Todos os anos surgem 1.500 novos casos de cancros orais em Portugal. No Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa, os médicos dentistas deparam-se diariamente com doentes em estado muito avançado. Muitos acabam por falecer passado pouco tempo. "A maior parte dos doentes que nos chegam às mãos já se apresenta em estágios localmente muito avançados", lamenta Daniel de Sousa, responsável pelo Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do IPO de Lisboa. Resultado: "uma boa parte dos doentes, ao fim de um ano ou ano e tal, acaba por falecer", desabafa.
O perfil psicossocial destas pessoas pode explicar o fenómeno. "Muitas vezes subestimam e ignoram de uma forma incompreensível a situação que têm. São doentes que não ligam a não ser quando alguém lhes chama atenção para uma ferida na língua ou na boca ou um sangramento anormal", explica o cirurgião.
No entanto, para Daniel de Sousa, a situação poderia ser bem menos dramática se existisse uma rede de cuidados primários de saúde com médicos dentistas, o que iria permitir a detecção precoce de lesões.
A história de Guilherme Magalhães comprova a importância de uma detecção precoce. O engenheiro marcou uma consulta num consultório particular para realizar uma simples higiene oral, quando o médico dentista detectou uma alteração.
Os resultados comprovaram o seu pior receio: Guilherme tinha um cancro oral. No entanto, como se encontrava numa fase muito inicial, o paciente não teve de ser sujeito a radioterapia ou quimioterapia, apenas realizou a cirurgia para remoção das células cancerígenas. "A rede de cuidados primários com médicos dentistas é fundamental e já devia ter sido feita há imensos anos", crítica Daniel de Sousa, lamentando a sua inexistência, que faz com que muitos dos pacientes que chegam ao IPO tenham sido poucas vezes acompanhados por médicos dentistas.
No entanto, o cirurgião do IPO desmistifica a ideia de que esta é uma doença com mais incidência na população desfavorecida: "já operei doentes de todos os estratos sociais, desde professores universitários até trabalhadores rurais".
Certo é que a doença atinge maioritariamente o sexo masculino, devido ao consumo excessivo de álcool e tabaco. "Temos a nível nacional cerca de 1.500 casos novos de cancro oral por ano: 1.200 são homens e 300 são mulheres", concretiza.
Sobre as listas de espera no IPO de Lisboa, Daniel de Sousa garante que no último ano foi feito um "esforço titânico" por parte da equipa e hoje os doentes com situações mais complicadas esperam apenas cerca de duas a três semanas para serem operados.
Num ranking dos cancros com mais prevalência em Portugal, "o cancro oral surge em quinto lugar", o que é, na opinião do médico, "um lugar temível".
Data de introdução: 2011-02-04