ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA

Irão: as consequências de um “engano”

Nos últimos dois anos, as relações entre os Estados Unidos e o Irão agravaram-se substancialmente. E dizemos nos últimos dois anos, porque, apesar da história recente não ter apagado de todo as tensões que se seguiram ao triunfo da revolução islâmica de 1979, e sobretudo à crise dos reféns que se lhe seguiu, o facto é que os dois mandatos de Barak Obama trouxeram um certo desanuviamento, sobretudo a partir da assinatura do tratado nuclear de 2015.

Depois, foi a vez de Donald Trump chegar à Casa Branca e tudo mudou. O novo presidente alterou as prioridades da política externa do país, numa espécie de revisão de alguns dos grandes princípios implementados pelo seu antecessor, entre os quais se destacavam naturalmente a relações com o regime de Teerão. Neste afã revisionista enquadrava-se, logicamente, mas não só, a denúncia do tratado nuclear com o Irão que tão desejado e tão elogiado fora pela comunidade internacional. A partir daqui e das ameaças americanas de mais sanções contra o seu país, os iranianos refinaram ainda mais o seu antiamericanismo.

É neste cenário que o presidente americano se decide pela eliminação física do comandante das forças de elite iranianas, general Soleimani, numa altura em que este se deslocava por território do Iraque, em missão de apoio aos seus amigos xiitas deste país. Foi um assassinato selectivo que provocou reacções emotivas em todo a comunidade islâmica, e particularmente no Irão. O ódio aos americanos aumentou para níveis aparentemente irrecuperáveis, justificando o receio de que seria impossível qualquer reaproximação entre os dois países.

Inesperadamente, este cenário sofreu uma mudança inimaginável até há pouco. Tudo por causa de um “engano” que levou ao derrube de um avião ucraniano e à morte de mais de cento e setenta passageiros que seguiam a bordo. A tentativa inicial de ilibar os iranianos de qualquer responsabilidade nesta tragédia durou apenas uns dias, porque a verdade acabou por vir rapidamente ao de cima. O lançamento do míssil iraniano que derrubou o avião foi confirmado pelas próprias autoridades de Teerão, o que provocou um autêntico choque emocional no país. Os efeitos políticos e psicológicos deste “engano” não se fizeram esperar, a começar pelos pedidos de demissão de alguns jornalistas que se queixaram de terem sido obrigados a dar a notícia de acordo com a vontade das autoridades de Teerão. E essa vontade era a de que o país fosse ilibado de qualquer responsabilidade no incidente.

E o mais surpreendente aconteceu depois com os iranianos a gritar contra a ditadura religiosa que governa o país e, mais significativo ainda, a evitar pisar a bandeira americana. Parecia que o engano do míssil poderia trazer algumas mudanças nas relações daquele país com os Estados Unidos, mas tudo indica que isso não vai acontecer.         

 

Data de introdução: 2020-03-05



















editorial

O COMPROMISSO DE COOPERAÇÃO: SAÚDE

De acordo com o previsto no Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário, o Ministério da Saúde “garante que os profissionais de saúde dos agrupamentos de centros de saúde asseguram a...

Não há inqueritos válidos.

opinião

EUGÉNIO FONSECA

Imigração e desenvolvimento
As migrações não são um fenómeno novo na história global, assim como na do nosso país, desde os seus primórdios. Nem sequer se trata de uma realidade...

opinião

PAULO PEDROSO, SOCIÓLOGO, EX-MINISTRO DO TRABALHO E SOLIDARIEDADE

Portugal está sem Estratégia para a Integração da Comunidade Cigana
No mês de junho Portugal foi visitado por uma delegação da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância do Conselho da Europa, que se debruçou, sobre a...