Uma das lições que o novo coronavírus veio recuperar é a de que há governos com dificuldade em admitir tragédias de grandes dimensões no seu país. Durante muitos anos, alguns regimes ditatoriais, mais ou menos assumidos, fizeram questão de esconder, ou mesmo negar, a ocorrência de desastres naturais no seu território, como aconteceu por exemplo em 2006 na Birmânia, hoje Myanmar, então governada por uma junta militar. No seu negacionismo, os militares chegaram ao ponto de recusar auxílio internacional, por ocasião do desastre humanitário que atingiu o país nesse ano. Era como se essa tragédia viesse manchar a imagem paradisíaca do país que eles faziam questão de exibir, como um dos grandes trunfos da sua governação.
Hoje, as tragédias ainda podem ser pretexto para alguns políticos e chefes de governo darem provas visíveis do seu populismo e do peso que esta nova ideologia tem no mundo. O populismo é um vírus que se tem espalhado um pouco por toda a parte, e o seu poder de disseminação parece superar largamente os perigos de uma certa irracionalidade. O aparecimento do novo coronavírus foi um bom pretexto para que alguns adeptos dessa ideologia viessem muito rapidamente para a luz do dia. Falamos, antes de mais, de Donald Trump, o presidente norte-americano que, embora sem surpresa para a opinião pública internacional, se apressou a desvalorizar o perigo que a nova doença representava para o mundo, como se o seu país dela estivesse imunizado. O tom displicente como ele abordou o problema, pelo menos no início, só veio justificar o receio de que, na sequência das eleições do próximo mês de Novembro, o estado mais poderoso do mundo continue a ser governado por um homem que já demonstrou não possuir qualidades humanas e políticas suficientes para justificar a assunção de uma tal responsabilidade.
A esperança de quantos não querem a sua continuidade na Casa Branca reside apenas no previsível agravamento da crise económica mundial que o vírus já está a provocar, mas esta será também uma solução demasiado perigosa para todo o mundo, inclusivamente para a América. Com a grave crise económica que já se faz sentir nos Estados Unidos, Donald Trump vê muito mais reduzidas as suas esperanças de continuar na Casa Branca e esse é, para muitos, o único aspecto positivo da tragédia provocada por esta pandemia.
É preciso reconhecer, no entanto, que Trump não esteve sozinho no seu comportamento inicial negacionista. O chefe de governo britânico, Boris Johnson, e o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, entre outros, alinharam pelo mesmo diapasão. Só que o primeiro, já afectado entretanto, foi na onda apenas inicialmente, mas o segundo, mantem-se ridiculamente fiel a esse populismo. É verdade que alguns desses negacionistas, como Trump, viram-se obrigados a alinhar agora no combate ao Covid 19, mas esta conversão já não é suficiente para salvar a sua imagem.
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