Tudo começou no ido ano de 1980, com a constatação da falta de respostas sociais na área da infância. Maria José Fonseca, mentora e grande obreira do CASCI – Centro de Acção Social do Concelho de Ílhavo, que antes já trabalhara numa outra IPSS ilhavense, deitou mãos à obra e criou um jardim-de-infância na Praia da Barra, lugar da freguesia da Gafanha da Nazaré. A partir daí, a obra não mais parou de crescer, alargando a sua acção às diversas áreas em que a sua fundadora identificava carências a nível concelhio. Por isso, da Infância à Terceira Idade, da Deficiência à Formação Profissional, o CASCI, mais de três décadas depois da fundação, oferece respostas em todas as áreas tipificadas, constituindo-se mesmo como uma referência nacional em muitas delas.
Se foi através do apoio à infância que tudo começou, hoje as áreas da Deficiência e da Terceira Idade são as que ganham mais espaço na instituição, até porque são aquelas que o concelho é mais carenciado.
“O CASCI está a trilhar um caminho em que, não descurando a área da infância, que é muito importante para a instituição, notamos que a nossa missão e maior apetência é para a área da Deficiência e da Terceira Idade, mais até para a área da Deficiência”, defende a directora-geral Mafalda Cunha, explicando: “As respostas são insuficientes para as solicitações que temos. O CASCI é tutor de muitos meninos que não têm nenhuma rectaguarda familiar. Há imensos casos desses no concelho, pelo que a Deficiência é um sério candidato a ser a preferência do CASCI… Já o é, mas poderá sê-lo de uma forma mais vincada”.
Dispersa por seis centros, onde funcionam diversas e diferentes respostas sociais, o CASCI tem no Centro de Reabilitação Profissional da Colónia Agrícola, em Ílhavo, aquele que será o seu caso de maior sucesso.
Ali funcionam um centro de Formação Profissional e um outro de Emprego Protegido, um dos nove existentes no País, nas áreas da costura e lavandaria, carpintaria e marcenaria e ainda agro-pecuária.
Neste centro de Emprego Protegido, quatro dezenas de colaboradores/utentes desenvolvem actividades cuja produção é, posteriormente, vendida, contribuindo de forma decisiva para a sustentabilidade da instituição.
A produção de produtos hortícolas é, aliás, o grande motor do centro, pois, para além de fornecer a instituição-mãe – que serve cerca de mil refeições diárias –, conta ainda como clientes a Santa Casa da Misericórdia de Vagos, a Casa do Professor e duas valências da IPSS vizinha Património dos Pobres, nomeadamente, o Lar de S. José e o infantário do Centro Paroquial de Ílhavo, e ainda uma vasta série de clientes directos que diariamente ali se abastecem de legumes frescos.
A venda dos produtos hortícolas, mas também dos trabalhos de marcenaria e de costura contribuiu para o equilíbrio das contas da instituição que gostaria de alargá-la a outros produtos que ali são produzidos, mas para o que tarda a autorização estatal.
“Gostaríamos de abrir duas novas áreas no Emprego Protegido, que são a olaria e a doçaria, duas áreas que estão projectadas e aprovadas e que, há seis meses, carecem de uma assinatura do IEFP em Lisboa”, lamenta Mafalda Cunha, que recorda que as 40 pessoas que frequentam, para já, o Emprego Protegido são “funcionários/clientes, pois são colaboradores que se regem pelo mesmo código laboral que qualquer outro dos trabalhadores da instituição, mas são simultaneamente clientes”.
TEMPORAL PÁRA PRODUÇÃO
Mas a desgraça bateu recentemente à porta deste Centro… O temporal do passado dia 19 de Janeiro que se abateu sobre Portugal não deixou de castigar o CASCI e, no seu Centro da Colónia Agrícola, cinco das oito estufas ficaram por terra, sendo que as culturas ficaram igualmente perdidas.
As cinco estufas mais afectadas estão perdidas, sendo avaliado o prejuízo em cerca de 30 mil euros, mas incontabilizáveis, para já, são as perdas a nível das culturas que estavam no seu interior e que se perderam totalmente, estando agora a instituição impossibilitada de cumprir os compromissos assumidos com os referidos clientes.
No sentido de recuperar o mais rapidamente possível desta situação, o CASCI criou uma conta solidária (CGD – 0035 0372 00014997430 71) na qual espera contar com a solidariedade de todos.
Para além disto, a instituição já se candidatou aos apoios do Ministério da Agricultura, Pescas e Ordenamento do Território, no sentido de rapidamente recuperar a capacidade de produção perdida.
No Centro da Colónia Agrícola, a instituição dá ainda formação profissional a 46 utentes, sendo que no seu interior funcionam umas pequenas quintas arrendadas a moradores do concelho, que ali desenvolvem o seu gosto pela agricultura.
UM POLVO DE ACÇÃO SOCIAL
Desde a criação da pequena estrutura de apoio à infância na Praia da Barra, o CASCI foi-se desenvolvendo de forma tentacular e hoje, 33 anos volvidos, é um autêntico polvo de respostas sociais, a funcionar em diversos locais de Ílhavo e que dissemina a sua acção por todo o território do concelho, empregando 230 pessoas.
Na Praia da Barra o jardim-de-infância continua a funcionar – agora já não nuns barracões sem uso após a construção do paredão, infra-estrutura de protecção do aglomerado urbano e da entrada do Porto de Aveiro, mas numas instalações construídas de raiz –, e acolhe 43 crianças em creche e mais 66 em pré-escolar. Na vizinha, praia da Costa Nova, existe um infantário, que recebe e cuida 35 petizes em creche e ainda 50 em pré-escolar, e dois CAO – Centro de Actividades Ocupacionais, para um total de 40 utentes.
Na cidade de Ílhavo, no edifício-mãe, que alberga ainda a sede da instituição e a partir de onde, na verdade, o CASCI tomou a forma e a dimensão que tem hoje, funciona outra estrutura para a infância, com 68 crianças em pré-escolar. Refira-se que aquando da decisão de encerrar o ATL, o CASCI “mandou embora 200 clientes”, recorda a directora-geral. Na sede funciona ainda a unidade de Ensino Especial, com 12 utentes.
Ainda na cidade, o CASCI tem mais dois equipamentos: um alberga a ERI 1 - Estrutura Residencial de Idosos (53 utentes), o Lar Residencial (32 utentes com deficiência) e um CAO para 10 utentes.
No outro espaço, denominado Ílhavo Social, funcionam a ERI 2, com 28 utentes, em que cerca de metade sofre de demência, uma creche, que cuida 49 bebés, e ainda o Centro Comunitário de Acção Social, que presta apoio de toda a espécie a mais de 300 famílias, das freguesias de S. Salvador (Ílhavo) e Gafanha da Encarnação, e onde, desde Maio de 2011, funciona a Cantina Social criada no âmbito do Programa de Emergência Alimentar. No dia em que o SOLIDARIEDADE esteve no CASCI, os seus dirigentes assinaram um protocolo com a Segurança Social para passarem de 65 refeições diárias para 100, num reforço que a responsável pela instituição disse ser urgente.
“Vendo o aumento de famílias que chegavam ao nosso Centro Comunitário, com necessidades a nível de alimentação, e como não as podíamos integrar todas nos programas que tinham acesso, o CASCI propôs candidatar-se à Cantina Social. Esta abrange o todo concelho de Ílhavo e os utentes são-nos enviados pelas outras instituições do concelho, portanto, uma resposta que funciona verdadeiramente com base numa rede social. Este é o protótipo do que é uma resposta social a trabalhar em rede”, refere com satisfação Mafalda Cunha, que assinala ainda que, apesar do preço limite de 1 euro por refeição, “cerca de 50% das famílias não paga nada”.
O aumento para a centena de refeições diárias deveu-se ao conhecimento de “que já há listas de espera”.
“Já informámos as outras instituições parceiras do CLAS (Conselho Local de Acção Social) que vamos aumentar as refeições e que, portanto, nos façam chegar as pessoas”, revela a dirigente.
REORGANIZAÇÃO INTERNA
“A história do CASCI não pode ser nunca dissociada do nome da doutora Maria José Fonseca, porque foi ela que deu alma, construiu tudo isto e tentou tornar isto o melhor possível. Depois com o desaparecimento dela, houve aqui uma fase complicada, porque esta casa tinha uma gestão muito centralizada na Dra. Maria José e criou-se uma espécie de vazio”, conta Mafalda Cunha, prosseguindo: “Nessa altura, teve que haver uma série de reformas no interior da própria instituição, o repensar formas de trabalhar, de serviços prestados, todo um trabalho para torná-la sustentável. E também o virarmo-nos um bocadinho para o exterior, pois éramos uma organização muito fechada”.
Se a desagregação chegou a pairar, o tempo mostrou que a instituição estava assente em bases sólidas e que necessitava apenas de se reorganizar.
“A sustentabilidade é uma questão que nos preocupa a todos e que está sempre em cima da mesa, mas o CASCI, e ainda bem que optou por esse caminho, já encetou uma racionalização dos serviços e dos custos”, revela a directora-geral, exemplificando: “O CASCI tinha uma cozinha por cada pólo, imagine-se só o que é isso em custos com pessoal, então, passou a ter duas cozinhas para servir todos os centros. É claro que foi necessário apetrecharmo-nos com meios de transporte, mas feitas as contas é uma poupança significativa”.
Financeiramente, o CASCI vive das comparticipações feitas pela Segurança Social, pelas famílias, pelo IEFP, na formação profissional e no Emprego Protegido, e ainda pelo Ministério da Educação, no Ensino Especial, mas também da venda dos produtos que produz no Centro da Colónia Agrícola.
Para Mafalda Cunha, “apesar de todas as convulsões, o CASCI ainda pode dizer que tem uma situação estável”.
E se o trabalho de reorganização, que passou e passa também pela reconversão de pessoal em detrimento do despedimento, foi exigente, “o CASCI não deixou de olhar para as suas respostas e está a fazer uma grande intervenção na ERI 1”, sustenta, concretizando: “A cozinha era uma grande necessidade, pois perante a concentração das cozinhas tínhamos que criar ali um novo layout. Na ERI 2 estamos a aumentar a capacidade do lar para o que tivemos que fazer algumas obras de adaptação e o alargamento de uma sala de estar. Pensamos poder ainda este ano proceder a alguma intervenção no Centro da Costa Nova. Não queremos estagnar, queremos continuar a melhorar e a preservar o património que temos”.
E o futuro é olhado pela instituição com ambição.
“Há muitos projectos, porque não deixamos de sonhar, agora temos que esperar pela oportunidade”, sustenta Mafalda Cunha.
Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)
Não há inqueritos válidos.