No Niassa, Norte de Moçambique, como em tantos outros pontos de África, muitas aldeias não têm saneamento básico, não conseguem água limpa ou tratar os dejectos. Aos poucos, a situação vai mudando e Feliciano dos Santos, que cresceu na zona, é um dos responsáveis. Aprendeu cedo a enfrentar e resolver problemas. Foi atacado pela poliomielite, que o deixou com uma deficiência na perna direita, mas não deixou que isso lhe barrasse o futuro. Descobriu que podia usar o seu talento musical para alertar consciências e passar mensagens. "Sempre entendi que a música tinha muito potencial", diz Feliciano, de 43 anos, líder dos Massukos. "A música junta as pessoas e a música tradicional em África, em especial, sempre transmitiu mensagens".
Em 1992, a UNICEF promoveu uma campanha sobre a importância das latrinas e lançou uma canção em que pedia às mães e às avós que ouvissem o apelo. O tema foi um êxito. Foi convidado para se associar à UNICEF, aceitou, mas quis ir mais longe, porque "sabia que tinha muitos desafios pela frente, o acesso à água potável, o saneamento em geral, era preciso explicar os processos de várias doenças".
Os Massukos passaram a cantar formas de manter a água limpa e ajudaram a população a compreender as implicações da falta de saneamento. Feliciano, a esteira do sucesso, criou a ONG "Estamos", que promove o saneamento ecológico, um processo sustentável de baixo custo que utiliza latrinas geradoras de composto para transformar dejectos humanos em fertilizante de alta eficácia. "Nós aparecemos nos cartazes para passar a mensagem, falamos em público dos problemas e isso, muitas vezes, marca a diferença", explica.
Feliciano recorda um episódio que envolveu o então presidente moçambicano, Joaquim Chissano, que o músico tentara envolver numa campanha para realçar a importância de lavar as mãos. Num espectáculo durante um jantar oficial, Feliciano, de microfone em punho, pediu-lhe directamente que participasse na campanha e o presidente aceitou, tendo sido dado, então, "um grande passo", porque a Chissano, juntaram-se o ministro da Saúde e o governador do Niassa e "conseguimos, finalmente, alertar as pessoas para as vantagens de lavar as mãos, um acto que evita 40% das doenças".
Feliciano dos Santos refere que as prioridades dos Massukos estão definidas: "Continuar a promover o acesso à água potável e ao saneamento básico como direitos básicos de qualquer cidadão, apostar na prevenção do VIH/sida - para tomar os retrovirais tenho que beber água, mas qual? - e na prestação de cuidados domiciliários".
A campanha das latrinas continua a correr bem e há seis anos que não se regista um só caso de cólera no Niassa. "Agora estamos também a trabalhar em Maputo", diz, orgulhoso, Feliciano, que espera que o prémio abra caminho a novas reflexões, porque "quando se fala de ambiente e desenvolvimento, muitas vezes esquecemos o que é mais simples".
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