1. Cerca de cinquenta mil idosos vivem em oitocentos lares de Instituições de Solidariedade, cinco vezes mais do que aqueles que estão em lares lucrativos ou do Estado (Segurança Social). Entretanto, pelo menos cerca de treze mil esperam por uma vaga.
Segundo um estudo encomendado pela CNIS, os custos médios da frequência nos lares de idosos, no final de 2006, oscilavam entre os 691,84 € (idosos autónomos) e os 886,28 € (idosos dependentes), comparticipando o Estado, então, com 320,32 € e 487,34 €, para a primeira e segunda situação, respectivamente.
A comparticipação devida pelo utente de lar é de 70% sobre o seu rendimento, podendo ser elevada até 85% do rendimento nas situações em que os idosos dependentes não possam praticar com autonomia os actos indispensáveis à satisfação das necessidades humanas básicas ou em que necessitem de cuidados específicos de recuperação de saúde com carácter permanente.
2. Nos últimos anos tem-se assistido a um processo de duplo envelhecimento das populações (na base e no topo) devido à diminuição do peso relativo da categoria dos jovens (0 – 14 anos) e ao aumento do peso relativo dos idosos (65 e mais anos) na estrutura etária nos países da Comunidade Europeia. Categorias como os “grandes idosos” e a “quarta idade” começam a tornar-se comuns.
No que diz respeito aos indicadores de envelhecimento e de dependência, Portugal tem vindo a aproximar-se da média europeia, e apresenta uma estrutura demográfica tendencialmente mais envelhecida do que a média dos países da União Europeia.
A filosofia actual procura diversificar o tipo de respostas sociais, ajustando-as, na medida do possível, às necessidades da população alvo, privilegiando a manutenção da pessoa idosa na sua residência habitual, ainda que com suporte de serviços como Centros de Dia, Serviços de Apoio Domiciliário, Centros de Convívio, ou outros adequados.
Nesse enquadramento, os Lares para Idosos, que têm a sua origem histórica nos Asilos, surgem como uma alternativa especialmente dirigida aos idosos em situação de maior risco de perda de independência e/ou autonomia, ou que já não a possuam.
Segundo esta óptica, os objectivos específicos dos Lares são:
- Assegurar as necessidades básicas dos idosos;
- Contribuir para a estabilização ou retardamento do processo de envelhecimento;
- Criar condições que permitam preservar e incentivar as relações familiares;
- Facultar habitação de forma a garantir ao idoso uma vida confortável e um ambiente calmo e humanizado;
- Favorecer condições que permitam vencer o isolamento;
- Proporcionar serviços permanentes e adequados à problemática biopsicossocial.
O fenómeno do envelhecimento progressivo e irreversível da população portuguesa, associado a outras situações como desertificação de significativas áreas, mobilidade e progressiva desresponsabilização familiar, indica uma conclusão sem recuo: a tendência é a de o Lar de Idosos ser a última residência para um número que cresce inflexivelmente com o avanço dos tempos.
3. São pródigas as notícias sobre idosos em Lares: do Estado, do sector lucrativo e das Instituições de Solidariedade. Da sua leitura sobressai uma constatação: sendo em muito maior número os Lares não-lucrativos, eles são muito menos notícia que todos os outros, o que, sabendo-se o que normalmente constitui notícia, não deixa de ser mais um sinal muito positivo para o mundo da solidariedade. E, de facto, havendo entre nós espaço para os lares lucrativos, muitos dos quais são muitíssimo bons e sustentam a maior confiança, os das Instituições de Solidariedade merecem nota muito alta, pela sua qualidade de equipamentos, de recursos humanos e de serviços.
Ultimamente surgiu uma notícia sobre donativos como moeda de troca para obtenção de vagas em Lares.
Talvez porque em causa estava um Lar de uma Instituição de Solidariedade, portanto, não-lucrativo, a sentença pairou célere: “é ilegal e constitui crime”. Maior resguardo parece haver quando as notícias são sobre lares lucrativos ou públicos, muito mais generosos em situações de duvidosa bondade.
Admitindo que um donativo como moeda de troca para uma vaga possa não ser uma boa prática, também não é uma prática comum entre as Instituições de Solidariedade. Provavelmente, porém, quando acontece, poderá surgir como um recurso para enfrentar a sustentabilidade da Instituição.
Não estando os lares das Instituições de Solidariedade vedados a pessoas com bons rendimentos, a grande maioria dos seus utentes têm muito baixos rendimentos, razão pela qual as suas comparticipações, indexadas aos seus rendimentos, são muito baixas. E as comparticipações do Estado, em média, representam apenas 46,3% dos custos técnicos mensais. Somadas as comparticipações dos utentes às da Segurança Social, muitas vezes, as duas são insuficientes.
Se um donativo para uma vaga não é uma boa prática, já o é e deve ser acarinhado quando o utente ou a sua família, em sinal de gratidão e de solidariedade, faz um donativo para assegurar a sustentabilidade e o futuro das Instituições que são erguidas e suportadas por voluntários no exercício de cidadania ou movidos por impulsos da caridade. É um donativo solidário e voluntário, prática muito mais nobre do que a prática do envolvimento coercivo de todos os familiares para negar o complemento solidário a idosos.
Também uma boa prática a cultivar pelo Estado seria a de ser tão célere na assunção das suas obrigações para com as Instituições de Solidariedade como o é na nas sentenças com que, por vezes, as contempla.
* Presidente da CNIS
Data de introdução: 2008-05-06