sagrada Família foi criado, haviam apenas uns barracões.
“Isto foi construído em 1991, através do PIC Algés, um Programa de Intervenção Comunitário, e esteve entregue à paróquia de Algés, que não conseguiu levar o projeto avante. Então, é quando as irmãs são desafiadas a pegar neste projeto. Havia os pré-fabricados e não havia portões”, refere Teresa Peraboa, diretora-executiva da instituição, a par de Carla Correia.
“O Centro começa numa situação muito fragilizada, porque aqui à volta existiam bairros muito pobres”, sublinha João Sales Luís, com Teresa Peraboa a lembrar algumas situações da altura: “Conta as mais antigas na casa que, ao final do dia, as funcionárias tinham de levar as crianças aos bairros, porque alguns pais não os vinham buscar e havia aqui uma sala em que as irmãs ensinavam coisas muito básicas das lides domésticas à comunidade cigana. Era a Sala Aberta da altura com outra finalidade”.
“O Centro foi crescendo com o trabalho das Irmãs, que saíram em 2016, com esta última obra do PARES terminada e que nos permitiu aumentar a capacidade de creche, que era de 66 para 109 crianças. Isto sempre com o apoio da autarquia de Oeiras, que cedeu este terreno e também a Quinta de Santa Marta, que é contígua a este espaço, e nos permite desenvolver ali o Pré-escolar”, conta Carla Correia.
Nos dias que correm, a instituição acolhe 109 bebés em creche e 99 crianças no Pré-escolar, desenvolvendo, depois, todo um vasto trabalho de apoio à comunidade, o denominado projeto Famílias com Alma.
Assim, o apoio comunitário é feito através de uma mercearia social e de uma cantina social, na vertente alimentar, com a instituição a apoiar cerca de 120 pessoas.
“Nada disto é protocolado com o Estado e temos apenas o apoio do Banco Alimentar”, ressalva Teresa Peraboa.
Ainda nesta vertente do apoio à comunidade, a instituição tem uma loja social, promove a Academia Sénior, frequentada por 42 idosos, e a Sala Aberta.
“A Sala Aberta surgiu em 2012, depois integrámos um consórcio com outras entidades em que o objetivo era que nesses grupos, os Grupos Aprender, Brincar e Crescer, viessem crianças que não estivessem em contexto escolar e que viessem com os seus pais. Esta é a essência, que passava muito, na altura, por apoiar imigrantes, mas crianças que não estivessem em contexto escolar”, explica Carla Correia, acrescentando: “Atualmente, a Sala Aberta é frequentada por 10 crianças e seus cuidadores, duas vezes por semana, para atividades mais ao ar livre com o apoio de duas facilitadoras do brincar”.
Outra forma que a instituição encontrou para intervir na comunidade foi através do Café com Princípio, uma espécie de “formação informal”, que pretende “não só capacitar, mas incluir pessoas isoladas”.
“O objetivo é trazer as pessoas que estamos a apoiar, mas também está aberto à comunidade. Por um lado, dirige-se a pessoas que estejam à procura de emprego, capacitando-as nesse sentido, mas também que estejam isoladas. Assim, pretendemos responder aos dois eixos do programa, capacitação e inclusão. Atualmente, acontece às segundas-feiras, de 15 em 15 dias, com diversos temas, seja de desenvolvimento pessoal ou emprego, literacia financeira e outros”, afirma Carla Correia.
Um outro eixo de ação do Centro é a Formação Profissional.
“Fazemos muita formação em áreas em que nós também sentimos necessidades, como crianças e jovens, primeiros socorros pediátricos, desenvolvimento pessoal. Acreditamos que a parte mais interior da pessoa condiciona muito o trabalho, pelo que a formação é menor em horas de formação, mas vai correspondendo mais às necessidades da comunidade, quer seja das famílias do projeto social, dos pais, dos colaboradores quer seja dos colaboradores de entidades externas”, explica Teresa Peraboa, acrescentando que, em 2024, frequentaram as formações 100 pessoas.
Já por altura da celebração do 30º aniversário da instituição, em 2023, surgiu a ideia de fazer um Ciclo de Palestras.
“O objetivo é trazer pessoas para ouvir falar de temas que dizem respeito à comunidade, trazer pessoas do terceiro sector e também do sector empresarial, apelando à responsabilidade social das empresas”, acrescenta Teresa Peraboa.
Todo este trabalho junto da comunidade tem um feedback positivo.
“Sentimos que somos reconhecidos. Até há pouco nem site tínhamos, porque não precisávamos. Tivemos sempre lista de espera, porque sempre houve muito boca a boca. O caminho que fomos fazendo tem sido executar a missão e continuar a fazer o que as irmãs nos ensinaram, que é voltarmo-nos sempre para fora, não olharmos só para nós, mas para o que está à nossa volta e tentarmos corresponder a isso”, sustenta Teresa Peraboa, exemplificando: “O que aconteceu com os idosos foi isso mesmo, apercebemo-nos que havia uma necessidade, porque os avós vinham buscar os netos e ficavam ali fora ao portão à espera. Então, pensámos: E se os trouxéssemos cá para dentro e fizéssemos alguma coisa com eles? Começou assim e, depois, surgiu a parceria com a Academia Sénior. As coisas vão surgindo perante o olhar crítico sobre a comunidade envolvente. A Sala Aberta também foi assim, surge como uma resposta à lista de espera”.
Por seu turno, Carla Correia defende que “a relação com a comunidade é uma relação de proximidade e de valor”.
E esta relação e reconhecimento fica patente no tradicional arraial que a instituição promove anualmente.
“O arraial é uma grande festa no final do ano letivo, que tem um fim solidário para o projeto Famílias com Alma, é um momento em que os ex-alunos e os pais vêm e em que já juntámos aqui mais de mil pessoas. E ainda promovemos a Corrida Solidária, que também movimenta essa família do Centro Sagrada Família”, sublinha Teresa Peraboa.
No que concerne às respostas à infância, os responsáveis pelo Centro mostram-se desagradados com o que se tem passado com a Creche Feliz, afirmando que “a instituição tem sido muito prejudicada”.
“Há cerca de três anos criou-se a Creche Feliz a que nós aderimos totalmente e, inclusivamente, estamos em processo de crescimento, através do PRR, para aumentarmos a capacidade. Na altura fez-se um estudo para que as instituições ganhassem um bocadinho. O custo por aluno foi definido nos 450 euros e o valor a pagar pela Segurança Social era de 476 euros. Porém, isto foi há mais de três anos e, desde então até agora, foi feito um aumento de cerca de 3%. Neste momento, o custo médio anda entre os 560 e os 580 euros. Todas as estruturas estão com um custo médio da ordem dos 500 e muitos euros e estão a receber pouco mais do que os 476 euros iniciais”, lamenta João Sales Luís, frisando: “Neste momento, a resposta é completamente deficitária e aquilo que defendemos é a mudança da legislação ou que seja permitido os pais continuarem a pagar uma parte. Tem de haver alguma brecha para que os pais possam contribuir com algo. Não queremos ganhar dinheiro, queremos é sustentabilidade”.
E por esta experiência, o presidente da instituição afirma ser “impossível” estender a gratuitidade ao Pré-escolar, por isso: “Vamos fazer barulho, porque não funciona. Tem de haver um duplo financiamento, porque a experiência da Creche Feliz é o que nos mostra”.
Com a resposta deficitária, o equilíbrio financeiro é um exercício muito exigente.
“A Fundação tem mais do que este Centro e as Irmãs deixaram uma reserva financeira, mas não há dúvida que aqui estamos constantemente a promover ações de angariação de fundos, com muito eventos e parcerias, porque precisamos. O Centro Sagrada Família tem tido sempre um pouco de prejuízo, mas em termos globais da Fundação, no ano passado houve um pequeno prejuízo, mas este ano, penso, já estaremos equilibrados. Em termos globais, temos uma sustentabilidade razoável, mas preocupante, no sentido que é preciso resolver o problema da Creche Feliz. Neste momento, no Pré-escolar estamos mais sustentados do que na Creche. É melhor não mexer no Pré-escolar e resolver, primeiro, a Creche Feliz”, advoga João Sales Luís, deixando uma sugestão: “O ideal era ter uma dotação certinha e mais alta da Segurança Social, mas haver a liberdade para os pais pagarem algo, obviamente, menos do que pagavam dantes”.
“Aliás, isso é o que o privado acaba por fazer. Parece que estamos a jogar ao mesmo jogo, mas com regras diferentes”, lamenta Carla Correia.
Apesar destes percalços, o Centro Sagrada Família está prestes a iniciar um projeto de alargamento da resposta de creche e melhorar a eficiência energética, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), no valor de cerca de 300.000 euros.
“Fizemos uma candidatura ao Aviso nº 4, para Alargamento das Respostas Sociais, para criarmos mais duas salas de creche e para melhorarmos a eficiência energética da instituição, através da colocação de painéis fotovoltaicos. Vamos renovar uma sala que atualmente é um espaço polivalente e os painéis solares vão cobrir toda a instituição”, explica Carla Correia, com o presidente da Fundação a acrescentar: “Foi uma luta, foi muito, muito difícil. Por um lado, foi a burocracia e todas as complicações no processo de candidatura e, depois, a expectativa criada, ou seja, vamos colocar mais 28 crianças na instituição, mas a Segurança Social vai pagar abaixo do custo médio. Tive que explicar tudo muito bem no Conselho de Administração da Fundação, mas sempre defendi que esse problema vai ser resolvido, não sabemos é quando. Depois, fizemos uma primeira consulta ao mercado, mas ficou deserta e, entretanto, já selecionámos um candidato e, provavelmente, em março ou abril arrancamos com a obra, que tem de estar pronta, sem falta, até ao final do ano”.
No seio da instituição é realizado ainda um trabalho espiritual.
“No fundo, propomo-nos a olhar para nós e para a instituição, para sermos melhores e apoiarmos de forma global as pessoas que nos rodeiam. São reflexões semanais, vem quem quer e falamos de Deus e da nossa missão com a equipa. Cuidar dos que estão cá dentro para melhor cuidarem dos que estão à nossa volta”, argumenta Teresa Peraboa, acrescentando: “Por outro lado, reunimos a equipa toda para uma reflexão no sentido de elaborarmos o Plano Estratégico, envolvendo, assim, toda a gente, promovendo a sua participação no rumo da instituição. E todos os anos há uma ida de toda a gente a Fátima”.
E como seria Algés sem o Centro Sagrada Família?
“Continuava a ter falta de sítios para as crianças ficarem, haveria mais pessoas a precisar de apoio e ia ficar mais vazio, porque haveria menos participação”.

Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)

 

Data de introdução: 2025-02-06



















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