Em 17 de outubro do ano passado, Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, o Governo divulgou a criação de uma Comissão à qual se pedia que articulasse a participação de muitas instituições sociais e de animação para o desenvolvimento. No Despacho n.º 10277/2020, assinado pelas senhoras Ministras Ana Godinho e Mariana Vieira da Silva, indicavam-se os elementos que formariam essa equipa de Coordenação. É óbvio que a CNIS fez parte do grupo das instituições escolhidas para darem o seu contributo. Não é discutível o contributo das IPSS para se alcançar tão emergente desígnio ético, por ser da mais elementar justiça social.
O compromisso confiado a essa Comissão seria o de apresentar, até 15 de dezembro do ano passado, uma proposta de Estratégia Nacional de Combate à Pobreza. Confesso que, dada a complexidade da missão pedida, considerei, desde logo, o tempo determinado muito escasso. Todavia, passa um ano do início dos trabalhos e a Estratégia ainda não é conhecida; falta cumprir o tempo de audição pública da Proposta que o Governo considerar com condições para esse efeito. Este propósito foi, desde logo, referido no Despacho que, com muita assertividade, assegura a relevância que tem de assumir a contribuição de todas e de todos.
Segundo o Despacho: «É fundamental que a construção desta Estratégia seja feita com o envolvimento da sociedade civil e num processo de ampla participação e debate». Viveríamos num regime democrático mais completo se as decisões mais importantes e com maiores implicações na vida do povo tivessem sempre o seu parecer.
Este seria um contributo muito significativo que as IPSS poderiam dar, promovendo debates com os pais, com os beneficiários adultos, possuidores de condições cognitivas para o efeito e com as colaboradoras e colaboradores das instituições.
Se esta fosse uma prática corrente nas IPSS elas alargariam significativamente, a sua dimensão política - no sentido etimológico da palavra que tem a sua origem no termo grego - no sentido etimológico da palavra que tem a sua origem no termo grego "politikos" que se refere aos grupos sociais que integram a "Pólis", ou seja a "cidade" - para participarem na organização, administração e orientação de nações ou Estados.
Tendo em conta, os princípios enunciados como alicerces da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, reitero que considerei curtos os tempos concedidos à Comissão nomeada. Decorrido todo este tempo, parece-me que estão já a ser longos demais. É importante que essa estratégia se comece a implementar. Esta urgência é reconhecida pelo próprio Despacho ao constatar que «… a pandemia veio degradar os indicadores de desemprego e agravar as condições materiais de muitos portugueses, impondo para além da resposta de emergência, que tem vindo a ser desenvolvida, uma atuação sistémica e estrutural de combate à pobreza.» Mas é imprescindível ter sempre em conta que a necessidade de se fazer este combate e de vencer, tem que ver também com a pobreza estrutural e geracional que se têm mostrado ser as frentes do combate mais difíceis de enfrentar. Antes do surto pandémico, pelo menos, 17,3% da população portuguesa encontrava-se na situação de pobreza absoluta o que não deixa de ser uma vergonha para um país democrático, assente num Estado que se diz social e um descrédito dos princípios que deram origem à União Europeia. Esta demora pode ter efeitos mais perversos do que parece. É que estão a ser executados, em tempos diferentes, dois outros grandes instrumentos para a coesão social que são o Plano de Recuperação e Resiliência e o Plano de Ação elaborado no âmbito do Pilar Europeu dos Direitos Sociais. Seria importante que estas três “bazucas”, apesar de dimensões e alcances diferentes, “disparassem” coordenadamente para se alcançarem metas integradas e sustentadas. Sem essa cuidada e persistente articulação nenhum destes programas conseguirá alcançar, na totalidade e, por certo, os mais importantes objetivos a que se propõem, e pouca relevância poderá ter a redução das desigualdades e a melhoria das condições de vida, dignas para todos os portugueses, preferencialmente os que estão em condições de vulnerabilidade económica e social que os levam a subsistir com os mínimos do que lhes é consignado pela Declaração dos Direito Humanos.
Sem dúvida que as IPSS têm uma missão incontornável na erradicação da pobreza. Por isso, cada uma, com as suas capacidades e especificidades, deverá identificar e dar o seu contributo para que se cumpram os 12 princípios enunciados no Despacho. Depois de conhecida a proposta da estratégia Nacional para o Combate à Pobreza, deveriam ser identificadas as áreas de intervenção. Aguardemos.
Uma certeza podemos ter, desde já, é que as transformações não se fazem por decreto, mas sim com a mudança de mentalidades e a criação de modelos mais condizentes com uma economia humana integral. Ou seja, uma sociedade menos individualista e mais motivada para o bem comum em que os seres humanos e todas as demais criaturas devam ser considerados como protagonistas verdadeiros da história de cada tempo.
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