Uma equipa de 19 cientistas liderada pelo professor Eberhart Zrenner, do Centro de Oftalmologia da Universidade alemã de Tubinga, realizou um conjunto de testes em três voluntários cujos resultados indicam "forte evidência de que as funções visuais dos doentes cegos, devido a distrofia hereditária da retina podem, em princípio, ser recuperadas em grau suficiente para serem usadas na vida diária", lê-se no estudo publicado por estes cientistas na mais recente edição de Proceedings of The Royal Society B, publicação académica especializada (peer review) britânica.
Considerando que a retina interna não sofre alterações nos casos de degeneração macular - que atinge sobretudo pessoas de mais idade - e de retinite pigmentosa - doença genética na origem de situações de cegueira incurável -, a equipa de Eberhart Zrenner tentou a restauração parcial da visão, recorrendo a estímulos eléctricos sobre o conjunto da retina.
A novidade do método utilizado nesta experiência encontra-se no recurso a um implante colocado na zona afectada do interior da retina. O implante destina-se a substituir as células fotorreceptoras da- nificadas, transformando a luz de cada imagem, ponto por ponto, em pequenas correntes proporcionais ao estímulo da luz.
Designado como implante sub-retinal electrónico, o dispositivo é formado por mais de 1500 microfotodíodos, cada um com os seus respectivos ampliadores e eléctrodos para estímulo local. O dispositivo permite a projecção directa no chip colocado sob a retina. O chip gera então um estímulo eléctrico dependente da intensidade da luz do objecto, que permite a sua identificação pelo doente.
Nestas condições, os voluntários da experiência, dois homens (respectivamente de 40 e 44 anos) e uma mulher (de 38 anos) conseguiram identificar vários objectos e, como notam os autores da investigação, de forma imediata, conseguiram localizar e aproximar-se de pessoas numa sala.
Sem preparação prévia, e após vários anos de cegueira, sublinha o texto publicado no Proceedings of The Royal Society B, conseguiram também identificar letras e ler palavras completas.
Foram estes três voluntários que obtiveram os resultados mais animadores, pois num primeiro momento da experiência, envolvendo a participação de 11 pessoas - e com o chip colocado numa área menos profunda da retina -, houve algumas melhorias, mas nitidamente inferiores aos resultados alcançados pelos envolvidos na segunda fase da experiência.
Um dos três participantes nesta segunda fase, o finlandês Miikka Terho, afirmou que, quando tinha luz diante dos olhos, "podia ver o seu brilho, algo até agora impossível". Foi Terho a ir mais longe nos resultados, sendo ele a identificar palavras e a ordem correcta de letras numa sequência deliberadamente confusa.
Para Terho, que irá receber em breve uma nova versão do protótipo, o dispositivo "é importante para orientação e visualização do espaço, ainda que não se perceba todos os detalhes". O finlandês afirma ter recuperado "a espectacular sensação de poder focar o olhar nalguma coisa".
A equipa do professor Zrenner mostra-se confiante de que, perante estes resultados, o dispositivo sub-retinal pode permitir que pessoas cegas recuperem uma percepção visual útil na vida diária. Segundo o estudo, é "possível passar de um estado de cegueira total para uma visão significativa. Especialmente nos doentes em que não se revelaram produtivos os tratamentos genéticos ou em casos em que se torna impossível recorrer a agentes neuroprotectores. Em paralelo, o implante sub-retinal, a ser desenvolvido pela empresa alemã Retina Implant AG, foi testado em termos da viabilidade da sua implantação cirúrgica, através de técnicas específicas e dos diferentes níveis de compatibilidade com o paciente".
Fonte: Diário de Notícias
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